Influenciadores digitais africanos em Portugal reúnem-se sábado, em Lisboa, numa iniciativa independente que visa o intercâmbio e a conquista de reconhecimento. A DW conversou com dois deles sobre novas oportunidades.
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Saber potencializar as vantagens da Internet pode ajudar a transformar a vida de muitos jovens, criando oportunidades de emprego e de negócios, dizem influenciadores digitais ouvidos pela DW África.
Claudina Correia, filha de pais cabo-verdianos, começou como blogger há cerca de quatro anos (2016), "por mera curiosidade", além de estar também ligada a um canal no YouTube. Colaborava na organização de eventos. "Com isso, consequentemente, surgiu também a realização de concursos de beleza e vou trabalhando em paralelo com ambas as coisas", conta.
A jovem de origem cabo-verdiana, formada em turismo, é autora do blogue FEMEA.TOP, página que usa para publicar regularmente conteúdos diversos na Internet. Está entre os influenciadores digitais africanos mais populares entre os utilizadores das redes sociais do espaço lusófono. Agora, decidiu apostar na formação, em busca de mais organização e profissionalismo. "Vou também desenvolver uma área profissional de consultoria de imagem e de beleza e estou a terminar a formação nesse sentido para transformar a plataforma", revela.
Claudina Correia diz que, ao longo do tempo, foi tendo a perceção do potencial de negócio que as redes digitais lhe poderiam proporcionar. Também tem sentido um interesse considerável por parte de outras mulheres que consultam a sua plataforma. "Quem realmente quer desenvolver um negócio deve conhecer o potencial que, para o efeito, as plataformas digitais geram", sublinha.
"Ajudamos a crescer"
Francisco Sidney, a viver há cerca de cinco anos em Portugal, integra uma equipa de cinco pessoas que alimenta a plataforma de vídeos Tellas, a primeira criada em Angola em 2018. Antes, os membros do grupo tinham conteúdos dispersos pelo YouTube, de forma desorganizada. "Nós pensámos em fazer uma coisa nova. Não havia um lugar que as pessoas pudessem aceder e encontrar de forma organizada variadíssimos conteúdos. Desde filmes, séries documentais, até cursos, aulas de dança como o kuduru nós temos na plataforma", explica.
Empreendedores africanos trocam ideias em Lisboa
O objetivo era "organizar melhor" os conteúdos, fazendo com que "qualquer pessoa, angolano, moçambicano, inglês ou francês, conseguisse entrar na plataforma para saber isto é Angola, isso é africano".
A plataforma já garante trabalho, de forma indireta, a jovens com baixos rendimentos, que conseguem rentabilizar os seus conteúdos, adianta o estudante angolano. "Estamos a incentivar que produzam, levem os seus conteúdos até ao Tellas e comecem a rentabilizar com isso. Nós analisamos o conteúdo, vemos se é bom. E se não for bom, nós não eliminamos: ajudamos a crescer, a elaborar melhores conteúdos. Ou seja, de certa forma, estamos a fazer com que os jovens se auto-empreguem", diz.
"Este é o futuro"
O também jurista confirma que ainda são poucos os influenciadores digitais africanos em Portugal. Apela aos jovens a estarem mais atentos às novas tecnologias e à inovação. "Este é o futuro", projeta, "porque a Internet oferece muitas oportunidades."
Muitos destes jovens começaram de forma muito informal. A troca de experiências entre eles, segundo Claudina Correia, pode ajudar a desenvolver as respetivas áreas para um nível mais profissional. "Há pessoas que são mais da área de comunicação, de marketing, que desenvolvem conteúdos de vídeos, ajudam na criação de sites. Seria uma forma de ajuda entre nós para melhorar cada um dos nossos trabalhos", sugere.
Este sábado (19.10), realiza-se pela primeira vez, em Lisboa, o Encontro de Empreendedores Digitais Africanos Residentes em Portugal. "É algo que estava a fazer falta", diz Claudina Correia. Francisco Sidney concorda e considera pertinente os influenciadores trocarem ideias, interessarem-se pelos projetos uns dos outros, falarem sobre o futuro e crescerem todos juntos.
A ideia não é a de criar uma associação, mas certamente uma comunidade unida, dando a conhecer novas plataformas e o potencial que representam em áreas diversas de interesse público.
Bairro da Jamaica na margem sul de Lisboa: A prolongada esperança
A Urbanização do Vale de Chícharos no Seixal, concelho do distrito de Setúbal (Grande Lisboa), acolhe, na sua maioria, imigrantes dos países africanos de língua portuguesa. Há quem viva no bairro há mais de 20 anos.
Foto: J. Carlos
Décadas à espera de realojamento
Os prédios inacabados, propriedade da Urbangol, uma sociedade sedeada num paraíso fiscal com dívidas ao fisco, foram ocupados por pessoas de baixa renda que não tinham condições para comprar uma casa. Aguardam, ao longo destes anos, pela promessa de realojamento por parte da autarquia local.
Foto: J. Carlos
Arte e desabafo por um bairro melhor
Por uma das entradas do Jamaica, os visitantes são recebidos por estes murais pintados na parede que cerca a instalação de transformadores da EDP, Energias de Portugal. As pinturas expõem os sentimentos de mudança e a visão do mundo por parte dos artistas que aspiram viver em um bairro melhor.
Foto: J. Carlos
Os ídolos Bob Marley e Che Guevara
O lendário músico jamaicano Bob Marley ou o líder guerrilheiro argentino-cubano Che Guevara são uma espécie de ídolos para os jovens artistas autores destas pinturas. Ao longo da parede, que funciona como uma tela, veem-se outros motivos, incluindo a reprodução de um bairro típico imaginário em África.
Foto: J. Carlos
Falta de água e de luz
Nos cafés ou em outro ponto de encontro e de convívio, os moradores acabam por falar e questionar sempre sobre os inúmeros problemas com que se deparam no dia-a-dia. A falta de água e de saneamento básico ou os cortes de luz pela empresa fornecedora quando não são pagas as faturas coletivas constituem uma dor de cabeça diária.
Foto: J. Carlos
Mas, na hora de matar a fome…
Enquanto não vem uma solução para o realojamento, a vida não para no Jamaica. Aos fins de semana, a música ajuda a acalentar os problemas. Os grelhados à moda dos países de origem, preparados neste caso pela são-tomense Vitória Silva, servem para matar a fome depois de um dia de trabalho árduo.
Foto: J. Carlos
… Pratos típicos juntam amigos
Percorrendo o território adjacente, encontram-se vários espaços anexados como este, adaptados para café e ou restaurantes, são uma das fontes de rendimento familiar. Os pratos típicos de África, sobretudo à base de peixe e banana, recheiam as mesas dos clientes provenientes de sítios diversos e servem de pretexto para reunir amigos.
Foto: J. Carlos
Cultivar para render
Em uma pequena parcela do terreno à volta, há moradores com alguma experiência agrícola que improvisaram hortas com variedades de hortaliças para consumo próprio. Plantam couves, alfaces, tomates, cebolas, alhos e batatas, entre outros produtos que ajudam a aliviar as despesas com a alimentação.
Foto: J. Carlos
Produzir para sobreviver
Também com o mesmo objetivo, a criação de galinhas reforça a dieta alimentar caseira. Para alguns dos moradores desempregados ou não, esta é uma das formas para suprir as muitas dificuldades de sobrevivência quando é baixo o rendimento familiar.
Foto: J. Carlos
Desemprego, droga e prostituição inquietam
O desemprego é um dos males que inquietam jovens mães como Vanusa e Aurora Coxi. Dizem que os habitantes são, de certo modo, discriminados quando procuram emprego pela fama desmerecida de aqui morarem. Isso leva muitos jovens a seguir por caminhos impróprios, do roubo, do tráfico de droga ou da prostituição. Ambas têm um sonho: acabar a universidade, interrompida por dificuldades diversas.
Foto: J. Carlos
Inundação e humidade
A estes problemas juntam-se as condições de habitabilidade nos prédios, que afetam a maioria das mais de 800 pessoas aqui residentes. Júlio Gomes, guineense que mora num anexo improvisado na parte traseira de um dos prédios, é afetado pela inundação quando chove ou quando rompe a canalização do sistema de esgotos do vizinho do andar de cima.
Foto: J. Carlos
Acesso à tarifa social de eletricidade
Os moradores estão em conflito com a empresa que fornece eletricidade (EDP), porque o critério de cobrança não é o mais adequado. É a associação do bairro que recebe o dinheiro dos consumos mensais e paga as faturas únicas por lote, consoante a leitura no contador colocado em cada prédio. Mas há quem não pague. Os clientes reclamam por não beneficiarem de tarifa social.
Foto: J. Carlos
Sede a precisar de reabilitação
Na sede da Associação para o Desenvolvimento Social da Urbanização de Vale de Chícharos, onde vive uma família, as inundações também constituem um incómodo quando chove. Aqui têm lugar as reuniões para discutir os problemas que afetam os residentes, entre os quais o realojamento. Reabilitar o espaço, onde também funcionam aulas de alfabetização, é uma solução em stand by por falta de recursos.
Foto: J. Carlos
Parque infantil inseguro
Ao lado da sede está um pequeno parque infantil, igualmente sem as condições mínimas de segurança para as crianças brincarem. Os poucos equipamentos nele existentes estão em mau estado de conservação e utilização. Este é, entretanto, um dos poucos espaços de lazer que dispõem para descarregar energia e preencher o tempo.
Foto: J. Carlos
Ação social imprescindível
A CRIAR-T – Associação de Solidariedade tem prestado serviço útil à comunidade, já lá vão mais de 15 anos. As suas várias valências permitem, além de apoio social, acolher crianças enquanto os pais vão trabalhar. Porque «é um perigo elas andarem pelo bairro a brincar», diz Dirce Noronha, presidente da Associação para o Desenvolvimento de Vale de Chícharos.