Eritreia e Somália estabelecem relações diplomáticas
Lusa
30 de julho de 2018
Após décadas de tensão, Eritreia e Somália assinaram esta segunda-feira um acordo, em Asmara, sobre estabelecimento de relações diplomáticas e envio de embaixadores para as respetivas capitais, informou Governo eritreu.
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"Os dois países vão estabelecer relações diplomáticas e trocar embaixadores", menciona o acordo intitulado "Declaração sobre as relações fraternas", assinado pelo Presidente da Eritreia, Isaias Afwerki, e pelo seu homólogo somali, Mohamed Abdullahi Mohamed.
De acordo com a agência de notícias France-Presse (AFP), este acordo marca uma nova etapa no "aquecimento das relações entre os países do Corno de África", na sequência da reaproximação, nas últimas semanas, entre a Eritreia e a Etiópia.
Os dois países têm relações tensas há mais de uma década, nomeadamente devido ao alegado apoio de Asmara aos islamistas da Al-Shebab, ligados à Al-Qaeda.
Segundo a AFP, estas acusações sujeitaram a Eritreia a sanções da Organização das Nações Unidas (ONU) desde 2009, incluindo o congelamento de bens e proibições de viagens ao exterior para funcionários políticos e militares, e embargo de armas.
"Declaração sobre relações fraternas"
"A Eritreia apoia fortemente a independência política, a soberania e a integridade territorial da Somália, bem como os esforços dos somalis e dos seus governos para restaurar a estatura legítima do seu país e atender às nobres aspirações do seu povo", refere o contrato assinado hoje.
Esta declaração, cujo texto foi publicado na Internet pelo Ministério da Informação da Eritreia, afirma que os dois países "se esforçarão para forjar uma cooperação mais profunda nos domínios político, económico, social, cultural, e da defesa e segurança".
De acordo com a declaração publicada pelo Ministério da Informação da Eritreia, estes dois países prometem "trabalhar juntos para promover a paz, estabilidade e integração económica na região".
A visita do Presidente da Somália segue-se à aproximação entre a Eritreia e a Etiópia, que assinaram uma declaração conjunta a 09 de julho, encerrando quase duas décadas de guerra desde o seu último conflito entre 1998 e 2000.
O novo primeiro-ministro etíope, Abiy Ahmed, que chegou ao poder em abril, mudou a situação na região ao iniciar a aproximação entre o seu país e a Eritreia.
A Etiópia já solicitou formalmente às Nações Unidas para levantar as sanções contra a Eritreia, refere a AFP. O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, já indicou que as sanções já não se justificam.
De portas abertas: Etiópia recebe os "inimigos" eritreus
Todos os dias, os eritreus deslocados atravessam a perigosa fronteira para buscar asilo em território inimigo, mas a Etiópia parece muito feliz em acomodá-los.
Foto: DW/J. Jeffery
Vagando pelo deserto
"Levamos quatro dias viajando de Asmara", disse um eritreu de 31 anos sobre a caminhada da capital da Eritreia, a 80 quilômetros ao norte da fronteira, depois de chegar à Etiópia. "Viajamos por 10 horas durante a noite, dormindo no deserto durante o dia". Com ele estão outros três homens, três mulheres, seis meninas e quatro meninos.
Foto: DW/J. Jeffery
Sem volta
"As condições de vida na Eritreia são mais perigosas do que atravessar a fronteira", diz um soldado eritreu de 39 anos – agora um desertor depois de atravessar para a Etiópia. Após serem recolhidos por soldados etíopes que patrulham a fronteira, os eritreus são enviados para um centro de registo, onde é iniciado o processo de pedido de asilo na Etiópia.
Foto: DW/J. Jeffery
Vida de acampamento
Os recém-chegados são acomodados em um dos quatro campos de refugiados na região do Tigray na Etiópia. O acampamento de Hitsats é o maior e mais novo, com 11 mil refugiados. Cerca de 80% deles têm menos de 35 anos de idade. "Mesmo que busquem o asilo político, haverá uma questão económica, já que eles são jovens e precisam gerar renda para viver", diz o coordenador do campo, Haftam Telemickael.
Foto: DW/J. Jeffery
Aproveitar ao máximo a situação
A infraestrutura do acampamento é simples, mas digna. Há pouco lixo espalhado e as pessoas fazem o máximo para tornar a sua habitação o mais caseira possível. "Quando eu bebo uma xícara de café entre as flores é bom", diz John, de 40 anos, de pé no pequeno jardim cheio de flores ao redor da casa do acampamento de Hitsats, onde vive com a filha de 10 anos. Sua esposa está na América.
Foto: DW/J. Jeffery
Vida difícil
"O povo eritreu é bom", diz Luel Abera, um funcionário etíope que ajuda a coordenar as chegadas de refugiados antes de se mudarem para um acampamento. "Eles lutaram pela independência por 30 anos. Mas desde o primeiro dia, [o Presidente da Eritreia] Isaias [Afwerki] governou o país sem se importar com os interesses de seu povo". Isaias governou a Eritreia há mais de 25 anos.
Foto: DW/J. Jeffery
Influxo constante
"Não quero falar sobre por que cruzamos a fronteira", diz Haimanot, de 18 anos, que cuida de um pequeno barraco usado para a recarga de telemóveis em Hitsats. Em fevereiro de 2017, mais de três mil eritreus chegaram à Etiópia, de acordo com a agência de refugiados do país. Pelo menos 165 mil refugiados e requerentes de asilo residem na Etiópia, de acordo com a ONU.
Foto: DW/J. Jeffery
Sono tranquilo
"No Sudão há mais problemas. Aqui podemos dormir tranquilamente", diz Ariam, de 32 anos, que chegou a Hitsat há quatro anos com seus dois filhos depois de passar outros quatro anos num campo de refugiados no Sudão. Os refugiados afirmam que os militares da Eritreia realizam missões para capturar eritreus no Sudão. A fronteira da Etiópia com a Eritreia é muito mais protegida contra estas incursões.
Foto: DW/J. Jeffery
Generosidade ou estratégia?
"A resposta da Etiópia é gerenciar o portão e perceber como isso pode se beneficiar com esses fluxos inevitáveis de pessoas", diz a analista de refugiados Jennifer Riggan. Mais dinheiro também é gasto hospedando refugiados devido a esforços internacionais para frear a migração para a Europa. Também é um caminho para a Etiópia reforçar a sua reputação internacional.
Foto: DW/J. Jeffery
A camaradagem supera o ódio
As posições militares da guerra de 1998-2000 entre a Etiópia e a Eritreia ainda estão ao lado da fronteira de hoje. Enquanto isso, ambos os governos acusam-se de conspirar um contra o outro. Mas a Etiópia parece disposta a se redimir com os eritreus comuns. "Somos as mesmas pessoas, compartilhamos o mesmo sangue, até mesmo os avós", diz Estifanos Gebremedhin da agência de refugiados da Etiópia.
Foto: DW/J. Jeffery
Migrar
"Meus filhos estão na América, mas não há razão para eu ir – agora sou um homem velho", diz Tesfaye, de 74 anos, em Shimelba, primeiro campo de refugiados eritreus de Tigray, aberto em 2004. Outros milhares de eritreus vivem em cidades etíopes, fora dos acampamentos. Muitos decidem migrar para fora – alguns legalmente, como os filhos de Tesfaye, mas muitos ilegalmente, e às vezes morrem tentando.
Foto: DW/J. Jeffery
Passado não esquecido
"Os soldados etíopes que nos encontraram foram como irmãos para nós", diz Yordanos, de 22 anos, mãe de dois. A Eritréia era a região mais ao norte da Etiópia antes da sua independência em 1993. Desde então, Tigray passou a ser a região etíope mais ao norte. Por isso, muitos eritreus compartilham a mesma língua, Tigrinya, e a mesma religião e cultura ortodoxa que os habitantes de Tigray.