Desde 2015, os "esquadrões da morte" têm estado a ceifar vidas de intelectuais, ativistas, jornalistas e opositores políticos em Moçambique. Acontecimentos que, segundo analistas, têm motivações políticas.
Em 2016, foi a vez do deputado da RENAMO, Jeremias Pondeca, ser morto a tiro em Maputo. Este caso também não foi esclarecido.
Em 2019, em Xai Xai, província sulista de Gaza, o ativista e observador eleitoral Anastácio Matavele foi assassinado a tiro. O caso foi julgado e polícias foram condenados pelo crime, mas, ao não penalizar os mandantes, o Tribunal não convenceu a crítica no país.
Motivações políticas
O jurista José Capassura não tem dúvidas de que estes assassinatos e outros - como as mortes de Elvino Dias, advogado do candidato presidencial Venâncio Mondlane, e do mandatário do PODEMOS, Paulo Guambe - têm motivações políticas, porque são executados por agentes policiais:
"Não há dúvidas nem margens de erro de que estes assassinatos têm algum tipo de direção das Forças Armadas de Defesa e Segurança (FADS) e fica muito difícil ter que esclarecer crimes desta natureza."
Moçambique: Polícia carrega sobre jornalistas e Mondlane
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Os intelectuais Jaime Macuane e Ercínio de Salema foram outros alvos dos "esquadrões da morte": sofreram agressões brutais. Capassura critica a fragilidade das instituições de investigação.
"A investigação criminal ainda é regida pelo princípio de oficialidade, o que significa que só as instituições criadas pelo Estado são competentes e legítimas para investigar e esclarecer estes crimes neste sentido," relata. "Agora, se alguns membros das FADS dirigem catedrais, criminalidade organizada, fica muito difícil para que outras instituições auxiliares da administração da Justiça esclareçam crimes desta natureza," considera.
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Crimes eleitorais
O analista político Dércio Alfazema entende que os crimes dos "esquadrões da morte" acontecem muitas vezes em períodos eleitorais.
"Gilles Cistac, por exemplo, acabou perdendo a vida num contexto em que o país discutia questões que têm a ver com reformas e descentralização. Ele acabou não sendo percebido face a questões de intolerância e de dificuldades de compreender o pensar diferente e acabou sendo uma vítima da democracia," afirma.
O analista culpa as instituições que deviam proteger o cidadão, e os políticos que muitas vezes atropelam leis para o seu próprio benefício:
"Eles que aprendam a conviver de acordo com aquilo que são as leis e não sejam eles próprios os promotores de situações de desordem, de violação de normas. Essa questão de disputa de poder que já não se limita a questões eleitorais, mas depois tem que se avançar para a situação de violência.”
O jurista José Capassura insiste que os dois últimos assassinatos, do advogado Elvino Dias e do político Paulo Guambe, pela precisão do crime, revelam que foram da responsabilidade das Forças de Defesa e Segurança (FDS).
"Pelo número de projéteis que foram disparados, dúvidas não subsistem de que se tratou de elementos das FDS com algum teor avisado de conhecimento de manuseamento de armas", conclui.
Moçambique: Assassinato de figuras incómodas é uma moda que veio para ficar
O preço de fazer valer a verdade, justiça, conhecimento ou até posições diferentes costuma ser a vida em Moçambique. A RENAMO é prova disso, no pico da tensão com o Governo da FRELIMO perdeu dezenas de membros.
Foto: BilderBox
Mahamudo Amurane: Silenciada uma voz contra corrupção e má governação
O edil da cidade de Nampula foi morto a tiros no dia 4 de outubro de 2017. Insurgia-se contra a má gestão da coisa pública e corrupção no seu Município. Foi eleito para o cargo de edil através do partido MDM. Embora mais de sessenta pessoas já estejam a ser ouvidas pela justiça não se conhecem os autores do crime.
Foto: DW/Nelson Carvalho Miguel
Jeremias Pondeca: Uma voz forte nas negociações de paz que foi emudecida
Foi alvejado mortalmente a tiro por homens desconhecidos no dia 8 de setembro de 2016 em Maputo quando fazia os seus exercícios matinais. O assassinato aconteceu numa altura delicada das negociações de paz. Pondeca era membro da Comissão Mista do diálogo de paz, membro do Conselho de Estado, membro sénior da RENAMO e antigo parlamentar. Até hoje a polícia não encontrou os autores do crime.
Foto: DW/L. Matias
Manuel Bissopo: O homem da RENAMO que escapou por um triz
No dia 4 de janeiro de 2016 foi baleado depois de uma conferência de imprensa do seu partido na Beira. Bissopo tinha acabado de denunciar alegados raptos e assassinatos de membros do seu partido e preparava-se para se deslocar para uma reunião da força de oposição quando foi baleado. A polícia moçambicana até hoje não encontrou os atiradores.
Foto: Nelson Carvalho
José Manuel: Uma das caras da ala militar da RENAMO que se apagou
Em abril de 2016 este membro do Conselho Nacional de Defesa e Segurança em representação da RENAMO e membro da ala militar do principal partido da oposição foi morto a tiro por desconhecidos à saída do aeroporto internacional da Beira. A questão militar é um dos pontos sensíveis nas negociações de paz. Os assassinos continuam a monte.
Foto: DW/J. Beck
Marcelino Vilanculos: Assassinado quando investigava raptos
Era procurador foi baleado no dia 11 de abril de 2016 à entrada da sua casa, na Matola. Marcelino Vilanculos investigava casos de rapto de empresários que agitavam o país na altura. O julgamento deste assassinato começou em outubro de 2017.
Foto: picture-alliance/Ulrich Baumgarten
Gilles Cistac: A morte foi preço pelo conhecimento divulgado?
O especialista em assuntos constitucionais de Moçambique foi baleado por desconhecidos no dia 3 de março de 2015 na capital Maputo. O assassinato aconteceu após uma declaração que fortaleceu a posição da RENAMO de gestão autónoma na sua querela com o Governo da FRELIMO. Volvidos mais de dois anos a sua morte continua por esclarecer.
Foto: A Verdade
Dinis Silica: Assassinado em circunstâncias estranhas
O juiz Dinis Silica também foi morto a tiro por desconhecidos, em 2014, em plena luz do dia, quando conduzia o seu carro na capital moçambicana. Na altura transportava uma avultada quantia de dinheiro, cuja proveniência é desconhecida. O juiz da Secção Criminal do Tribunal Judicial da Cidade de Maputo investigava igualmente casos de raptos. Os assassinos continuam a monte.
Foto: picture-alliance/dpa/U. Deck
Siba Siba Macuacua: Uma morte brutal em nome da verdade
O economista do Banco de Moçambique foi atirado de um dos andares do prédio sede do Banco Austral no dia 11 de agosto de 2001. Na altura investigava um caso de corrupção na gestão do Banco Austral. Siba Siba trabalhava na recuperação da dívida de milhões de meticais, resultante da má gestão do banco. Embora tenha sido aberta uma investigação sobre esta morte ainda não há esclarecimentos até hoje.
Foto: DW/M. Sampaio
Carlos Cardoso: O começo da onda de assassinatos
Considerado o símbolo do jornalismo investigativo em Moçambique, Carlos Cardoso foi assassinado a tiros a 22 de novembro de 2000. Na altura investigava a maior fraude bancária de Moçambique. O seu assassinato foi interpretado como um aviso claro aos jornalistas moçambicanos para que não interferissem nos interesses dos poderosos. Devido a pressões internacionais o caso chegou a justiça.