Estado Islâmico diz ter feito várias baixas em Moçambique
Lusa
18 de outubro de 2019
Grupo jihadista Estado Islâmico (EI) anunciou esta sexta-feira (18.10) que repeliu um ataque militar no norte de Moçambique contra uma das suas posições, num confronto em que provocou várias baixas e fez um prisioneiro.
Publicidade
A informação é veiculada no boletim Al-Naba do grupo jihadista Estado Islâmico (EI). Até ao momento, analistas e fontes no terreno contactadas pela Lusa rejeitaram a ligação destes ataques no norte do país a movimentos terroristas internacionais de extremismo islâmico, apontando tensões locais nas comunidades como causa dos casos de violência.
A organização terrorista diz que os seus homens na província de Cabo Delgado, norte de Moçambique - que dizem fazer parte do Califado da África Central - "repeliram um ataque contra as suas posições" na zona de Mbau, distrito de Mocímboa da Praia, levado a cabo por "vários soldados dos exércitos moçambicano e russo", no domingo, dia 13.
Pemba quer paz
01:34
"Os confrontos resultaram na morte de vários soldados, ferimentos em muitos deles", anuncia o EI, que diz ter feito um prisioneiro e recolhido "armas e munições" que os militares "deixaram para trás" ao fugir.
O Ministério da Defesa moçambicano anunciou ontem ter feito um ataque de artilharia, já depois deste confronto descrito pelo Estado Islâmico, em que conseguiu neutralizar vários membros dos grupos armados. O ataque de artilharia foi executado na quarta-feira (16.10), anunciou.
Rússia nega ter militares em Moçambique
A Rússia negou à Lusa ter militares em solo moçambicano. O ministro dos Negócios Estrangeiros e Cooperação de Moçambique, José Pacheco, anunciou há duas semanas que o apoio russo diz respeito ao fornecimento de equipamentos militares.
A zona em causa, umas vezes referida como Nbau outras como Mbau, foi palco de confrontos em 23 de setembro, após um ataque reivindicado pelo grupo 'jihadista' em que terão morrido 10 pessoas e em que foram incendiadas várias casas, incluindo a sede da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), partido no poder.
A região de Cabo Delgado é afetada desde outubro de 2017 por ataques armados levados a cabo por grupos criados em mesquitas da região e que eclodiram em Mocímboa da Praia.
Como consequência já terão morrido, pelo menos, 250 pessoas, quase todas em aldeias isoladas e durante confrontos no mato, mas, nalgumas ocasiões, a violência atingiu transportes na principal estrada asfaltada da região, bem como a área dos megaprojetos de exploração de gás - em que há várias empresas subempreiteiras portuguesas.
Autoridades e analistas ouvidos pela Lusa têm considerado pouco credível que haja um envolvimento genuíno do grupo terrorista nos ataques, que vá além de algum contacto com movimentos no terreno.
A Comissão Nacional de Eleições (CNE) estima que 5.400 eleitores da região não tenham podido votar nas eleições gerais de terça-feira (15.10) por terem fugido da área de residência e por terem perdido os seus haveres, incluindo documentos, nas incursões dos grupos armados.
O que é o Estado Islâmico?
As origens do grupo terrorista remontam à invasão americana do Iraque, em 2003. Nasceu como oposição sunita ao domínio xiita. Inicialmente chamou-se "Estado Islâmico do Iraque e do Levante" e virou ameaça internacional.
Foto: picture-alliance/AP Photo
A origem do "Estado Islâmico"
A trajetória do "Estado Islâmico" (EI) começou em 2003, com o derrube do ditador iraquiano Saddam Hussein pelos EUA. O grupo surgiu da união de diversas organizações extremistas sunitas e grupos leais ao antigo regime, que lutavam contra a ocupação americana e contra o domínio dos xiitas no Governo do Iraque.
Foto: picture-alliance/AP Photo
Braço da Al-Qaeda
A insurreição tornou-se cada vez mais radical, à medida que fundamentalistas islâmicos liderados pelo jordaniano Abu Musab al Zarqawi (foto), fundador da Al-Qaeda no Iraque (AQI), infiltraram as suas alas. Os militantes liderados por Zarqawi eram tão cruéis que tribos sunitas no Iraque ocidental se aliaram às forças americanas, no que ficou conhecido como "Despertar Sunita".
Foto: picture-alliance/dpa
Aparente contenção
Em junho de 2006, as Forças Armadas dos EUA mataram Zarqawi numa ofensiva aérea. Foi então sucedido por Abu Ayyub al-Masri e Abu Abdullah ar-Raschid al-Baghdadi (ambos mortos em 2010). A Al-Qaeda no Iraque (AQI) mudou de nome para Estado Islâmico do Iraque (EII). Nos anos seguintes, Washington intensificou a sua presença militar no país.
Foto: picture-alliance/Photoshot
Regresso dos jihadistas
Após a retirada das tropas dos EUA do Iraque, efetuada entre junho de 2009 e dezembro de 2011, os jihadistas começaram a reagrupar-se, tendo como novo líder Abu Bakr al-Bagdadi, que teria convivido e atuado com Zarqawi no Afeganistão. Ele rebatizou o grupo militante sunita como Estado Islâmico do Iraque e do Levante (EIIL).
Foto: picture alliance/dpa
Ruptura com Al-Qaeda
Em 2011, quando a Síria mergulhou na guerra civil, o Estado Islâmico atravessou a fronteira para participar da luta contra o Presidente Bashar al-Assad. Os jihadistas tentaram uma fusão com a Frente Al Nusrah, outro grupo da Síria associado à Al-Qaeda. Isso provocou uma ruptura entre o EI e a central da Al-Qaeda no Paquistão, pois o líder desta, Ayman al-Zawahiri, rejeitou a manobra.
Foto: dapd
Ascensão do "Estado Islâmico"
Apesar do desentendimento com a Al-Qaeda, o EI fez conquistas significativas na Síria, combatendo tanto as forças de Assad quanto rebeldes moderados. Após estabelecer uma base militar no nordeste do país, lançou uma ofensiva contra o Iraque, tomando a sua segunda maior cidade, Mossul, a 10 de junho de 2014. Nesse momento o grupo já tinha sido novamente rebatizado, desta vez como "Estado Islâmico".
Foto: picture alliance / AP Photo
Importância de Mossul
A tomada da metrópole iraquiana de Mossul foi significativa, tanto do ponto de vista estratégico quanto económico. Ela é um importante ponto de convergência dos caminhos para a Síria. Com a tomada de Mossul, o EI também conquistou 429 milhões de dólares na filial local do Banco Central do Iraque. Assim sendo, o Daesh - como é conhecido em árabe - tornou-se um dos grupos terroristas mais ricos.
Foto: Getty Images
O califado do EI
Além das áreas atingidas pela guerra civil na Síria, o EI avançou continuamente pelo norte e oeste iraquianos, enquanto as forças federais de segurança entravam em colapso. No fim de junho de 2014, a organização declarou um califado, um estado islâmico que atravessa a fronteira sírio-iraquiana e faz lembrar os califados muçulmanos históricos. Abu Bakr al-Bagdadi foi apresentado como "califa".
Foto: Reuters
As leis do "califado"
Abu Bakr al-Bagdadi impôs uma forma implacável da sharia, a lei tradicional islâmica, com penas que incluem mutilações e execuções públicas. Membros de minorias religiosas, como cristãos e yazidis, deixaram a região do "califado". Muitos foram executados, mulheres violadas e vendidas como escravas a jihadistas do EI. Os xiitas também têm sido alvo de perseguição.
Foto: Reuters
Guerra contra o património histórico
O EI já destruiu tesouros arqueológicos milenares em cidades como Palmira (foto), na Síria, ou Mossul, Hatra e Nínive, no Iraque. O EI diz que as esculturas antigas entram em contradição com a sua interpretação radical dos princípios do Islão. Especialistas afirmam, porém, que o grupo vende ilegalmente estátuas pequenas no mercado internacional, enquanto as maiores são destruídas.
Foto: Fotolia/bbbar
Ameaça terrorista
Nas suas ofensivas armadas, o grupo tem saqueado centenas de milhões de dólares em dinheiro e ocupado diversos campos petrolíferos no Iraque e na Síria. Os seus militantes também se apoderaram de armamento militar de fabrico americano das forças governamentais iraquianas, obtendo, assim, poder de fogo adicional. Seguidores da ideologia do EI perpetraram vários atentados terroristas na Europa.