Estradas da Huíla são retrato do abandono estatal em Angola
Anselmo Vieira (Lubango)
8 de fevereiro de 2017
Condutores denunciam as más condições das vias públicas na cidade do Lubango e questionam a cobrança de uma taxa que serviria para a manutenção do asfalto. Governo local diz não ter recursos para pavimentar as estradas.
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Quem circula nas estradas e nos passeios da cidade do Lubango, capital da província da Huíla, no litoral sul de Angola, mal consegue desviar-se dos buracos. O mau estado das vias preocupa os angolanos, que não entendem para que serve a taxa de circulação que têm de pagar ao Governo. As autoridades admitem dificuldades em resolver o problema.
O professor universitário Félix Kwenda classifica como "inacreditável" a condição em que a cidade se encontra. Segundo o docente, "o tapete asfáltico está com imensas crateras, muitos buracos, principalmente nesta altura das chuvas, o que dificulta muito a circulação dos automobilistas".
E perante o mau estado das vias públicas, afirma que a taxa de circulação, imposta pelo Ministério das Finanças aos automobilistas, não está a ser bem aplicada.
"A cidade do Lubango, que outrora foi considerada a cidade jardim de Angola, já teve bons momentos, mas houve recuos significativos em termos de vias de circulação dos automobilistas. Eu não devia me sentir satisfeito com o pagamento da taxa de circulação, porque o estado atual do asfalto na cidade do Lubango não satisfaz", diz Félix Kwenda.
Outros exemplos
Kwenda, que não entende o atual estado do Lubango – a segunda cidade mais populosa de Angola, depois da capital, Luanda – , sugere que o governo provincial da Huíla ponha os olhos noutros exemplos.
"Comparando com as demais cidades, como é o caso de Benguela, Huambo, penso que não seria mau trabalhar tal como os outros governos provinciais estão a trabalhar. Porque não se entende termos o tapete asfáltico que temos hoje", critica Félix Kwenda .
"Não temos sequer uma rua onde não haja crateras. Todas as ruas estão cheias de crateras e os governantes passam nestas ruas todos os dias. E o que é mais caricato é que passam a remendar as estradas com cimento, colocam pedras nas estradas e isto é muito mau", sublinha ainda o professor.
08.02 Mau estado estradas Lubango - MP3-Stereo
O secretário municipal da União Nacional para a Independência de Angola (UNITA), da oposição, no Lubango, Avelino Viye, critica o estado da via que liga a cidade do Lubango às províncias de Benguela e Huambo. "Olhai para as nossas estradas, a ponte do Hoque (Comuna do Hoque) uma estrada interprovincial, é um dos exemplos a não desejar".
Sem recursos
O administrador municipal do Lubango, Francisco Barros, reconhece o mau estado das estradas e admite ter dificuldades em resolver o problema.
"Dificuldades temos para o poder fazer, independentemente da situação económica que vivemos nesta altura. Mas estamos a fazer tudo. A administração também tem estado a fazer o seu trabalho. Infelizmente ainda não atingimos aquilo que nós podíamos considerar de trabalho de excelência", declara.
Pobreza no meio da riqueza no sul de Angola
Apesar da riqueza em petróleo, em Angola vive muita gente na pobreza, sobretudo no sul do país. A região é assolada por uma seca desde 2011 e as colheitas voltaram a ser pobres neste ano. Muitos angolanos passam fome.
Foto: Jörg Böthling/Brot für die Welt
Sobras da guerra civil
A guerra civil (1976 -2002) grassou com particular violência no sul de Angola. Aqui, o Bloco do Leste socialista e o Ocidente da economia de mercado livre conduziram uma das suas guerras por procuração mais sangrentas em África. Ainda hoje se vêm com frequência destroços de tanques. A batalha de Cuito Cuanavale (novembro de 1987 a março de 1988) é considerada uma das maiores do continente.
Foto: Jörg Böthling/Brot für die Welt
Feridas abertas
O movimento de libertação UNITA tinha o seu baluarte no sul do país, e contava com a assistência do exército da República da África do Sul através do Sudoeste Africano, que é hoje a Namíbia. Muitas aldeias da região foram destruídas. Mais de dez anos após o fim da guerra civil ainda há populares que habitam as ruínas na cidade de Quibala, no sul de Angola.
Foto: Jörg Böthling/Brot für die Welt
Subnutrição apesar do crescimento económico
Apesar da riqueza em petróleo, em Angola vive muita gente na pobreza, sobretudo no sul. A região sofre de seca desde 2011 e as colheitas voltaram a ser más no ano 2013. Muitos angolanos não têm o suficiente para comer. A Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO) diz que nos últimos anos pelo menos um quarto da população passou fome durante algum tempo ou permanentemente.
Foto: Jörg Böthling/Brot für die Welt
O sustento em risco
Dado o longo período de seca, a subnutrição é particularmente acentuada nas províncias do sul de Angola, diz a FAO. As colheitas falham e a sobrevivência do gado está em risco. Uma média de trinta cabeças perece por dia, calcula António Didalelwa, governador da província de Cunene, a mais fortemente afetada. O Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) também acha que a situação é crítica.
Foto: DW/A. Vieira
Semear esperança
A organização de assistência da Igreja Evangélica Alemã “Pão para o Mundo” lançou um apelo para donativos para Angola na sua ação de Advento 2013. Uma parte dos donativos deve ser reencaminhada para a organização parceira local Associação Cristã da Mocidade Regional do Kwanza Sul (ACM-KS). O objetivo é apoiar a agricultura em Pambangala na província de Kwanza Sul.
Foto: Jörg Böthling/Brot für die Welt
Rotação de culturas para assegurar mais receitas
Ernesto Cassinda (à esquerda na foto), da organização cristã de assistência ACM-KS, informa um agricultor num campo da comunidade de Pambangala, no sul de Angola sobre novos métodos de cultivo. A ACM-KS aposta sobretudo na rotação de culturas: para além das plantas alimentícias tradicionais como a mandioca e o milho deverão ser cultivados legumes para aumentar a produção e garantir mais receitas.
Foto: Jörg Böthling/Brot für die Welt
Receitas adicionais
Para além de uma melhora nas técnicas de cultivo, os agricultores da região também são encorajados a explorar novas fontes de rendimentos. A pequena agricultora Delfina Bento vendeu o excedente da sua colheita e investiu os lucros numa pequena padaria. O pão cozido no forno a lenha é vendido no mercado.
Foto: Jörg Böthling/Brot für die Welt
Escolas sem bancos
Formação de adultos na comunidade de Pambangala: geralmente os alunos têm que trazer as cadeiras de plástico de casa. Não é só em Kwanza Sul que as escolas carecem de equipamento. Enquanto isso, a elite de Angola vive no luxo. A revista norte-americana “Forbes” calcula o património da filha do Presidente, Isabel dos Santos, em mais de mil milhões de dólares. Ela é a mulher mais rica de África.
Foto: Jörg Böthling/Brot für die Welt
Investimentos em estádios de luxo
Enquanto em muitas escolas e centros de saúde falta equipamento básico, o Governo investiu mais de dez milhões de euros no estádio "Welvitschia Mirabilis", para o Campeonato Mundial de Hóquei em Patins 2013, na cidade de Namibe, no sul de Angola. Numa altura em que, segundo a organização católica de assistência “Caritas Angola” dois milhões de pessoas passaram fome no sul do país.
Foto: DW/A. Vieira
Novas estradas para o sul
Apesar dos destroços de tanques ainda visíveis, algo melhorou desde o fim da guerra civil em 2002: as estradas. O que dá a muitos agricultores a oportunidade de venderem os seus produtos noutras regiões. Durante a era colonial portuguesa, o sul de Angola era tido pelo “celeiro” do país e um dos maiores produtores de café de África.
Foto: Jörg Böthling/Brot für die Welt
Um futuro sem sombras da guerra civil
Em Angola, a papa de farinha de milho e mandioca, rica em fécula, chama-se “funje” e é a base da alimentação. As crianças preparam o funje peneirando o milho. Com a ação de donativos de 2013 para a ACM-KS, a “Pão para o Mundo” pretende assegurar que, de futuro, os angolanos no sul tenham sempre o suficiente para comer e não tenham que continuar a viver ensombrados pela guerra civil do passado.