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PolíticaEtiópia

Etíopes rezam por eleições pacíficas

AFP | Lusa | tm
19 de junho de 2021

A dois dias das eleições na Etiópia, fiéis pedem paz no país marcado pelo conflito no Tigray, que deixou milhares de mortos e milhões de deslocados. Grandes áreas rurais desta região permanecem isoladas.

TABLEAU | Weltflüchtlingstag 20.6.2021 Bildergalerie
Uma mulher etiópe é fotografa num abrigo de refugiados (foto de arquivo).Foto: BAZ RATNER/REUTERS

Por volta do amanhecer, milhares de fiéis reuniram-se neste sábado (19.06) na igreja de Amhara, a segunda maior região da Etiópia, que realizará as eleições há muito aguardadas desta segunda-feira (21.06). Os devotos - alguns apoiados sob bengalas e outros com as suas crianças - ofereceram orações a São Miguel numa igreja com o mesmo nome e coroada com cruzes metálicas e uma bandeira etíope hasteada na cidade de Bahir Dar.

São Miguel é um dos maiores santos do cristianismo ortodoxo etíope - uma fé secular no coração de uma civilização antiga e orgulhosa que evoluiu para a segunda nação mais populosa de África. "Este é um grande dia para nós... Na nossa fé, rezamos a São Miguel para trazer-nos paz, e para proteger-nos do mal", disse Huluager Kinde, um devoto de 27 anos de idade.

Campanha pré-eleitoral na Etiópia. No cartaz, o primeiro-ministro e Prémio Nobel da Paz 2019, Abiy Ahmed.Foto: Shewangizaw Wegayehu/DW

Eleições gerais

As eleições gerais da próxima semana na Etiópia vão ser ensombradas pelo conflito armado no Tigray e são vistas como um teste à liderança reformista do primeiro-ministro e Prémio Nobel da Paz 2019, Abiy Ahmed.Depois de vários adiamentos, são ensombradas pelo conflito armado na região norte do Tigray, onde deslocamentos forçados, violência indiscriminada contra civis e fome ameaçam a vida de milhões de pessoas.

Um ano depois de ter sido distinguido com o Prémio Nobel da Paz, em novembro de 2019, pelos acordos de paz com a vizinha Eritreia, o primeiro-ministro da Etiópia, Abiy Ahmed, lançou a 04 de novembro de 2020 uma ofensiva militar contra a Frente Popular de Libertação do Tigray (TPLF), no poder naquela região do norte da Etiópia, depois de as tensões terem aumentado e de a TPLF ter alegadamente atacado uma base militar federal.

Desde a eclosão do conflito no Tigray, quase dois milhões foram deslocadas internamente.Foto: Million Hailessilasie/DW

Desde então, milhares de pessoas morreram e quase dois milhões foram deslocadas internamente, enquanto pelo menos 75.000 fugiram para o vizinho Sudão, de acordo com números oficiais. Embora o Governo etíope insista que se trata de um assunto interno, o envolvimento das tropas eritreias - que Abiy não admitiu até 23 de março - torna a guerra em Tigray um conflito regional.

De acordo com o responsável de emergências humanitárias das Nações Unidas, Mark Lowcock, a região vive em "situação de fome" com cerca de 5,5 milhões de pessoas - 61% da população de Tigray - em insegurança alimentar aguda e mais de 350 mil encontram-se em condições de "catástrofe humanitária" ou fome extrema, dados refutados pelo governo etíope.

Por outro lado, fontes de organizações humanitárias, citadas sob anonimato pelas agências noticiosas internacionais, asseguram que há provas de uma estratégia de pilhagem generalizada para destruir qualquer infraestrutura na região: desde sistemas de água a hospitais ou indústrias.

Atualmente, apenas 16 dos 40 hospitais do Tigray estão em pleno funcionamento e cinco estão a funcionar parcialmente, de acordo com o Gabinete de Coordenação dos Assuntos Humanitários das Nações Unidas (OCHA). O acesso de trabalhadores humanitários e de meios de comunicação social foi limitado durante os primeiros meses do conflito e o bloqueio da Internet e das telecomunicações, que durou até meados de dezembro e agora permanece intermitente dificultou a documentação da violência contra a população.

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Massacres

Organizações como a Human Rights Watch e a Amnistia Internacional (AI), porém, conseguiram documentar vários massacres de civis nos últimos meses, incluindo a morte de centenas de pessoas pelas tropas eritreias na cidade de Aksum, a 27 e 28 de novembro. 

Embora Adis Abeba tenha agora levantado as restrições burocráticas, grandes áreas rurais de Tigray permanecem isoladas devido aos combates ou porque os atores militares no terreno estão a bloquear o acesso. Pelo menos 1,6 milhões de pessoas permanecem em áreas onde o acesso é extremamente limitado, especialmente no centro e sul da região, de acordo com os últimos dados da ONU. 

Segundo Mónica Camacho, chefe regional dos Médicos Sem Fronteiras (MSF) para a África Oriental, "o acesso é errático, e é impossível planear", diz, "temos cartas das autoridades militares e civis, mas estas permissões nem sempre são respeitadas no terreno", acrescentou.

Na segunda-feira, não haverá eleições em Tigray, não tendo sido fixada qualquer data para futuras eleições. "Estas eleições não resolverão o conflito, vão tornar mais difícil a possibilidade de diálogo, porque são necessárias duas partes legítimas representantes e eleitas pelo povo de Tigray", disse Tsedale Lemma, editor do jornal local Addis Standard.

O Governo etíope rejeita os constantes apelos internacionais à cessação das hostilidades, mesmo após a imposição de sanções pelos Estados Unidos e pela União Europeia. Entretanto, de acordo com especialistas, há um apoio crescente e até mesmo uma adesão entre a população às Forças de Defesa do Tigray (TDF), uma nova formação armada sob a qual membros da TPLF e de partidos que faziam parte da oposição no Tigray se juntaram.

"Não há indicação de que as forças regionais de amhara, o exército federal etíope e as tropas da Eritreia derrotarão completamente a resistência do Tigray, ou vice-versa, nos próximos meses, nem que o TDF se renderá, ou que haverá uma solução negociada", defende William Davison, analista do International Crisis Group (ICG).

"Portanto, é provável que o conflito continue", acrescentou.

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