Há dez meses que a Etiópia vivia em estado de emergência após protestos violentos contra o Governo. Os deputados etíopes decidiram esta sexta-feira pôr fim à medida.
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Os deputados etíopes aprovaram esta sexta-feira (04.08) o levantamento do estado de emergência na Etiópia, imposto em outubro de 2016 após protestos em Oromia e Amara, duas das regiões mais importantes do país, em que morreram centenas de pessoas.
Milhares de pessoas foram detidas durante o estado de excepção, que permitiu às forças de segurança fazerem as detenções sem ordem judicial. Dezenas de pessoas foram acusadas de planear ataques terroristas.
Segundo o ministro etíope da Defesa, Siraj Fegessa, o estado de emergência possibilitou ao Executivo "ultrapassar desafios de segurança", que envolviam "terroristas armados" e "agitadores".
Organizações de defesa dos direitos humanos criticaram o estado de excepção, acusando o Governo da Etiópia de restringir os direitos dos cidadãos.
O passado comunista da Etiópia
A revolução etíope eliminou o legado imperial e abriu caminho à era comunista. Mas a ideologia comunista nunca se adequou a um país profundamente religioso e com uma longa tradição de resistência a influências externas.
Foto: DW/J. Jeffrey
Fornecedor de armas procura-se
"Os Estados Unidos da América não ajudaram quando a Somália declarou a guerra à Etiópia, de modo que a junta militar se dirigiu à União Soviética", diz Abebe Hailu, que cursava Direito quando um movimento estudantil precipitou a queda do imperador etíope. Nos anos 60, muitos alunos no Ocidente estiveram expostos a movimentos inspirados no marxismo-leninismo, antes de regressarem ao seu país.
Foto: DW/J. Jeffrey
Revolta marxista em África
Os líderes soviéticos queriam transformar a Etiópia no baluarte socialista em África, onde eram concorrentes dos EUA na corrida ao controlo e à influência no continente. O Corno de África, a região onde se insere a Etiópia, era de especial interesse para Moscovo por ser próxima de uma passagem marítima crucial, sobretudo para os petroleiros que faziam a rota do Mar Vermelho e do Oceano Índico.
Foto: DW/J. Jeffrey
Zelo revolucionário
Ansioso por obter armas para combater os secessionistas eritreus, Mengistu Haile Mariam, líder do "derg", a junta militar que assumiu o poder após a queda do imperador, fez-se marxista-leninista para agradar a Moscovo. Os militares marchavam para a população, mas cansados da retórica comunista do exército que os governava, os etíopes queriam outra revolução. O resultado foi um derrame de sangue.
Foto: DW/J. Jeffrey
Terror vermelho
A estátua de três mulheres de luto diante do Museu dos Mártires do "Terror Vermelho", perto da Praça Meskal, que já se chamou Praça da Revolução. Em 1976, durante um discurso nesta praça, num gesto teatral, Mengistu partiu uma garrafa cheia de sangue no chão. Foi o ponto de partida para uma campanha que matou dezenas de milhares de etíopes acusados de serem contra-revolucionários.
Foto: DW/J. Jeffrey
Erros repetidos
Este museu retrata a campanha de propaganda do derg para desacreditar o imperador pela faustosa celebração do seu 80º aniversário, durante a fome de 1973, que matou muitos etíopes. Mas o derg cometeu o mesmo erro em 1984, ao celebrar com enorme pompa o décimo aniversário da revolução, na altura de mais um período de fome mortífera, agravando o ressentimento contra os líderes revolucionários.
Foto: DW/J. Jeffrey
Anos de dor
"Um ano depois da nossa graduação, seis dos meus colegas tinham sido executados", diz Abebe. A Etiópia atravessou um período especialmente conturbado entre 1976 e 1978, devido à luta armada entre o derg e forças da oposição. Jovens profissionais e estudantes universitários eram alvos prioritários do derg. Detenções arbitrárias, tortura e execuções sumárias passaram a fazer parte do dia-a-dia.
Foto: DW/J. Jeffrey
Vítimas do reino do derg
As paredes do museu ostentam as imagens de pessoas executadas durante o Governo do derg. "Faz parte da ideologia marxista-leninista; se achas que és progressista, e o outro é conservador - dispara", diz Abebe. "A ditadura militar serviu-se da ideologia para promover os seus próprios interesses, para se manter no poder em nome da ideologia."
Foto: DW/J. Jeffrey
Comandante solitário
Mengistu era apenas um oficial de média patente quando o derg assumiu o poder. Mas com artes maquiavélicas e manobras de bastidores, para além de uma série de purgas de oficiais concorrentes, conseguiu tornar-se no comandante indisputado da junta sangrenta. Em maio de 1991, antes dos tanques dos rebeldes alcançarem Adis Abeba, Mengistu fugiu para o Zimbabué. Onde ainda vive hoje.
Foto: DW/J. Jeffrey
Memórias esvanecidas?
Hoje reina o comércio na antiga Praça da Revolução. A Etiópia enveredou por um caminho capitalista. O pódio de onde Mengistu discursava está arrumado perto da nova linha do elétrico. Para além das memórias dolorosas, pouco resta do passado comunista etíope. "Na minha vida vi acontecerem coisas piores do que alcança a imaginação", diz um homem em tempos apanhado nas teias da revolução de 1974.