Etiópia chega a acordo com Eritreia sobre fronteira
Lusa | gcs
6 de junho de 2018
O Governo da Etiópia aceitou a delimitação fronteiriça com a Eritreia, que tem motivado fortes tensões militares entre os dois países.
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A coligação governamental da Etiópia "decidiu aplicar plenamente" o acordo de Argel, assinado em 2000 para acabar com o conflito entre os dois países, segundo um comunicado governamental, anunciou o Executivo na terça-feira à noite (05.06).
Este anúncio é um passo importante na política do novo primeiro-ministro, Abiy Ahmed, que tinha prometido no seu discurso de tomada de posse, em abril, trabalhar para restaurar a paz com a Eritreia.
"O Governo eritreu deve adotar a mesma posição sem condições prévias e aceitar o nosso apelo à restauração da paz há muito perdida entre os dois países irmãos", acrescentou a coligação governamental, no comunicado.
A Eritreia acedeu à independência em 1993, fazendo com que a Etiópia perdesse a sua única costa, para o Mar Vermelho.
Entre 1998 e 2000, os dois vizinhos travaram uma guerra, que provocou pelo menos 80 mil mortos, com a questão da delimitação da fronteira a figurar entre as razões do conflito. Desde então, os dois países mantêm numerosas forças ao longo da fronteira comum, de mil quilómetros.
De portas abertas: Etiópia recebe os "inimigos" eritreus
Todos os dias, os eritreus deslocados atravessam a perigosa fronteira para buscar asilo em território inimigo, mas a Etiópia parece muito feliz em acomodá-los.
Foto: DW/J. Jeffery
Vagando pelo deserto
"Levamos quatro dias viajando de Asmara", disse um eritreu de 31 anos sobre a caminhada da capital da Eritreia, a 80 quilômetros ao norte da fronteira, depois de chegar à Etiópia. "Viajamos por 10 horas durante a noite, dormindo no deserto durante o dia". Com ele estão outros três homens, três mulheres, seis meninas e quatro meninos.
Foto: DW/J. Jeffery
Sem volta
"As condições de vida na Eritreia são mais perigosas do que atravessar a fronteira", diz um soldado eritreu de 39 anos – agora um desertor depois de atravessar para a Etiópia. Após serem recolhidos por soldados etíopes que patrulham a fronteira, os eritreus são enviados para um centro de registo, onde é iniciado o processo de pedido de asilo na Etiópia.
Foto: DW/J. Jeffery
Vida de acampamento
Os recém-chegados são acomodados em um dos quatro campos de refugiados na região do Tigray na Etiópia. O acampamento de Hitsats é o maior e mais novo, com 11 mil refugiados. Cerca de 80% deles têm menos de 35 anos de idade. "Mesmo que busquem o asilo político, haverá uma questão económica, já que eles são jovens e precisam gerar renda para viver", diz o coordenador do campo, Haftam Telemickael.
Foto: DW/J. Jeffery
Aproveitar ao máximo a situação
A infraestrutura do acampamento é simples, mas digna. Há pouco lixo espalhado e as pessoas fazem o máximo para tornar a sua habitação o mais caseira possível. "Quando eu bebo uma xícara de café entre as flores é bom", diz John, de 40 anos, de pé no pequeno jardim cheio de flores ao redor da casa do acampamento de Hitsats, onde vive com a filha de 10 anos. Sua esposa está na América.
Foto: DW/J. Jeffery
Vida difícil
"O povo eritreu é bom", diz Luel Abera, um funcionário etíope que ajuda a coordenar as chegadas de refugiados antes de se mudarem para um acampamento. "Eles lutaram pela independência por 30 anos. Mas desde o primeiro dia, [o Presidente da Eritreia] Isaias [Afwerki] governou o país sem se importar com os interesses de seu povo". Isaias governou a Eritreia há mais de 25 anos.
Foto: DW/J. Jeffery
Influxo constante
"Não quero falar sobre por que cruzamos a fronteira", diz Haimanot, de 18 anos, que cuida de um pequeno barraco usado para a recarga de telemóveis em Hitsats. Em fevereiro de 2017, mais de três mil eritreus chegaram à Etiópia, de acordo com a agência de refugiados do país. Pelo menos 165 mil refugiados e requerentes de asilo residem na Etiópia, de acordo com a ONU.
Foto: DW/J. Jeffery
Sono tranquilo
"No Sudão há mais problemas. Aqui podemos dormir tranquilamente", diz Ariam, de 32 anos, que chegou a Hitsat há quatro anos com seus dois filhos depois de passar outros quatro anos num campo de refugiados no Sudão. Os refugiados afirmam que os militares da Eritreia realizam missões para capturar eritreus no Sudão. A fronteira da Etiópia com a Eritreia é muito mais protegida contra estas incursões.
Foto: DW/J. Jeffery
Generosidade ou estratégia?
"A resposta da Etiópia é gerenciar o portão e perceber como isso pode se beneficiar com esses fluxos inevitáveis de pessoas", diz a analista de refugiados Jennifer Riggan. Mais dinheiro também é gasto hospedando refugiados devido a esforços internacionais para frear a migração para a Europa. Também é um caminho para a Etiópia reforçar a sua reputação internacional.
Foto: DW/J. Jeffery
A camaradagem supera o ódio
As posições militares da guerra de 1998-2000 entre a Etiópia e a Eritreia ainda estão ao lado da fronteira de hoje. Enquanto isso, ambos os governos acusam-se de conspirar um contra o outro. Mas a Etiópia parece disposta a se redimir com os eritreus comuns. "Somos as mesmas pessoas, compartilhamos o mesmo sangue, até mesmo os avós", diz Estifanos Gebremedhin da agência de refugiados da Etiópia.
Foto: DW/J. Jeffery
Migrar
"Meus filhos estão na América, mas não há razão para eu ir – agora sou um homem velho", diz Tesfaye, de 74 anos, em Shimelba, primeiro campo de refugiados eritreus de Tigray, aberto em 2004. Outros milhares de eritreus vivem em cidades etíopes, fora dos acampamentos. Muitos decidem migrar para fora – alguns legalmente, como os filhos de Tesfaye, mas muitos ilegalmente, e às vezes morrem tentando.
Foto: DW/J. Jeffery
Passado não esquecido
"Os soldados etíopes que nos encontraram foram como irmãos para nós", diz Yordanos, de 22 anos, mãe de dois. A Eritréia era a região mais ao norte da Etiópia antes da sua independência em 1993. Desde então, Tigray passou a ser a região etíope mais ao norte. Por isso, muitos eritreus compartilham a mesma língua, Tigrinya, e a mesma religião e cultura ortodoxa que os habitantes de Tigray.