Etiópia começa a gerar energia na barragem do Nilo Azul
AFP | tms
19 de fevereiro de 2022
A Etiópia inicia neste domingo (20.02) a produção de energia a partir da controversa barragem do Nilo Azul. O projeto envolve polémica com Egito e Sudão, que temem impacto no acesso a água.
Publicidade
"Amanhã será a primeira geração de energia da barragem", disse este sábado (19.02) uma fonte do Governo etíope à agência de notícias AFP.
Uma segunda fonte confirmou a informação. Ambas falaram sob condição de anonimato, porque o marco não foi oficialmente anunciado.
A Grande Barragem Etíope da Renascença (GERD, na sigla em inglês), destinada a ser o maior projeto hidroelétrico em África, tem estado no centro de uma disputa regional desde o seu lançamento em 2011.
Os vizinhos a jusante da Etiópia, Egito e Sudão, consideram a barragem como uma ameaça devido à sua dependência das águas do Nilo, enquanto Adis Abeba a considera essencial para a sua produção de energia e desenvolvimento.
Capacidade de produção
Espera-se que o projeto de 4,2 mil milhões de dólares venha a produzir mais de 5.000 megawatts de eletricidade, mais do que duplicando a produção atual de eletricidade da Etiópia.
"A eletricidade recentemente produzida a partir da GERD poderia ajudar a relançar uma economia que foi devastada pelas forças combinadas de uma guerra mortal, o aumento dos preços dos combustíveis e a pandemia de Covid-19", disse Addisu Lashitew, da Brookings Institution em Washington.
A barragem situa-se no Nilo Azul, na região de Benishangul-Gumuz na Etiópia ocidental, não muito longe da fronteira com o Sudão.
Diálogo mediado pela UA
As conversações realizadas sob os auspícios da União Africana (UA) não produziram um acordo de três vias sobre o enchimento e as operações da barragem, e o Cairo e Cartum exigiram que Adis Abeba deixasse de encher a enorme barragem até que tal acordo fosse alcançado.
Mas representantes etíopes argumentaram que o enchimento é uma parte natural do processo de construção da barragem e não poderia ser interrompido.
O Conselho de Segurança da ONU reuniu-se em julho do ano passado para discutir o projeto, embora a Etiópia tenha mais tarde encerado a sessão como uma distração "inútil" do processo liderado pela UA.
Tunísia: Onde a água é um recurso precioso
04:05
Em setembro, o Conselho de Segurança adotou uma declaração encorajando o Egito, Etiópia e Sudão a retomar as negociações sob os auspícios da UA.
O Egito reivindica um direito histórico ao Nilo que data de um tratado de 1929 que lhe deu poder de veto sobre projetos de construção ao longo do rio.
Um tratado de 1959 impulsionou a atribuição do Egito a cerca de 66 por cento do caudal do rio, com 22 por cento para o Sudão. No entanto, a Etiópia não fez parte desses tratados e não os considera válidos.
Publicidade
Produção de energia
O processo de enchimento do vasto reservatório da GERD começou em 2020, com a Etiópia a anunciar em julho daquele ano ano que tinha atingido a sua meta de 4,9 mil milhões de metros cúbicos.
A capacidade total do reservatório é de 74 mil milhões de metros cúbicos, e o objetivo para 2021 era acrescentar 13,5 milhões de metros cúbicos.
Em julho, a Etiópia disse ter atingido esse alvo, o que significa que havia água suficiente para começar a produzir energia, embora alguns peritos tivessem lançado dúvidas sobre as alegações.
As maiores barragens de África
Nilo, Congo, Zambeze: os rios africanos guardam grande potencial para a produção de energia. Os governos reconhecem isso e apostam cada vez mais em megaprojetos. Um panorama das maiores centrais hidroelétricas de África.
Foto: William Lloyd-George/AFP/Getty Images
Grande Represa do Renascimento, na Etiópia
No sudoeste da Etiópia, está a ser erguida aquela que será a maior barragem de África. A construção da Grande Represa do Renascimento começou em 2011 e deve ser concluída em 2017. A barragem localiza-se perto da fronteira com o Sudão, no Nilo, e terá uma potência de 6.000 megawatts (MW). O reservatório será um dos maiores do continente, com capacidade para armazenar 63 quilômetros cúbicos de água.
Foto: William Lloyd-George/AFP/Getty Images
Represa Alta de Assuão, no Egito
A Represa Alta de Assuão é atualmente a barragem mais potente de África. Está localizada perto da cidade de Assuão, no sul do Egito. O lago atrás da barragem pode armazenar até 169 quilómetros cúbicos de água. Seu maior afluente é o Rio Nilo. As turbinas têm uma capacidade de 2.100 megawatts. A construção durou onze anos e a inauguração foi em 1971.
Uma das maiores barragens do mundo está localizada na província de Tete. A hidroelétrica Cahora Bassa, no rio Zambeze, tem uma potência de 2.075 megawatts, pouco menos que a Represa Alta de Assuã, no Egito. A maior parte da energia gerada é exportada para a África do Sul. No entanto, sabotagens durante a guerra civil impediram a produção de eletricidade por mais de dez anos, a partir de 1981.
Foto: DW/M. Barroso
Represa Gibe III, na Etiópia
A barragem Gilgel Gibe III fica 350 quilômetros a sudoeste da capital etíope, Addis Abeba. Foi concluída em 2016 e pode gerar um máximo de 1.870 megawatts, tornando-se a terceira maior barragem em África. A construção durou quase nove anos e foi financiada a 60% pelo Banco de Exportação e Importação da China, China Exim Bank.
Foto: Getty Images/AFP
Kariba, entre a Zâmbia e o Zimbabué
A barragem de Kariba fica na garganta do rio Zambeze, entre a Zâmbia e o Zimbabué. Tem 128 metros de altura e 579 metros de comprimento. Cada país tem sua própria central eléctrica. A estação norte, da Zâmbia, tem capacidade total de 960 megawatts. A estação sul, do Zimbabué, tem capacidade total de 666 megawatts. As obras de expansão em 300 megawatts começaram em 2014 e devem terminar em 2019.
Foto: dpa
Inga I e Inga II na RDC
As barragens Inga consistem de duas represas. Inga I tem capacidade para produzir 351 megawatts e Inga II, 1424 megawatts. Foram encomendadas em 1972 e 1982, como parte do plano de desenvolvimento industrial do ditador Mobutu Sese Seko. Mas, atualmente, atingem apenas 50% de seu potencial energético.
Foto: picture-alliance/dpa
Inga III
Inga I e Inga II localizam-se perto da foz do rio Congo e ligadas às cataratas Inga. O governo congolês já planeia o lançamento de Inga III, com custo de 13 mil milhões de euros e capacidade de 4.800 megawatts. Juntas, as três barragens seriam a central hidroelétrica mais potente de África.
Merowe no Sudão
O Sudão também depende fortemente de energia eólica com duas grandes barragens no país: Merowe no Rio Nilo (na foto) tem uma capacidade de 1.250 MW e foi construída por uma empresa chinesa. Ainda maior é a barragem de Roseires no Nilo Azul, que desde a sua construção em 1966 foi várias vezes ampliada e conta atualmente com turbinas que têm uma potência total de 1.800 MW.
Foto: picture-alliance/dpa
Akosombo, no Gana
A oitava maior barragem de África é Akosombo, no Gana. Construída na garganta do Rio Volta, a represa teve como resultado o Lago Volta - o lago artificial do mundo, com área de 8.502 quilómetros quadrados. As seis turbinas têm uma capacidade combinada de 912 megawatts. Além de gerar eletricidade, a barragem também protege contra inundações.
Foto: picture-alliance / dpa
Represa Tekezé, na Etiópia
Outra represa grande de África está localizada na Etiópia. A barragem Tekeze encontra-se entre as regiões de Amhara e Tigré. Apesar de seus impressionantes 188 metros de altura, a capacidade máxima da hidrelétrica é de 300 megawatts e, assim, apenas um vigésimo da potência da Grande Represa do Renascimento. A represa entrou em funcionamento em 2009.