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ConflitosEstados Unidos

ONU: EUA vetam cessar-fogo em Gaza

Lusa | DW (Deutsche Welle) | mjp
9 de dezembro de 2023

Os Estados Unidos vetaram um projeto de resolução do Conselho de Segurança da ONU que exigia um cessar-fogo humanitário imediato em Gaza, apesar do apelo inédito lançado pelo secretário-geral António Guterres.

Foto: Amir Levy/Getty Images

A resolução que exigia um cessar-fogo humanitário imediato em Gaza, da autoria dos Emirados Árabes Unidos e que foi apoiada por quase uma centena de Estados-membros, foi rejeitada esta sexta-feira (08.12) com um voto contra dos Estados Unidos (membro permanente, com poder de veto), 13 a favor e uma abstenção (Reino Unido).

Os norte-americanos, aliados de Israel, vetaram pela 35.ª vez, desde 1970, uma resolução sobre a questão israelo-palestiniana (de um total de 39), segundo a agência France Press (AFP), e repetiram assim a sua rejeição a um cessar-fogo.

"Não apoiamos uma resolução que apela a um cessar-fogo insustentável, que simplesmente plantará as sementes da próxima guerra", justificou o vice-embaixador norte-americano na ONU, Robert Wood, denunciando também o "fracasso moral" da ausência de uma condenação específica no texto dos ataques de 7 de outubro perpetrados pelo Hamas.

Wood disse ainda que o projeto era "precipitado", "desequilibrado e divorciado da realidade", e criticou o facto de as recomendações norte-americanas terem sido "ignoradas" durante o processo de consultas.

Também a embaixadora britânica junto à ONU, Barbara Woodward, disse não poder apoiar uma resolução que não condene os ataques terroristas do grupo islamita. "Não podemos votar a favor de uma resolução que não condene as atrocidades cometidas pelo Hamas contra civis israelitas inocentes no dia 7 de outubro. Apelar a um cessar-fogo ignora o facto de o Hamas ter cometido atos de terror e ainda manter civis como reféns", argumentou.

Conselho de Segurança da ONUFoto: Yuki Iwamura/AFP/Getty Images

Apelo inédito de Guterres

O projeto de resolução - agora rejeitado - manifestava "grave preocupação com a situação humanitária catastrófica na Faixa de Gaza e com o sofrimento da população civil palestiniana", sublinhava que "as populações civis palestinianas e israelitas deveriam ser protegidas de acordo com o direito humanitário internacional" e exigia um cessar-fogo humanitário imediato. Exigia também a libertação imediata e incondicional de todos os reféns e a garantia de acesso humanitário.

A votação ocorreu depois de Guterres ter invocado na quarta-feira, pela primeira vez desde que se tornou secretário-geral, o artigo 99.º da Carta das Nações Unidas, pedindo ao Conselho de Segurança, o único órgão da ONU cujas decisões têm caráter vinculativo, que "evitasse uma catástrofe humanitária" no enclave e aprovasse um cessar-fogo.

Na manhã de ontem, numa reunião do Conselho de Segurança, Guterres reiterou esses apelos e explicou que invocou o artigo 99.º da Carta das Nações Unidas devido ao "ponto de rutura" em Gaza, denunciando o elevado risco de "colapso total do sistema de apoio humanitário".

A embaixadora britânica junto à ONU, Barbara Woodward e o representante norte-americano, Robert WoodFoto: Charly Triballeau/AFP/Getty Images

"Existe claramente, na minha opinião, um sério risco de agravamento das ameaças existentes à manutenção da paz e da segurança internacionais", alertou Guterres, denunciando ainda que "não existe uma proteção eficaz dos civis".

"Os olhos do mundo -- e os olhos da história -- estão a observar. É hora de agir", apelou. O líder da ONU sublinhou que, embora o lançamento indiscriminado de foguetes pelo Hamas contra Israel e a utilização de civis como escudos humanos constituam uma violação das leis da guerra, tal conduta "não absolve Israel das suas próprias violações".

Críticas aos EUA

Apesar dos apelos de Guterres e da comunidade internacional, os Estados Unidos opuseram-se explicitamente a um cessar-fogo. "Ao continuar a fornecer armas e proteção diplomática a Israel, que está a cometer atrocidades (...), os Estados Unidos correm o risco de se tornarem cúmplices de crimes de guerra", reagiu Louis Charbonneau, da organização não-governamental Human Rights Watch, num comunicado de imprensa.  

O Ministro dos Negócios Estrangeiros de Israel, Eli Cohen, agradeceu o apoio dos EUA, enquanto o primeiro-Ministro palestiniano, Mohammed Shtayyeh, considerou a votação uma "vergonha".

O representante dos Emirados Árabes Unidos, Mohamed Abshahab, lamentou que, com esta votação, "o Conselho permaneça isolado e, portanto, pareça desligado do seu próprio documento fundador". "Que mensagem estamos a transmitir aos palestinianos se não podemos unir-nos em torno de um apelo para parar o bombardeamentos e ataques incessantes em Gaza?", questionou o diplomata.

Dezenas de manifestantes pró-Palestina, maioritariamente mulheres, protestaram ao final da tarde de sexta-feira em frente à sede da ONU, em Nova Iorque, "indignados" com o veto norte-americano. "Como cidadã norte-americana, estou indignada, muito desapontada e envergonhada com o veto dos Estados Unidos e é por isso que estou aqui a protestar", disse à agência Lusa Alina, de 29 anos.

Cidadãos palestinianos transportam vítimas para o hospital, após ataque aéreo israelita, na sexta-feira (08.12)Foto: Saher Alghorra/Middle East images/AFP/Getty Images

"Os Estados Unidos simplesmente não querem paz. É uma nação que beneficia com a guerra, é um país cujas bases estão sedimentadas em genocídio, em morte e em guerras", argumentou ainda, rodeada por um forte dispositivo policial.

Também a China expressou "profunda deceção" com o veto dos EUA. A proposta "reflete o apelo universal da comunidade internacional e representa a direção certa para o restabelecimento da paz", afirmou o embaixador chinês na ONU, Zhang Jun, citado pela televisão estatal CGTN.

"A China apoia totalmente esta iniciativa e juntou-se à pressão para a elaboração deste projeto de resolução", acrescentou Zhang, que acusou Washington de empregar "dois pesos e duas medidas" ao falar da proteção das mulheres, das crianças e dos direitos humanos, enquanto "consente" na continuação do conflito.

Irão alerta para "explosão incontrolável"

Entretanto, na noite de sexta-feira, a Força Aérea de Israel efectuou ataques aéreos contra vários alvos do Hezbollah no Líbano, informaram os militares este sábado.

As Forças de Defesa de Israel (IDF) publicaram no X, antigo Twitter, que os seus caças tinham atingido alvos do Hezbollah na sua fronteira norte.

O Irão alertou hoje para a possibilidade de "uma explosão incontrolável" no Médio Oriente se os Estados Unidos continuarem a apoiar Israel na guerra contra o grupo islamita palestiniano Hamas em Gaza. "Enquanto os Estados Unidos apoiarem os crimes do regime sionista e a continuação da guerra (...) existe a possibilidade de uma explosão incontrolável da situação na região", afirmou o chefe da diplomacia iraniana.

O alerta de Hossein Amir-Abdollahian foi feito durante uma conversa telefónica com o secretário-geral da ONU, António Guterres, segundo um comunicado divulgado pelo ministério em Teerão e citado pela agência francesa AFP.

"A utilização do artigo 99.º é uma ação corajosa da sua parte para preservar a paz e é apoiada pela opinião pública mundial", disse Amir-Abdollahian a Guterres, segundo o comunicado.

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