Há políticos africanos corruptos que gostam de trazer o seu dinheiro para a Europa. Vários governos europeus pedem uma luta contra a corrupção mais feroz. Só que tribunais parecem estar ainda de pé atrás.
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Jean-Jacques Lumumba quer descobrir a verdade. Mas, no seu país natal, a República Democrática do Congo, muitos preferem varrê-la para debaixo do tapete.
Lumumba trabalhava em Kinshasa no departamento de crédito de um banco gabonês e descobriu movimentações suspeitas. Um dia, avisou a administração do banco e a sua vida mudou de um dia para o outro: foi ameaçado com uma pistola, para não dizer nada. Poucos dias depois, fugiu para França.
O congolês, sobrinhho-neto do herói da independência Patrice Lumumba, denunciou o caso publicamente: mais de 40 milhões de euros teriam sido lavados com a ajuda do banco onde trabalhava, o BGFI.
"Houve empresas implicadas nestas transações próximas do ex-Presidente Joseph Kabila", diz Lumumba em entrevista à DW. "O banco era dirigido por um homem de confiança do Presidente."
David contra Golias
O caso está agora nas mãos da Justiça francesa. É uma contenda de "David contra Golias", comenta o advogado de Lumumba, Henri Thulliez. A sua esperança é que David vença.
Este não é o único processo nos tribunais europeus a envolver líderes africanos. Em outubro de 2017, um tribunal francês condenou Teodorin Obiang, filho do Presidente da Guiné Equatorial, Teodoro Obiang, a três anos de prisão, por desvio de fundos públicos e lavagem de dinheiro. Foi-lhe ainda confiscado património em França, incluindo uma vivenda orçada em cerca de 100 milhões de euros.
A sentença é um triunfo para organizações anticorrupção como a Sherpa ou a Transparência Internacional, que batalharam pelo esclarecimento do caso - mas é uma das poucas histórias de sucesso. Na Suíça, um processo contra Obiang, por suspeitas de branqueamento de capitais, acabou este mês com uma espécie de acordo: a Guiné Equatorial pagou um milhão de euros em custos processuais. Além disso, foram confiscados 25 automóveis de luxo de Obiang, para venda em leilão - a receita será revertida a favor da população da Guiné Equatorial. O caso foi arquivado e Obiang pôde ficar com o iate de luxo que estava em causa no processo, avaliado em cerca de 90 milhões de euros.
É um luxo que contrasta com as vidas da maioria das pessoas no país, lembra Sarah Saadoun, da organização de direitos humanos Human Rights Watch. Segundo a imprensa suíça, entre os automóveis confiscados estão exemplares raros como um Bugatti Veyron ou o Koenigsegg One:1 - cada um, com um preço a rondar os dois milhões de euros.
"A corrupção na Guiné Equatorial prejudicou diretamente os setores da educação e da saúde", diz Saadoun em entrevista à DW. "A Guiné Equatorial tem o maior Produto Interno Bruto per capita do continente, mas a menor taxa de vacinação no mundo." Muito poucos beneficiam das receitas do petróleo.
Faltam normas comuns
Na Europa, os tribunais parecem estar ainda de pé atrás em relação a processos que envolvem elites africanas, comenta o advogado Rui Verde.
"Há o medo de que sejam acusados de colonialistas ou neocolonialistas", afirma.
Em dezembro, a Justiça portuguesa condenou o ex-procurador Orlando Figueira a seis anos e oito meses de prisão por receber dinheiro do ex-vice-Presidente de Angola, Manuel Vicente, para travar inquéritos a alegados casos de corrupção. O caso de Manuel Vicente foi separado do restante processo e enviado para julgamento em Angola. O caso contribuiu para um mal-estar nas relações entre Angola e Portugal.
Gillian Dell, da Transparência Internacional, diz que é preciso fazer mais para levar mais casos à Justiça. A organização denunciou, por exemplo, o Presidente do Gabão, Ali Bongo. Mas o processo contra Bongo foi suspenso em 2017, por falta de provas.
"Há poucos avanços nesta área", refere Dell. "Precisamos de avanços não só nos procedimentos criminais, como também na prevenção da lavagem de dinheiro. Há anos que pedimos mais transparência sobre os titulares de empresas e fundos". Segundo a organização, isso seria facilitado com normas comuns em todos os Estados europeus.
O congolês Jean-Jacques Lumumba, que se refugiou em França depois de fazer denúncias de corrupção no banco onde trabalhava, continua a temer pela sua vida. Ainda assim, não desiste de apurar a verdade: "A verdade não tem preço", afirma. "Mesmo que eu já não exista, a minha luta continuará - não é por mim que eu luto, mas por muitos congoleses."
Mesmo sem a Sonangol, Isabel dos Santos ainda tem um império empresarial
A mulher mais rica de África, filha do ex-Presidente José Eduardo dos Santos, foi exonerada da liderança da petrolífera estatal angolana. Mas continua a ter uma grande influência económica em Angola e Portugal.
Foto: DW/P. Borralho
Bilionária angolana diz adeus à Sonangol
A 15 de novembro, Isabel dos Santos teve de renunciar à presidência do conselho de administração da Sonangol. Em meados de 2016, o seu pai, o então Presidente José Eduardo dos Santos, nomeou-a para liderar a companhia petrolífera estatal. A nomeação era ilegal aos olhos da lei angolana. O novo Presidente angolano, João Lourenço, estava, por isso, sob pressão para demitir Isabel dos Santos.
Foto: picture-alliance/dpa
Carreira brilhante à sombra do pai
Isabel dos Santos, filha de José Eduardo dos Santos e da sua primeira mulher, a jogadora de xadrez russa Tatiana Kunakova, nasceu em 1973, em Baku. Durante o regime do seu pai, no poder entre 1979 e 2017, Isabel dos Santos conseguiu construir um império empresarial. Em meados de 2016, a liderança da Sonangol, a maior empresa de Angola, entrou para o seu currículo.
Foto: picture-alliance/dpa
Conversão aos princípios "dos Santos"
Isabel dos Santos converteu o grupo Sonangol, sediado em Luanda (foto), às suas ideias. Nomeou cidadãos portugueses da sua confiança para importantes cargos de gestão e foi muito criticada pela ausência de angolanos em posições-chave na empresa.
Foto: DW/N. Sul d'Angola
Presença firme nas telecomunicações
Mesmo após o fim da sua carreira na Sonangol, Isabel dos Santos continua forte no meio empresarial: possui 25% da UNITEL desde o seu lançamento, em 2001, a empresa tornou-se a principal fornecedora de serviços móveis e de internet em Angola. Através da UNITEL, dos Santos conseguiu estabelecer vários contactos comerciais e parcerias com outras empresas internacionais, como a Portugal Telecom.
Foto: DW/P. Borralho
Redes móveis em Portugal e Cabo Verde
Isabel dos Santos detém a participação maioritária na ZON, a terceira maior empresa de telecomunicações de Portugal, através de uma sociedade com o grupo português Sonae. Também em Cabo Verde, dos Santos - com uma fortuna estimada em 3,1 mil milhões de dólares, segundo a revista Forbes - está presente nas telecomunicações com a subsidiária UNITEL T+.
Foto: DW/J. Carlos
Expansão com a televisão por satélite
Lançada em 2010 por Isabel dos Santos, a ZAP Angola apresenta-se como o maior fornecedor de televisão por satélite no país. Desde 2011, a ZAP está presente também em Moçambique, onde conquistou uma parcela importante do setor. Em Moçambique, a empresa compete com o antigo líder de mercado, a Multichoice (DSTV), da África do Sul.
Foto: DW/P. Borralho
Bancos: o segundo pilar do império
Atrás das telecomunicações, o setor financeiro é o segundo pilar do império empresarial de Isabel dos Santos. A empresária detém o banco BIC juntamente com o grupo português Américo Amorim - o empresário português conhecido como "o rei da cortiça" que morreu em julho de 2017. É um dos maiores bancos de Angola, com cerca de 200 agências. É também o único banco angolano com agências em Portugal.
Foto: DW/P. Borralho
Com a GALP no negócio do petróleo
Também no petróleo, dos Santos fez parceria com Américo Amorim. Através da empresa Esperanza Holding B.V., sedeada em Amesterdão, a empresária angolana está envolvida na Amorim Energia que, por sua vez, é a maior acionista da petrolífera portuguesa GALP. A GALP também administra os postos de gasolina em Moçambique (na foto) e em Angola onde, curiosamente, compete com a Sonangol.
Foto: DW/B.Jequete
Supermercado em Luanda
Em 2016, abriu em Luanda o Avennida Shopping, um dos maiores centros comerciais da capital angolana. Várias empresas do império dos Santos operam neste centro comercial, como o Banco BIC, a ZAP e a UNITEL. Assim, a empresária beneficia em várias frentes do crescente mercado de bens de consumo em Luanda.
Foto: DW/P. Borralho
350 milhões de dólares em supermercados
Uma das maiores lojas do Avennida Shopping é o hipermercado Candando. É operado pelo grupo Contidis, controlado por Isabel dos Santos. Nos próximos anos, deverão ser construídos em Angola vários Candando. No total, a Contidis quer investir mais de 350 milhões de dólares nas filiais.