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Amnistia Internacional teme "fantasmas do passado" em Angola

5 de setembro de 2022

Amnistia Internacional preocupada com sufoco da liberdade de expressão em Angola. Critica ainda palavras "infelizes" que podem levar à violência, frisando que UNITA e MPLA têm um papel crucial na manutenção da paz.

Foto: John Wessels/AFP

Entrou em vigor, esta segunda-feira (05.09), o despacho datado de 3 de setembro, que coloca em "estado de prontidão combativa elevada" as Forças Armadas de Angola. Uma ação que, segundo a organização de defesa dos direitos humanos Amnistia Internacional traz de volta "fantasmas do passado", referindo-se à guerra civil no país.

Em entrevista à DW África, o diretor-executivo da Amnistia em Portugal, Pedro Neto, lembra a "grande responsabilidade" que, quer o líder da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), quer o líder do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), têm na manutenção da paz em Angola.

Apela, por isso, a que não se entre "em comentários infelizes", como o do candidato do MPLA, João Lourenço, quando falou em festejar "o penta", ou em ações que possam "acicatar a população à violência", numa alusão à publicação por parte do líder da UNITA, Adalberto Costa Júnior, das controversas atas das assembleias de voto em municípios onde o seu partido terá ganho, ao contrário do que dizem os dados oficiais da Comissão Nacional Eleitoral. 

Pedro Neto: "As manifestações e a liberdade de expressão têm sido sempre reprimidas em Angola"Foto: Amnesty International

DW África: Entrou hoje em vigor em Angola o despacho que coloca as Forças Armadas em "estado de prontidão combativa". Até que ponto é posto em causa o direito à reunião e manifestação no país?

Pedro Neto (PN): Este anúncio intimida pelas palavras que foram utilizadas, como "prontidão combativa", ainda por cima de militares. Há aqui, com esta expressão, o regresso de fantasmas do passado, em que este tipo de expressões e prontidão militar também foi utilizada. A diferença é que agora a UNITA não tem um exército como tinha em 1992, quando a guerra civil rompeu de novo.

São fantasmas que, noutras eleições, levaram as pessoas a terem medo de votar e até a violência, nomeadamente antes das eleições em 2008, com carros queimados, casas incendiadas e pessoas feridas. Desta vez, não vimos isso acontecer significativamente antes das eleições, mas estamos a ter notícia disso já depois das eleições. Não queremos fantasmas de guerras civis em Angola, de novo. João Lourenço diz que é hora de festejar o "penta", mas esse foi um comentário muito infeliz, porque é hora é de deixar a democracia falar.

DW África: Nos últimos meses, tem sido notória uma mobilização forte por parte da sociedade que clama por alternância política. Hoje mesmo o Movimento pela Verdade Eleitoral prometeu "manifestações ininterruptas no país". Neste contexto, e caso a população não se deixe intimidar e saia às ruas, pode a situação resvalar para episódios de violência?

PN: Sim e isso não será novidade, infelizmente. Ao longo dos anos, as manifestações e a liberdade de expressão têm sido sempre reprimidas em Angola, até com violência. Claro que, num gesto inédito, o Presidente João Lourenço recebeu alguns ativistas e jovens no palácio presidencial, pouco tempo depois de tomar posse. Luaty Beirão foi uma das pessoas recebidas. Mas está na altura do Presidente em exercício, João Lourenço, que também tem a responsabilidade política pela gestão do Exército, assegurar que este encontro não foi fogo de vista, mas era algo mais profundo e de entendimento pelo respeito da liberdade de manifestação e liberdade de opinião, principalmente quando se discorda dela. 

DW África: No mesmo dia em que o Governo colocou as Forças Armadas em prontidão, Adalberto Costa Júnior tornou públicas as cópias das atas das assembleias de voto em municípios onde a UNITA terá ganho, ao contrário do que disse a CNE. Poderá esta ação agitar ainda mais o ambiente já tenso?

PN: Isto não é um jogo de futebol em que somos pela "equipa A" ou "equipa B". Trata-se do futuro de Angola e, portanto, o resultado aqui é todos saírem vencedores. Os líderes de ambos os partidos políticos mais votados - UNITA e MPLA - devem também garantir que a Constituição, a paz, a ordem pública e a justiça têm espaço para acontecer em segurança e os direitos humanos não são violados neste processo de eleições, que é o garante dos direitos civis e políticos.

Portanto, [deixamos] também aqui o apelo a ambos os líderes para não entrarem em manifestações mais infelizes como festejar o "penta", porque isto não é futebol, ou acicatar a população à violência. Há uma responsabilidade muito grande da parte das duas personalidades que lideram estes partidos para assegurar que tudo é resolvido com paz e segurança.

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