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CriminalidadeMoçambique

Pessoal consular: Falta rigor no quesito idoneidade?

20 de maio de 2025

Ex-adido comercial de Moçambique, apontado como integrante da alta chefia do Comando Vermelho no Brasil, foi preso na Bolívia. Analista diz que Moçambique tem que melhorar os seus mecanismos de verificação.

Crime no Paraguai – 75 prisioneiros do grupo PCC escapam da prisão
Operação policial frente a uma prisão no Paraguai, na fronteira com o Brasil, envolvendo membros do poderoso sindicato do crime designado “Primeiro Comando da Capital” (Foto de arquivo)Foto: picture-alliance/dpa/M. Candia

Mais um criminoso brasileiro com supostas ligações ao consulado moçambicano no Brasil foi detido na última sexta-feira (16.05) na Bolívia. Trata-se de Marcos Roberto de Almeida, ou "Tuta", tido como um dos líderes do Primeiro Comando da Capital (PCC), considerado um dos maiores grupos de tráfico de drogas do Brasil.

A imprensa brasileira divulgou amplamente a notícia no último fim de semana, dando conta de que o mesmo era procurado pela polícia. "Tuta" foi adido comercial do consulado de Moçambique em Belo Horizonte, entre 2018 e 2019, onde há alguns anos outro criminoso que representava o Estado moçambicano trabalhava como cônsul.

Entretanto, o Estado moçambicano negou hoje qualquer envolvimento com o criminoso.

Em entrevista à DW África, Sérgio Gomes, especialista em Relações Internacionais, explica que não existe um documento formal que estabelece as normas para a indicação do cônsul, sendo importantes para o exercício do cargo os princípios de idoneidade e do voluntarismo.

O analista considera, entretanto, que deve-se, previamente, fazer "uma análise profunda do quadro profissional e pessoal, da figura que se pretende indicar como cônsul". No entanto, acrescenta, "nem sempre os Estados representados estão na posse de toda a informação que possa permitir tomar uma decisão informada".

DW África: Que critérios o Estado moçambicano usa para selecionar os seus representantes no estrangeiro?

Sérgio Gomes (SG): Vamos falar no âmbito do direito consular e não do regulamento moçambicano, porque em Moçambique não temos esse regulamento para indicação do cônsul. Não existe um documento formal que estabelece as normas para a indicação do cônsul. Mas há dois princípios que devem ser verificados. Primeiro, é o princípio da idoneidade e o segundo é o princípio do voluntarismo.

A questão da idoneidade é que a pessoa tem a ficha limpa e está em condições de representar Moçambique nos seus interesses de forma mais digna possível. A questão do voluntarismo é que a pessoa tem de querer, não tem um vínculo administrativo temporário e remuneratório com interesse particular em representar e defender os interesses de Moçambique no local onde reside. E também tem de haver vontade do Estado representado, neste caso Moçambique.

DW África: Qual é a margem de erro existente no quesito idoneidade?

SG: Uma das coisas para verificar a idoneidade chama-se "background check”. Então, [deve haver] uma análise profunda do quadro profissional, pessoal, da figura que se pretende indicar como cônsul. E nessa informação podem existir erros, mas o importante é que uma vez identificado o erro haja correção necessária.

E Moçambique já teve um caso desses de cônsul honorário, acho que em Minas Gerais. Depois de tantos anos verificou-se que a pessoa passou a ter um comportamento inapropriado e inadequado à condição do cônsul honorário e essa condição lhe foi retirada em 2020.

Aeroporto Internacional de Confins, em Minas Gerais, um dos circuitos de droga no BrasilFoto: DOUGLAS MAGNO/AFP

Então, existe um erro, porque nem sempre os Estados representados estão na posse de toda a informação que possa permitir tomar uma decisão informada.

DW África: E no caso em que a figura indicada ou escolhida já tem um passado criminoso mesmo antes de ocupar o cargo de cônsul; pode-se dizer que no quesito idoneidade faltou rigor na verificação ou pode haver riscos também de ter um crime premeditado ou uma irregularidade premeditada?

SG: Eu iria talvez para a dimensão da impossibilidade de ter toda a informação para se tomar a decisão. Eu não acredito que um Estado que se pretende credível se associe, de forma deliberada, com pessoas com um passado pouco recomendado.

DW África: No caso do Brasil, esta é a segunda vez que Moçambique indica dois criminosos. É caso para se afirmar que é preciso haver mais rigor do lado moçambicano para a indicação dos cônsules, principalmente neste país?

SG: É preciso também verificar o seguinte em relação ao que despoletou este caso atual. O cidadão Marcos Roberto de Almeida nunca foi indicado por Moçambique como cônsul. Há um comunicado do Ministério dos Negócios Estrangeiros de hoje que se distancia [dessa versão]. Mas é um cidadão que foi indicado como cônsul em Minas Gerais e esse vínculo já terminou em 2020.

Entretanto, este cidadão Marcos Roberto de Almeida pode ter sido funcionário do consulado honorário de Moçambique em Minas Gerais. Ora, no caso dos consulados, o país representado não tem palavra na indicação dos funcionários nesse consulado. Então, como dissemos, é na base voluntária.

Então, se esse senhor trabalhou uma vez nesse consulado, que já não existe, não foi com ligação direta a Moçambique. Foi com ligação direta ao cônsul que havia sido reconhecido por Moçambique.

Há quem indica os adidos, os funcionários; mas há o voluntário que se predispôs a representar os interesses de Moçambique. Como o país Moçambique tem de melhorar os seus mecanismos e critérios de verificação.

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