Cabo Verde tornou-se independente de Portugal em 5 de julho de 1975 e hoje é visto como exemplo de desenvolvimento para a África, apesar de seu modelo não ser totalmente replicável.
Cabo verdianos protestam no 1 de maio, na cidade da PraiaFoto: Angelo Semedo/DW
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Cabo Verde comemora este sábado, dia 5 de julho, 50 anos da sua independência de Portugal. Nas últimas cinco décadas, o país deu um salto notável no seu desenvolvimento, especialmente nos domínios da educação e saúde. Há quem o considere um modelo para toda África. Será assim mesmo?
Gualberto do Rosário, ex-primeiro-ministro do país, entre 2000 e 2001, prefere não fazer comparações. "Eu não gosto muito de fazer esta comparação, de Cabo Verde com os outros países de África", disse.
"Nós podemos dizer que temos indicadores nos domínios da saúde, educação e outros domínios sociais, que estão acima da média, comparativamente a outros países, mas temos que olhar para estes números com cautela. É preciso fazer o enquadramento histórico, cultural, geográfico daquilo que são os resultados de Cabo Verde", acrescentou.
Em 1975, 65% da população cabo-verdiana era analfabeta. A taxa atual é de apenas 3%. O sistema de saúde também melhorou significativamente: em 1974, havia apenas 13 médicos e dois hospitais; atualmente, há centenas de médicos a trabalhar no país e a maioria das ilhas tem hospitais.
Em Cabo Verde, a esperança média de vida é de cerca de 74,7 anos, uma das mais elevadas do continente africano.
Antes do fim do período colonial, em 1975, havia poucos médicos nas ilhas de Cabo VerdeFoto: IMAGO/UIG
"Balanço positivo"
Gualberto do Rosário, que foi também ministro em vários governos, não tem dúvidas. "O balanço é positivo, valeu a pena. Cabo Verde de hoje não tem nada a ver com Cabo Verde de 1975", disse.
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António da Silva é o atual Secretário Executivo da Comissão da sociedade civil que está a organizar as celebrações da independência. Também ele faz um balanço positivo dos últimos 50 anos no país.
"Estamos orgulhosos daquilo que fizemos em Cabo Verde, porque em 1975 havia uma grande pobreza que hoje não existe. Ao nível da educação, havia unicamente dois liceus em Cabo Verde e uma escola técnica em São Vicente e os estudantes de todas as outras ilhas teriam que vir ou para a Praia ou São Vicente [para estudar]".
António da Silva é também ex-combatente da liberdade. "Indiscutivelmente, temos hoje uma situação em Cabo Verde que em 1975 poucos acreditavam na sua viabilidade. Até nós que estávamos à frente da luta, tínhamos receio porque de facto era muito pobre. Mas hoje, felizmente, em todos os níveis, Cabo Verde está muito bem posicionado a nível africano e a nível mundial".
Amílcar Cabral, líder histórico da luta anticolonial, foi o principal ideólogo da independência de Cabo Verde e Guiné-Bissau, deixando um legado duradouro de resistência e pensamento político em África Foto: casacomum.org/Documentos Amílcar Cabral
Progressos
Ainda assim, e apesar dos progressos alcançados, cerca de 2,3% da população vive em situação de pobreza extrema. Outro desafio no país é a migração. Entre 2009 e 2021, cerca de 34 mil jovens cabo-verdianos deixaram o país. Apesar do aumento do salário mínimo de 100 para 154 euros, são muitos os que procuram melhores condições de vida no estrangeiro. Uma realidade que, diz Gualberto do Rosário, é comum a muitos países.
"Quando nós temos emigração massiva, normalmente saem os mais capazes, os mais bem formados, esta é a realidade da emigração em todo o lado, não é diferente aqui em Cabo Verde. E uma coisa muito notável que é importante é que a emigração cabo-verdiana nunca esteve ausente do país. Nunca os emigrantes voltaram as costas ao país”.
Com mais de 550.000 habitantes em nove ilhas habitadas e uma diáspora de cerca de dois milhões, Cabo Verde é hoje um dos países mais estáveis e desenvolvidos de África.
As visões do império colonial português
Exposição em Lisboa revela as facetas do colonialismo português com imagens que poderão ser vistas pelo público ao longo de 2021. Muitas fotos foram cuidadosamente recuperadas. Algumas estavam esquecidas e danificadas.
Foto: AHU/EGEAC
Padrão dos descobrimentos
No Padrão dos Descobrimentos, situado em Belém, à margem direita do rio Tejo, está aberta ao público uma exposição inédita, que reúne um conjunto de imagens fotográficas a retratarem momentos diversos da história colonial portuguesa nos territórios outrora dominados por Portugal. Entre elas, estão expostas imagens que também serviram para denunciar a iniquidade e a violência da colonização.
Foto: Joao Carlos/DW
Imagens que passaram de mão em mão
Esta fotografia do Sebastião Langa, feita em Lourenço Marques, Moçambique [1962, Centro de Documentação e Formação Fotográfica], abre a mostra. Na composição da exposição é possível encontrar imagens que passam de mão em mão, oficial ou clandestinamente. Muitas fotos foram esquecidas ou até mesmo destruídas. São imagens que documentam sonhos e memórias individuais e coletivas.
Foto: José Frade/EGEAC
A visão do outro diferente
A exposição pode ser visitada ao longo de 2021. Os curadores Joana Pontes e Miguel Bandeira Jerónimo [ao centro] consideram que as imagens contribuíram para uma visão do "outro" como essencialmente diferente nos seus modos de vida, costumes e mentalidade, concorrendo para estabelecer leis e práticas de discriminação política, social, económica e cultural, desenhadas ao longo de linhas raciais.
Foto: José Frade/EGEAC
Legitimar o domínio colonial
Para o Estado imperial, a “ocupação científica” das colónias foi um desígnio importante. O trabalho de campo e o alegado progresso científico ajudaram a legitimar o domínio português sobre terras e gentes dos territórios africanos reclamados por Portugal, nomeadamente em África.
Foto: IICT-MAEG Archiv
Interagir com usos e costumes
Para governar populações muito diversas, o regime colonial considerou necessário alargar o conhecimento sobre as suas "tradições, usos e costumes”, bem como as suas formas de organização e interação social. Sem esse conhecimento, de acordo com os curadores, a recolha de impostos, a obtenção de mão de obra ou a exploração das matérias-primas coloniais seriam impossíveis.
Foto: Joao Carlos/DW
Poder, ordem, lealdade e obediência
A foto documenta a viagem do ministro das Colónias à Guiné, em 1935. A imagem do Arquivo Histórico Ultramarino traduz a "projeção da autoridade e da soberania, por vezes laboriosamente encenada". Naquele contexto, a imagem foi decisiva porque contribuiu para estimular visões de poder e ordem, lealdade e obediência, além das ideias de alegada "civilização" e "progresso".
Foto: AHU/EGEAC
"Levar os indígenas a trabalhar"
Para o regime colonial português, a dificuldade era levar os indígenas a trabalhar. As autoridades portuguesas sabiam que "sem os braços africanos, a criação de novos Brasis em África era impossível". A mão de obra africana foi decisiva nas missões alegadamente "científicas”, assim como na construção de infraestruturas, na extração das matérias-primas e nas plantações.
Foto: Joao Carlos/DW
Escravatura no império colonial
A escravatura está bem documentada com imagens de trabalho forçado nas roças de cacau em São Tomé e Príncipe, onde também foi usada mão de obra infantil. A abolição do tráfico de escravos e da escravatura no império português, no século XIX, não conduziu ao fim de formas de trabalho coercivas e de condições laborais desumanas.
Foto: Joao Carlos/DW
Educar e evangelizar
Desde muito cedo, a educação e a evangelização foram proclamadas por governantes, autoridades religiosas e educativas como objetivos da chamada "missão civilizadora". A sua concretização, contudo, esteve longe de corresponder à retórica imperial, como referem no seu texto Miguel Jerónimo e José Pedro Monteiro.
Foto: Joao Carlos/DW
A batalha do desenvolvimento
A promessa de progresso e elevação material esteve intrinsecamente ligada à expansão portuguesa em África. O chamado "fomento colonial" foi sobretudo encarado como crescimento económico. Mas, a "batalha do desenvolvimento", que incluiu o uso sistemático da fotografia, foi um fator importante na resistência aos "ventos da mudança". Assim referem os organizadores da exposição.
Foto: Joao Carlos/DW
Pôr fim à guerra colonial
Portugal envolveu-se num conflito colonial em três territórios africanos a partir de 1961-1964. Foi necessário que o Movimento das Forças Armadas, em 25 de abril de 1974, tomasse o poder para que Portugal abrisse negociações com os movimentos de libertação, pondo fim à guerra para concretizar as aspirações dos povos colonizados.
Foto: Joao Carlos/DW
Visões da independência
A fotografia, de acordo com os curadores, não deixou de desempenhar um papel importante na documentação da emancipação política associada à descolonização. Esta imagem, por exemplo, mostra colonos portugueses no porto de Lourenço Marques, despachando os seus haveres para Portugal, na sequência da independência, em junho de 1975.
Foto: Joao Carlos/DW
Novas nações
Com significados e usos diversos, as imagens da parte final da exposição, forjadas nas lutas anticoloniais, marcaram o período da descolonização e continuam a condicionar as memórias do passado colonial. A descolonização abriu portas às independências. Os países que lutaram pela conquista da soberania e da autodeterminação aspiraram erguer novas nações, como representa esta instalação mista.