Explosão de camião-cisterna no distrito de Moatize
Amós Fernando (Tete)
17 de novembro de 2016
Pelo menos, 44 pessoas morreram e mais de 120 ficaram feridas, algumas delas com queimaduras graves, numa explosão de um camião-cisterna na província moçambicana de Tete. As autoridades investigam as causas do incidente.
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Pelo menos, 44 mortos e mais de 120 feridos é o balanço provisório de uma explosão de um camião-cisterna, que teve um acidente na quarta-feira (16.11.), na localidade de Caphirizadje, no distrito de Moatize, província de Tete. A Rádio Moçambique fala, entretanto, em 73 vítimas mortais.
O Banco de Socorros do Hospital Provincial de Tete está a receber os feridos mais graves, muitos deles com queimaduras. Até agora, há registo de 45 feridos em estado grave, incluindo 15 crianças.
"Há duas senhoras grávidas, com queimaduras de terceiro grau. Isto preocupa-nos bastante", lamentou José Mendonça, porta-voz do Governo provincial de Tete.
Numa conferência de imprensa, na noite de quinta-feira, Mendonça referiu que os números das vítimas ainda podem aumentar. "Estamos atentos a toda a informação necessária. A comunidade toda está em alerta. Teremos informações que poderão advir de vários locais", disse.
Causas por esclarecer
As causas da explosão permanecem incertas, e há versões contraditórias sobre o que poderá ter acontecido.
No local, avança-se que problemas no camião-cisterna ou um curto-circuito poderão ter estado na origem do incidente. Alguns residentes afirmam, no entanto, que a explosão ocorreu depois de muitas pessoas acorrerem ao local na tentativa de roubar combustível. Um agente da polícia que se encontrava de guarda ao veículo teria, então, disparado tiros para as dispersar.
Já Japhy Saimone, um dos primeiros feridos a chegar ao hospital de Tete com queimaduras em quase todo o corpo, tem outra versão: "O carro de tanque caiu ontem [quarta-feira]. Vieram polícias que estavam a tirar o combustível para vender às pessoas da vila de Moatize. Nós estávamos a assistir. Não sei o que aconteceu. Eles dispararam e depois começou a haver fogo", testemunhou o jovem.
18.11 Explosão de camião em Tete - MP3-Mono
Questionado sobre as declarações das testemunhas, o porta-voz do Governo provincial de Tete afirmou que "as informações ainda são escassas" e que as autoridades estao a investigar o caso: "Também há indícios de que pode ter havido um fenómeno que pode ocorrer dentro do tanque, em que o escape de ar pode causar também uma combustão. Portanto, não temos ainda ideias claras da fonte primária do incêndio. Naturalmente, a perícia que está a ser realizada irá até [sexta-feira] trazer-nos estes dados", garante Mendonça.
Técnicos de saúde mobilizados
Vários especialistas de saúde foram mobilizados para o Hospital Provincial de Tete e para o hospital rural de Moatize.
"Os colegas das ONG e das clínicas privadas estão aqui a apoiar-nos. Apoiaram-nos com a sua presença física e com materiais", disse à DW África Verónica de Deus, diretora do Hospital provincial de Tete. "Estamos a receber as vítimas, as mais graves estão a vir para cá. Aquelas que podem ser resolvidas em Moatize estão sendo atendidas lá".
O governador de Tete, Paulo Auade, visitou na quinta-feira à noite os doentes em tratamento no hospital de Tete. Depois da visita, Auade garantiu apoio às famílias cujos membros pereceram na explosão.
O Governo moçambicano já criou uma equipa de trabalho, que a partir desta sexta-feira, vai trabalhar em Tete, para se inteirar do incidente.
A equipa é chefiada pela ministra da Administração Estatal e Função Pública, Carmelita Namashulua, e integra o ministro dos Transportes e Comunicações, Carlos Mesquita, o vice-ministro da Saúde, Mouzinho Saíde, e o diretor do Instituto Nacional de Gestão de Calamidades, Osvaldo Machatine.
(Notícia atualizada às 08:54 de 18.11.2016)
Faces de Tete e do carvão de Moçambique
A vida mudou na província de Tete desde a chegada de empresas multinacionais para explorarem o carvão. Os ventos da mudança trouxeram, para alguns, oportunidades para melhorar de vida; para outros, novas preocupações.
Foto: DW/Marta Barroso
Coque, o trabalhador
Coque tem 28 anos. Trabalha há quatro anos na empresa mineira britânica Beacon Hill. Lá, amarra lonas nos camiões que transportam o carvão até ao vizinho Malawi. Tal como muitos jovens na região, dantes Coque fabricava tijolos que vendia no mercado local. Mas hoje, diz, vive melhor. Por camião recebe 800 meticais, cerca de 20 euros, que divide com o colega que estiver com ele no turno.
Foto: Marta Barroso
Paulo, o diretor de operações da Vale
Apesar dos enormes incentivos fiscais de que gozam as empresas dos megaprojetos em Moçambique, como a brasileira Vale, Paulo Horta diz que um projeto de mineração como o de Moatize gera uma cadeia produtiva tão grande que a população local beneficia em grande medida com a sua vinda para Tete: através da criação de outras empresas, serviços, tributos gerados por terceiros e criação de empregos.
Foto: DW/Marta Barroso
Gomes António, vítima de maus tratos
Gomes António Sopa foi espancado e detido pela polícia na sequência da manifestação de 10 de janeiro de 2012, quando os habitantes de Cateme bloquearam a passagem do comboio que transportava carvão das minas até ao porto da cidade da Beira. Muitas das promessas feitas pela Vale, responsável pelo reassentamento de centenas de famílias, continuam por cumprir. Ainda hoje, Gomes António sente dores.
Foto: Marta Barroso
Duzéria, a curandeira
Os habitantes do Centro de Reassentamento de 25 de Setembro, no distrito de Moatize, queixam-se de que muitos aspetos culturais não foram respeitados durante o processo de reassentamento pelas empresas mineiras. A curandeira do bairro, por exemplo, diz que no planeamento do complexo não se teve em conta a construção de uma casa para o seu espírito.
Foto: Marta Barroso
Lória, a rainha
Provavelmente Lória Macanjo e a sua comunidade deverão ser reassentadas brevemente: a multinacional Rio Tinto está já a operar um mina de carvão em Benga, perto da sua aldeia, Capanga. Também aqui, debaixo da terra que herdou do pai, a empresa mineira descobriu carvão. Mas a rainha sabe do destino dos que já se mudaram e recusa-se a deixar a sua casa.
Foto: DW/Marta Barroso
Olivia, a cabeleireira
Olivia (esq.) tem 29 anos e veio em 2008 do seu país, o Zimbabué, fugindo à crise financeira que lá se vive. Tete é agora a terra das grandes oportunidades, tinham-lhe dito. Hoje, é cabeleireira no Mercado Primeiro de Maio e, tal como a amiga Faith (dir.) faz trabalhos de manicure. Diz que, por dia, consegue 500 a 1000 meticais, entre 15 e 25 euros. Com esse dinheiro consegue sustentar-se.
Foto: DW/Marta Barroso
Guta, o empresário
Ao todo, Guta emprega 130 homens nas áreas de carpintaria e construção civil na cidade de Tete. Diz que desde a chegada das grandes empresas à região não sentiu grandes alterações no seu negócio. Os projetos de mineração requerem quantidades às quais não consegue responder. Uma vez, conta, a Vale pediu que fornecesse, juntamente com outra carpintaria da cidade, 5000 portas em 60 dias.
Foto: DW/Marta Barroso
Canelo, o vendedor de amendoins
Canelo diz que tem 11 anos. E diz também que frequenta a segunda classe. Todas as tardes vende amendoins no centro de Tete. "Para ajudar a mãe que não tem trabalho." O pai também está desempregado. Canelo é uma de muitas crianças que vendem amendoins na cidade. Um saco pequeno fica por dois meticais, cerca de cinco cêntimos de euro, o maior custa cinco meticais, treze cêntimos de euro.
Foto: DW/Marta Barroso
Catequeta, o ativista
Manuel Catequeta mudou-se para Tete em 2001. O ativista dos direitos humanos sabe o que custa viver com a subida constante do custo de vida. O seu salário não lhe permite luxos. A sala de sua casa "de dia é sala, de noite vira quarto". Mas mudar de casa, para já, está fora de questão. Hoje em dia, uma boa casa na capital provincial passa dos 5.000 dólares, cerca de 4.000 euros, por mês.
Foto: DW/Marta Barroso
Júlio, o otimista
O músico Júlio Calengo vê oportunidades de negócio, agora que em Tete há tantas empresas novas. O seu objetivo é, em breve, montar uma empresa de limpeza: tanto nos escritórios das empresas mineiras como nos das firmas que entretanto apareceram na cidade. Interessados não vão faltar, diz Júlio. O que é preciso é ter criatividade e, claro, dinheiro.