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Exposição do BES a Angola é um risco, consideram analistas portugueses

João Carlos (Lisboa)24 de julho de 2014

O BES poderá perder cerca de 3 mil milhões de euros aplicados em Angola. O Estado angolano decidiu assumir o controlo da instituição, uma vez que mais de 70% da sua carteira de crédito beneficia de garantia soberana.

BES, Banco Espírito Santo, em LisboaFoto: DW/J.Carlos

A exposição do Banco Espírito Santo (BES) a Angola é um dos maiores riscos para a instituição financeira portuguesa e constitui uma das maiores preocupações do seu novo presidente executivo, Vitor Bento, afirma Maria João Gago.

Para a jornalista portuguesa "essa preocupação resulta do facto de, além de ter a maioria do capital, uma posição que está avaliada em mais de 600 milhões de euros, o BES tem também uma linha de financiamento ao Banco Angolano de 3 mil milhões de euros."

Maria João Gago acrescenta que "há um receio da admnistração do banco de que seja difícil, ou não haja garantias de recuperação dessa linha de financiamento, tendo em conta até que, como tem sido noticiado, já foi reconhecido pelo governador do Banco Nacional de Angola. O BES Angola (BESA), vai precisar de uma injeção de capital, que deverá ser assegurada por investidores angolanos, até pelo próprio Estado angolano."

Apesar da difícil situação a jornalista de economia está otimista quanto ao futuro do segundo maior banco privado e o terceiro maior do sistema financeiro português: "Eu penso que não há esse risco do colapso do banco, há aqui um probelma que tem a ver com a exposição do banco à área não financeira do Grupo Espírito Santo, que esse sim, está em sérios riscos de colapso, e portanto há esse problema."

Maria João Gago, jornalista e escritora portuguesaFoto: DW/J.Carlos

Otimismo

Maria João Gago dá mesmo um voto de confiança aos dirigentes do país sobre o caso: "E como tem garantido as autoridades, desde o governador do Banco de Portugal, e o próprio presidente do executivo, Victor Bento, e até o próprio Presidente da República e o primeiro-ministro, há uma almofada de capital que à partida é mais do que suficiente para absorver o eventual colapso da área não financeira do grupo Espírito Santo."

Maria João Gago e a colega Maria João Babo, do Jornal de Negócios, são as autoras do recém lançado livro "O Último Banqueiro. Ascenção e Queda de Ricardo Salgado”, que aborda também a ligação do BES a Angola.

Nos últimos meses, o anterior presidente do BES, Ricardo Salgado, fez várias deslocações a Luanda para negociar uma garantia soberana do Estado angolano ao banco privado português.

Livro escrito por Maria João Gago e Maria João BaboFoto: DW/J.Carlos

De acordo com Gago, isso "porque mais de 70% da carteira de crédito desta instituição está em sério risco de incumprimento para reduzir a necessidade do BES, contabilizar perdas nessa operação, o Estado angolano concedeu então essa garantia soberana que permitiu reduzir o impacto do crédito mal-parado no BES."

O presidente executivo do BES, Vitor Bento, que prometeu um novo capítulo para a instituição financeira, tem o dossier Angola na linha das suas prioridades. E defendeu como passo importante reconquistar a confiança dos investidores e pôr fim à especulação.

Salgado ouvido em tribunal

E nesta quinta-feira (24.07) Ricardo Salgado foi detido e interrogado em tribunal devido a suspeitas de branqueamento de capitais e fraude fiscal. A detenção aconteceu no contexto da operação Monte Branco, levada a cabo pelo Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), em Portugal.

Enquanto isso o novo presidente do BES Vitor Bento aposta no reforço do capital do banco, que passa pela entrada de novos acionistas, para evitar o recurso à linha de capitalização do Estado.

Mas, João Paulo Batalha, diretor executivo da "Transparência e Integridade - Associação Cívica" (TIAC), considera que é difícil seguir o rasto das operações financeiras do Grupo Espírito Santo porque tem uma estrutura opaca com muitas ramificações.

E ele explica: "Do que sabemos do BES, também em Angola, é que o grupo replicou em Angola, o mesmo modelo de negócio que tinha em Portugal, baseado em relações muito promíscuas, muito pouco transparentes com os poderes políticos e um conjunto de negócios facilitados a certas figuras do regime, quer em Portugal, quer em Angola, que depois são contabilizadas de uma maneira muito estranha."

João Paulo Batalha, diretor executivo da "Transparência e Integridade - Associação Cívica" (TIAC),Foto: DW/J.Carlos

Foi assim que, em Angola se descobriram buracos multimilionários, atirando as culpas para o anterior administrador, refere o diretor executivo da organização não governamental portuguesa.

Na opinião dele "o administrador terá eventualmente responsabilidades", e acrescenta: "Mas é preciso que essas responsabilidades sejam também apuradas aqui em Portugal na estrutura do topo do grupo, até porque percebemos com a evolução do grupo Espírito Santo aqui em Portugal que havia muitos outros negócios muito pouco claros, de prejuízos escondidos em Portugal, Luxemburgo, Angola e outras praças finnaceiras onde o BES está presente."

Queda do BES na Bolsa

Bolsa de Valores de PortugalFoto: DW/J.Carlos

Nas últimas semanas, o BES perdeu metade do valor na Bolsa de Lisboa em apenas sete sessões, encolhendo mais de dois mil milhões de euros.

Maria João Gago fala de alguma incerteza nos mercados, que está a penalizar o banco na Bolsa: "Penso que não é uma questão de desconfiança total, acho que há receio dos investidores que neste momento estão a penalizar as ações, também decorrente do facto do BES ter feito recentemente um aumento de capital, portanto, houve entrada de novos investidores no banco e obviamente que quando esses investidores entraram há pouco mais de um mês ainda não eram evidentes todos estes problemas."

O BES é o primeiro banco estrangeiro a instalar-se em Angola depois da independência a 11 de novembro de 1975, tendo assumido um papel importante na atração de investimento chinês para o país.

Um dos maiores acionistas do BESA, com 55,7% do capital, o BES Portugal foi criado há quase 100 anos pelo filho mais velho do fundador do Grupo Espírito Santo, com perto de um século e meio de história. Com esta crise, fica apenas na instituição o nome da família.

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