Extensionista do Sustenta: "Trabalhamos à sorte de Deus"
11 de julho de 2025
Em Moçambique, extensionistas do projeto agrícola já extinto Sustenta denunciam atrasos no pagamento dos salários e ausência de direitos laborais. Patrocínia Nhanombe revela: "Não temos seguro, não temos nada, estamos a trabalhar à sorte de Deus".
O contrato do mais famoso projeto agrícola do país com estes profissionais, que prestam assistência aos agricultores no terreno, termina agora em julho, e o desemprego é o que os aguarda — uma situação que deixa Patrocínia desesperada.
Recentemente, circulou um vídeo nas redes sociais onde os profissionais perseguiam a diretora nacional da Agricultura, Adélia Magaia, a exigir os seus salários. Em entrevista à DW, Patrocínia Nhanombe, extensionista do Sustenta, diz sentir-se "desgastada".
ENTREVISTA
DW África: Circulou recentemente um vídeo nas redes sociais em que os extensionistas do Sustenta confrontam a antiga diretora nacional da Agricultura. O que aconteceu exatamente naquele momento e o que motivou essa ação?
Patrocínia Nhanombe (PN): Esse vídeo referia-se ao atraso de salários. Estávamos com três meses de atraso salarial e estávamos realmente a reivindicaros nossos direitos junto da antiga diretora nacional da Agricultura, que é a senhora Adélia Magaia. Mas depois de ter circulado aquele vídeo, não passou nem três semanas até a situação salarial ser regularizada.
Neste momento, a situação dos salários está regularizada. Aguardamos apenas os últimos dois meses que estão em dívida — junho e julho.
DW África: Esses atrasos eram uma constante no Sustenta?
PN: Sim. Todos os anos, desde que o projeto iniciou, nunca tivemos salários pagos regularmente. Todos os anos havia atrasos de dois ou três meses. Nunca houve regularidade no pagamento dos salários.
DW África: Vocês foram informados que o Sustenta foi extinto. Estão salvaguardados os vossos direitos trabalhistas?
PN: Não. Nunca estiveram salvaguardados, nem estão. Nunca tivemos qualquer seguro, nem de saúde, nem de risco. Não temos seguro, não temos nada. Estamos a trabalhar mesmo à sorte de Deus.
Se tiveres um acidente, tens de custear as tuas próprias despesas até melhorares e poderes voltar ao serviço. Se um colega perde a vida, também não tem direito a subsídio de funeral, nem a qualquer outro direito.
DW África: Já se organizaram para levar o caso à Justiça?
PN: Não. Concretamente, aqui na minha província, isso ainda não aconteceu. Acredito que também nas outras províncias porque ainda não vi nenhuma manchete ou qualquer menção nos grupos de WhatsApp — porque somos muitos colegas e temos grupos no WhatsApp, até em Maputo. Ainda não nos organizámos para tal.
DW África: Extinto o Sustenta, os extensionistas e todos os outros ligados ao projeto vão para o desemprego?
PN: Sim. Imediatamente.
DW África: O Ministério da Agricultura não terá projetos que possam incluir os seus colegas, os extensionistas do Sustenta?
PN: Não. Neste momento, as orientações que temos indicam que não há nenhum projeto em curso onde possamos ser integrados. Ainda estamos à espera de segundas orientações por parte dos superiores, mas, neste momento, não há qualquer projeto previsto para nós. Está apenas em estudo.
DW África: Qual foi o grande ganho que a Patrocínia Nhanombe viu no Sustenta, durante estes quatro anos em que trabalhou lá?
PN: Graças a Deus, tive algum ganho. Aprendi a trabalhar com os agricultores, aperfeiçoei o que aprendi na carteira com a prática, porque, realmente, eu não sabia. Muita coisa que aprendemos na teoria, quando chega à prática, não é igual. É mesmo um contraste. Então, na prática, aprendi muita coisa. Já sei como produzir em áreas pequenas e em grandes. Sei o que é necessário para crescer profissionalmente. E não só. Os produtores também aprenderam muito comigo, com o nosso apoio, monitorização e assistência, porque era uma assistência integrada, onde, diariamente, tínhamos de ir ao encontro do produtor e explicar-lhe o que era necessário para ele produzir com segurança.
DW África: Na sua opinião, quais são os pontos negativos do Sustenta?
PN: O problema do Sustenta é que, quando chegou, chegou com muita força para alavancar os produtores da região. Mas isso só aconteceu nos primeiros anos, quando traziam insumos para apoiar. Trouxeram tratores, adubos, sementes melhoradas. Mas, nos últimos anos, principalmente cá na província de Gaza, já era difícil. O produtor não consegue produzir por si só para vender. Só consegue produzir para comer.
Então, quando não tem nenhum apoio, o produtor sente-se abandonado. E não só. Aqui no regadio, também temos problemas. O regadio não está em condições. Portanto, o produtor, quando não tem esse apoio por parte do Governo, quando não tem insumos para poder alavancar, torna-se difícil, porque o produtor não tem dinheiro para poder adquirir sementes de qualidade nem adubos para lhe proporcionar um bom rendimento.