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Angola: Como podem juízes combater corrupção sem condições?

4 de agosto de 2021

"Péssimas" condições de trabalho dos magistrados ameaçam credibilidade do "cavalo de batalha" de João Lourenço, dizem analistas. Pela primeira vez na história do país, juízes e procuradores saíram à rua em protesto.

Angola Luanda | Proteste | Beamte
Foto: Borralho Ndomba/DW

São os elementos fundamentais no processo de investigação e julgamento dos "poderosos angolanos" acusados de delapidar Angola, mas os procuradores e juízes queixam-se de falta de condições técnicas e até de baixos salários e saíram à rua no sábado (31.07), num protesto inédito para reivindicar melhores condições de trabalho.

O presidente do Sindicato Nacional dos Magistrados do Ministério Público (SNMMP), José Buengas, afirma mesmo que "a maior parte dos tribunais e das procuradorias" de Angola funcionam com dinheiro dos próprios magistrados que "tiram do seu bolso para comprar papel e tinteiro".

"O dia em que deixar de fazer isso e ficar à espera de que uma resma de papel para o mês todo chegue para imprimir todos os documentos, os constituintes, os advogados e a população vão ficar à espera, com todas as consequências que disso pode advir", alerta o sindicalista.

Angola: Magistrados protestam contra más condições laborais

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O sindicato defende que os tribunais tenham orçamento próprio para o melhor funcionamento das instituições judiciais. "O magistrado faz o trabalho na sua casa. Vai ao tribunal quando tem audiência para realizar, porque não consegue permanecer no tribunal, porque não há condições para estar lá na maior parte das vezes", explica Buengas.

Corruptos "nos Lexus", magistrados "nos kupapatas"

Melhores condições de trabalho – é esta a exigência dos magistrados angolanos que têm a tarefa de julgar gestores públicos supostamente envolvidos em casos de corrupção.

"Os magistrados fizeram uma manifestação. Isto é muito forte e teve impacto que acho ser positivo", considera o analista político Olívio Kilumbo. "Está-se a viver o combate à corrupção, e, portanto, não se pode combater a corrupção sem ter uma justiça forte, competente e coesa".

O secretário provincial do Partido de Renovação Social (PRS) no Huambo, Solia Solende Lumumba, afirma que a manifestação dos juízes e procuradores é a prova de que o combate à corrupção em Angola é uma "farsa".

"Ao vermos que aqueles que trabalham nestes processos estão a sair à rua, dizendo que os corruptos estão a andar nos Lexus e os magistrados estão a andar nos kupapatas [mototáxis], é gravíssimo", sublinha Lumumba. "Significa que o combate à corrupção não existe. O que existe simplesmente é uma coisa que o Governo faz, no sentido de mostrar que está a combater a corrupção", diz o político do PRS.

Foto: Borralho Ndomba/DW

Soberania do sistema judicial limitada

A falta de condições de trabalho nos tribunais prova que a soberania do sistema judicial angolano está limitada, considera o coordenador da ONG Projeto Agir, Fernando Sakuayela.

O ativista afirma que a dependência financeira dos tribunais mancha o programa de combate à corrupção e deixa a justiça de Angola mais fragilizada.

"No mínimo, diríamos que está claro que somente o Presidente da República é o órgão de soberania efetivo, na medida em que não temos um orçamento independente para o sistema de justiça. E isto expõe a dependência financeira do poder judicial ao poder executivo", frisa.

O analista em Governação Local e Políticas Públicas Osvaldo João tem opinião contrária. Entende que as reivindicações não "atrapalham" as investigações de casos de corrupção no país, lembrando que "desde que começou este processo várias entidades foram julgadas".

"Há aqui uma questão que tem se ser bem explicada que é a democracia. Nós, os angolanos, devemos adquirir um método lógico, prático e igual para todos. Não podemos julgar uns de uma forma e outros de outra forma por questões de poder e alegar questões de insuficiência financeira ou falta de material", considera.

Centenas de magistrados angolanos participaram no protesto de sábado. Houve marchas em todas as províncias de Angola. Até ao momento, o grupo não prevê novas manifestações.

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