Há mais de um mês que a capital angolana regista restrições diárias no fornecimento de energia elétrica, devido ao enchimento da albufeira da barragem de Laúca. Habitantes de Luanda queixam-se de transtornos diários.
Publicidade
Quando a luz é cortada, o barulho dos geradores toma conta da capital angolana, alternativa encontrada por alguns cidadãos para manterem as lâmpadas acesas e conservar os frescos. Mas há zonas onde reina a escuridão e o silêncio total porque nem todas as familias têm capacidade financeira para comprar um aparelho. E nem sempre existe combustível nas bombas de gasolina.
"A energia está mal, bem mal. Passamos o dia sem luz", desabafa Henrique Makikate, proprietário de uma recauchutagem na zona periférica de Luanda. "Trabalhamos na rua e a a recauchutagem trabalha com luz", lembra.
E quando não há luz, não há clientes, queixa-se também Adão Sebastião Madureira, responsável por um salão de beleza na Avenida Pedro de Castro Van-Dúnem "Loy". "Há clientes que gostam de cortar o cabelo com máquina e não posso fazê-lo porque o gerador avariou-se", lamenta.
Jorge Neto, chefe de redação do Jornal Manchete, também se queixa dos cortes constantes de energia elétrica. "É uma questão extremamente preocupante na medida em que até o nosso próprio trabalho é dificultado", afirma, sublinhando que os constantes cortes de energia afetam muitas vezes o fecho do jornal.
Falhas até de noite
A luz é garantida, em regra, no período da noite, sobretudo no centro da cidade. Mas nem sempre é assim. No último sábado (08.04), por exemplo, Luanda ficou às escuras, ao início da noite.
Falta de eletricidade dificulta vida em Luanda
O corte obrigou à interrupção momentânea de dois jogos: o clássico entre o Petro de Luanda e o 1º de Agosto, a contar para a 9ª Jornada do Girabola, o campeonato angolano de futebol, que se disputava no Estádio 11 de Novembro, nos arredores de Luanda; e a partida de basquetebol entre o Inter Club e o Desportivo do Libolo, que decorria na cidadela desportiva, no centro da cidade.
O problema regista-se desde 11 de março, altura em que começou o enchimento da albufeira da barragem de Laúca, na província de Malanje, e deverá estender-se até junho, dois meses antes da realização das eleições gerais previstas para agosto.
Porém, Jorge Neto já não acredita que Laúca seja a causa do problema. "Como jornalista, tenho fontes na hidroelétrica de Laúca e sei que Laúca já não tem problemas de água, a albufeira já atingiu o seu limite", diz. Sem avançar detalhes, o chefe de redação do Jornal Manchete afirma ainda que "há outras situações que o Governo não quer explicar".
O projeto hidroelétrico de Laúca custou aos cofres do Estado angolano cerca de quatro mil milhões de euros, para produzir, até final do ano, 2.067 MegaWatts para Luanda e a zona norte do país.
Água potável em Angola, privilégio para poucos
Para quem tem água encanada em casa, a vida sem ela é inimaginável. Esta é, no entanto, a realidade para mais da metade da população angolana. Todos os dias, muitos angolanos fazem uma maratona para obter água.
Foto: DW/C. Vieira
Abastecimento, uma maratona diária
Para quem tem água encanada em casa, a vida sem ela é inimaginável. Esta é, no entanto, a realidade para mais da metade da população angolana, segundo a Universidade Católica de Angola (UCAN). Todos os dias, os angolanos fazem uma maratona que consume uma quantia considerável de tempo e dinheiro para obter água.
Foto: DW/C. Vieira
O dia começa no chafariz púlico
Nas regiões periféricas da capital de Angola, Luanda, o dia começa cedo a caminho do chafariz público. No município de Cazenga, esta é uma cena comum. Mulheres e crianças são as principais responsáveis pelo abstecimento de água das famílias angolanas. O consumo diário é geralmente limitado pela capacidade de aquisição e transporte da água.
Foto: DW/C. Vieira
Preço alto e falta d'água
Segundo um estudo do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), as fontes mais comuns para o abastecimento de água segura em Angola são: chafarizes (16%), furos protegidos (12%) e cacimbas (6%). Em Luanda, um galão de 20 litros de água custa 10 kwanzas no chafariz – o equivalente a 0,10 dólares. As famílias chegam cedo. Mas, muitas vezes, o chafariz está fechado por falha no abastecimento.
Foto: DW/C. Vieira
O sonho de ter água em casa
Aqueles que têm condições constroem tanques para armazenar a água em casa. O custo da obra supera os 1.500 dólares – uma despesa pesada com a qual poucos podem arcar. A água é entregue por um caminhão pipa privado e cada fornecimento de 20 mil litros custa 20 mil kwanzas – o equivalente a 0,20 dólares por 20 litros de água.
Foto: DW/C. Vieira
Água, um bom negócio?
Apesar de custar o dobro do preço pago no chafariz público, o tanque pode se tornar um bom negócio. Muitas pessoas vendem parte de sua água a 50 kwanzas por galão – o equivalente a 0,50 dólares por 20 litros. Uma margem de revenda de 150%. Esta mulher de Luanda compra água de sua vizinha e armazena em tonéis em casa.
Foto: DW/C. Vieira
Situação difícil também nas províncias
A falta de abastecimento de água leva a população a enfrentar muitas dificuldades para o transporte. Mulheres transportam a água até suas casas. Na foto: a cidade do Lobito, na província de Benguela. Além de ter que suportar o peso da bacia cheia, é preciso muito equilíbrio para não deixar a água pelo caminho.
Foto: DW/C. Vieira
Armazenar para garantir o abastecimento
As residências onde há encanamento são um privilégio para poucos angolanos. Ainda assim, não há garantia de que haverá sempre água. O abastecimento falha com frequência. No Lobito, muitos moradores investem em tanques para a armazenagem. Este comporta 3.000 litros de água e é a garantia para uma família de oito pessoas. O investimento foi de 560 dólares.
Foto: DW/C. Vieira
Criatividade para vencer a dificuldade
O transporte da água depende da criatividade e das possibilidades de cada um. Depois de adquirir a água, será preciso prepará-la para o consumo. Apesar da transparência, a água precisa ser tratada ou fervida para ser considerada potável - ou seja, livre de impurezas e que não oferece o risco de se contrair uma doença.
Foto: DW/C. Vieira
Água potável é saúde
A população de Luanda enfrenta muitas dificuldades para o transporte da água. Além disso, muitas crianças morrem de diarreia ou de outras doenças relacionadas com a água e o saneamento em Angola. Em 2006, um surto de cólera afectou mais de 85.000 pessoas e ceifou cerca de 3.000 vidas em 16 das 18 províncias angolanas.
Foto: DW/C. Vieira
Cobertura sanitária pouco abrangente
Segundo a Organização Mundial de Saúde, cerca de 2,6 mil milhões de pessoas no mundo não têm acesso a condições sanitárias adequadas. Na África sub-saariana, a cobertura sanitária abrange apenas 31% da população. Em Angola, apenas cerca de 25% da população têm acesso ao saneamento básico, segundo a Universidade Católica de Angola. Em Luanda, é preciso conviver com esgotos a céu aberto.
Foto: DW/C. Vieira
Saneamento básico para combater doenças
A falta de saneamento básico é um pesadelo também para os moradores do município de Cazenga, em Luanda. Não há como escoar a água das ruas e enormes poças se formam. A água parada é o paraíso para a reprodução dos mosquitos transmissores da dengue e da malária – esta última ainda é a principal causa de mortes em Angola.
Foto: DW/C. Vieira
Higiene, uma questão de saúde
A falta de saneamento básico aumenta o risco da transmissão de doenças como a diarreia, a cólera e o tifo. Em toda a África, 115 pessoas morrem a cada hora de doenças ligadas à falta de saneamento, empobrecida higiene e água contaminada. Lavar as mãos após defecar, antes de cozinhar e antes das refeições ajuda a evitar doenças e pode reduzir em até 45% a incidência da diarreia.