Falta de investimento ameaça combate ao HIV/SIDA no Zimbabué
Privilege Musvanhiri | vr
27 de julho de 2017
Estão a aumentar os casos de resistência aos tratamentos no Zimbabué. E também cresce a preocupação sobre a falta de investimento no tratamento e prevenção da SIDA, que pode fazer recuar avanços no combate à doença.
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A sociedade civil e as pessoas que vivem com a doença acreditam que este recuo pode estar relacionado com pouco investimento na pesquisa sobre o vírus e nos sistemas de monitorização no país.
Marta Tholanah, seropositiva há 14 anos, lamenta que as falhas nos sistemas de monitorização dos pacientes infetados contribuam para aumentar o número de casos resistentes aos tratamentos antirretrovirais. "Infelizmente, estamos a perder muitas pessoas. As pessoas estão a morrer e não temos uma explicação para isso", afirma. "Não temos respostas, mas não queremos especular".
Como muitos outros pacientes, Tholanah esbarra com a dificuldade de conseguir um diagnóstico apropriado. "Fiz um teste a 11 de abril, numa insitutição de saúde pública, e ainda não recebi os resultados. Acho isto inaceitável", desabafa.
As instituições públicas de saúde no Zimbabué, acessíveis à maioria dos cidadãos, não têm capacidade para realizar exames da carga viral nos pacientes seropositivos, o que não lhes permite ter o tratamento adequado, criando resistência aos medicamentos que estão a tomar de combate à doença.
Aumenta resistência aos tratamentos
Um relatório da Organização Mundial de Saúde (OMS) publicado recentemente alerta também para o aumento da resistência aos tratamentos: em seis países dos 11 avaliados, mais de 10% das pessoas que estão sob tratamento antirretroval estão infetados com uma estirpe que é resistente aos tratamentos.
Falta de investimento ameaça combate ao HIV/SIDA no Zimbabué
Investigadores afirmam que o maior aumento de casos resistentes aos tratamentos aconteceu nas zonas da África austral e oriental.
Organizações civis no Zimbabué afirmam que a revisão dos programas de tratamento pode não resultar, caso as autoridades de saúde continuem a olhar para os tratamentos contra o HIV/SIDA como caridade.
"Infelizmente, temos a sensação de que isto é caridade ou um favor, por isso demora algum tempo até que as autoridades tomem medidas para combater estes efeitos secundários", explica Taurayi Nyandoro, da Zimbabwe Aids Network.
Problemas económicos
A frágil economia do Zimbabué também não permite que os doentes seropositivos consigam ter acesso a medicação que esteja fora da que está disponível no setor público, uma vez que os encargos monetários são muito superiores ao que pode ser suportado pela maioria dos cidadãos.
Cleophas Chimbetete, especialista no estudo de epidemias, acredita que essa tem sido a principal causa do aumento da resistência aos tratamentos. "Estamos a começar a ver os primeiros resultados de um serviço de pouca qualidade", sublinha.
"Temos de preparar os pacientes de uma forma adequada para uma terapia que durará uma vida inteira. Se os pacientes não estiverem devidamente preparados, não vão tomar toda as doses, porque não se apercebem da importância de o fazer", explica o especialista.
Kasensero: local de origem da SIDA
Quando a primeira epidemia de SIDA global aconteceu na aldeia de Kasensero no Uganda, muitos acreditavam que se tratava de bruxaria. Médicos identificaram a doença como vírus. Hoje, 33% dos habitantes são seropositivos.
Foto: DW/S. Schlindwein
Uma aldeia de pescadores
Kasensero é uma aldeia pequena e pobre situada na margem do Lago Vitória no distrito de Rakai no sul do Uganda na fronteira com a Tanzânia. Em 1982, a aldeia tornou-se famosa a nível mundial. Em apenas alguns dias morreram milhares de pessoas com uma doença desconhecida. O HIV já era conhecido nos EUA, na Tanzânia e no Congo. Mas uma epidemia com esta dimensão nunca tinha acontecido.
Foto: DW/S. Schlindwein
Milhares de pessoas morrem
Kasensero 1982: Thomas Migeero era a primeira vítima. Primeiro perdeu a fome e depois os cabelos. No fim ele só era pele e osso, se lembra o seu irmão Eddie: "Alguma coisa dentro dele comeu-lhe". Durante o funeral, o seu pai não se aproximou do caixão. Todo mundo acreditava numa maldição. Hoje sabemos: morreu de SIDA.
Foto: DW/S. Schlindwein
Uma cidade morta
Quando a doença começou a matar milhares de pessoas, os habitantes começaram a abandonar a cidade. As famílias que podiam partiram e deixaram os seus campos de milho, e os bovinos e caprinos. Até hoje, Kasensero parece uma cidade abandonada e morta. Só os mais pobres ficaram.
Foto: DW/S. Schlindwein
Como o vírus chegou a Kasensero
Presumivelmente o vírus chegou através das rodovias da África Oriental a Kasensero. Condutores de veículos pesados passam a noite nos postos fronteiriços de Kasensero. Muitos procuram prostitutas como esta mulher de 30 anos de vestido rosa, que gostaria não ser reconhecida. Conta que os homens pagam quatro vezes mais para o sexo sem preservativo. Ela não se importa, pois é seropositiva.
Foto: DW/S. Schlindwein
SIDA como normalidade
Joshua Katumba é seropositivo. O pescador de 23 anos nunca visitou uma escola e não sabe ler e escrever. Não tem uma perspetiva para um futuro melhor – como a maioria dos que vivem em Kasensero. Um terço dos habitantes estão infetados com o vírus da SIDA – um dos índices de contaminação pelo HIV mais altos do mundo.
Foto: DW/S. Schlindwein
Medicamentos grátis
Yoweri Museveni, o Presidente do Uganda, foi o primeiro presidente da África, que reconheceu a SIDA como uma doença. A seguir, o Uganda desenvolveu-se como modelo da luta contra a SIDA. Pesquisadores internacionais chegaram a Rakai. Subsídios foram distribuídos. No hospital da região, os doentes com HIV passam horas em fila para buscar os seus medicamentos: são grátis.
Foto: DW/S. Schlindwein
Violência sexual
Há cinco anos, que Judith Nakato é seropositiva. Provavelmente ela foi infetada quando foi estuprada e ficou grávida. Pouco antes do parto, os médicos perceberam que ela tinha o vírus e conseguiram evitar uma transmissão ao bebé. Todos os dias, Judith tem que tomar os seus medicamentos contra a SIDA.
Foto: DW/S. Schlindwein
Anti-retrovirais escassos
Desde que Judith Nakato começou a tomar os seus medicamentos, conseguiu voltar a trabalhar. Os comprimidos, chamados anti-retrovirais ou ARV, evitam que a SIDA se desenvolve totalmente. Os medicamentos são pagos pelo Fundo Global contra a SIDA. Mas Judith Nakato tem que deslocar-se a uma outra cidade a mais de cem quilómetros para receber a sua medicação, pois os medicamentos são escassos.
Foto: DW/S. Schlindwein
Pacientes estão moribundos
Olive Hasal de 50 anos emagreceu a pele e ossos. Ela respira com muito esforço e os olhos parecem cansados. Ela mostra o comprimido que está embrulhado num pano. "Este é o último", diz ela. Hasal já viu morrer o seu marido e as suas duas crianças. Ela sabe que ela também vai morrer se ninguém for buscar os medicamentos na capital do distrito que fica a 140 quilómetros de distância.
Foto: DW/S. Schlindwein
Modelo contra a luta de SIDA?
Uganda foi considerado modelo da luta contra a SIDA: grandes somas de dinheiro foram doadas pela comunidade internacional. No início com sucesso: os casos de infeções diminuíram em cerca de dois terços a partir de 1990. Mas nos últimos dez anos, o número das infeções aumentou novamente.
Foto: DW/S. Schlindwein
Testes clínicos e pesquisas
Desde as primeiras tentativas de terapias em 1996, os habitantes foram usados para estudos de longo prazo. Kasensero é o laboratório das pesquisas globais da SIDA. O resultado da pesquisa mais recente: homens circuncidados reduzem o risco de infeção em 70 %. O Uganda aposta agora na circuncisão masculina para reduzir a propagação do HIV-SIDA.