Falta vontade política para combater HIV/SIDA em Angola
Borralho Ndomba
13 de maio de 2019
Segundo a Rede Angolana das Organizações de Serviços de SIDA (ANASO), o país não tem fundos suficientes para lutar contra a doença. A falta de dinheiro compromete a campanha de prevenção.
Publicidade
A Rede Angolana das Organizações de Serviços de Sida (ANASO) revela que a falta de vontade política está a contribuir para a redução do compromisso de Estado em relação à luta contra a SIDA em Angola. O número de pessoas a viver com a doença continua a crescer no país.
Em declarações à DW África, António Coelho, secretário-executivo da ANASO, afirmA que o programa de combate ao HIV no país continua a depender de doadores internacionais, que estão a reduzir os apoios devido à classificação de "país de renda média" que Angola obteve, de acordo com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).
Angola não tem fundos para lutar contra a doença e a falta de dinheiro compromete a campanha de prevenção, diz António Coelho. "O país tem estado a definir outras prioridades, as pessoas têm estado a definir outras preocupações, há o problema da fome, há grande carência fundamentalmente devido à crise social e financeira que o país tem estado a enfrentar. Por isso, entendemos que nessa altura as pessoas não estão muito preocupadas com a doença e com a saúde. Definiram outras prioridades, sentimos também que continua a faltar vontade política", conclui.
Falta vontade política para combater HIV/SIDA em Angola
Em Angola, regista-se ainda pouca informação de como o cidadão deve lidar com a doença ou com o doente. O estigma é uma realidade no país que aprovou recentemente uma lei que criminaliza a descriminação.
O secretário-executivo diz que a maior parte dos angolanos não conhece a referida norma. Por outro lado, a imprensa já não aborda o assunto como anteriormente. "Sentimos que a comunicação social está a desistir um pouco do processo da luta contra a SIDA no país. Anteriormente tínhamos programas sobre sida na rádio, na televisão, tínhamos espaços sobre a sida nos diferentes jornais, quer semanários como diários. Hoje, infelizmente, esses espaços desapareceram", lamenta o ativista angolano.
500 mil pessoas com SIDA
Atualmente, existem em Angola perto de meio milhão de pessoas com HIV/SIDA. Desse número, 65% são mulheres. Quanto à idade, 60% dos jovens de 15 a 24 anos são portadores da doença.
Ainda assim, assiste-se uma redução das ações de prevenção. De acordo com António Coelho Angola depara-se com graves problemas na distribuição dos antirretrovirais. "Assistimos a rupturas, a disponibilidade também está comprometida. A cobertura do tratamento é baixa, representa 25%, por razões relacionadas com a crise, e a taxa de abandono é bastante elevada. Andamos na ordem dos 55%", revela.
Apesar das dificuldades, a Rede Angolana das Organizações de Serviços de SIDA continua a promover diferentes campanhas de sensibilização.
Outra preocupação da associação é a contaminação dolosa: a ANASO regista 14 queixas por dias. "É uma situação que nos está a preocupar. O país tem estado a tentar fazer esforços no sentido de promover ações de prevenção, e neste caso, entendemos que a contaminação dolosa tem estado a comprometer todos os esforços de prevenção", frisa o secretário.
Kasensero: local de origem da SIDA
Quando a primeira epidemia de SIDA global aconteceu na aldeia de Kasensero no Uganda, muitos acreditavam que se tratava de bruxaria. Médicos identificaram a doença como vírus. Hoje, 33% dos habitantes são seropositivos.
Foto: DW/S. Schlindwein
Uma aldeia de pescadores
Kasensero é uma aldeia pequena e pobre situada na margem do Lago Vitória no distrito de Rakai no sul do Uganda na fronteira com a Tanzânia. Em 1982, a aldeia tornou-se famosa a nível mundial. Em apenas alguns dias morreram milhares de pessoas com uma doença desconhecida. O HIV já era conhecido nos EUA, na Tanzânia e no Congo. Mas uma epidemia com esta dimensão nunca tinha acontecido.
Foto: DW/S. Schlindwein
Milhares de pessoas morrem
Kasensero 1982: Thomas Migeero era a primeira vítima. Primeiro perdeu a fome e depois os cabelos. No fim ele só era pele e osso, se lembra o seu irmão Eddie: "Alguma coisa dentro dele comeu-lhe". Durante o funeral, o seu pai não se aproximou do caixão. Todo mundo acreditava numa maldição. Hoje sabemos: morreu de SIDA.
Foto: DW/S. Schlindwein
Uma cidade morta
Quando a doença começou a matar milhares de pessoas, os habitantes começaram a abandonar a cidade. As famílias que podiam partiram e deixaram os seus campos de milho, e os bovinos e caprinos. Até hoje, Kasensero parece uma cidade abandonada e morta. Só os mais pobres ficaram.
Foto: DW/S. Schlindwein
Como o vírus chegou a Kasensero
Presumivelmente o vírus chegou através das rodovias da África Oriental a Kasensero. Condutores de veículos pesados passam a noite nos postos fronteiriços de Kasensero. Muitos procuram prostitutas como esta mulher de 30 anos de vestido rosa, que gostaria não ser reconhecida. Conta que os homens pagam quatro vezes mais para o sexo sem preservativo. Ela não se importa, pois é seropositiva.
Foto: DW/S. Schlindwein
SIDA como normalidade
Joshua Katumba é seropositivo. O pescador de 23 anos nunca visitou uma escola e não sabe ler e escrever. Não tem uma perspetiva para um futuro melhor – como a maioria dos que vivem em Kasensero. Um terço dos habitantes estão infetados com o vírus da SIDA – um dos índices de contaminação pelo HIV mais altos do mundo.
Foto: DW/S. Schlindwein
Medicamentos grátis
Yoweri Museveni, o Presidente do Uganda, foi o primeiro presidente da África, que reconheceu a SIDA como uma doença. A seguir, o Uganda desenvolveu-se como modelo da luta contra a SIDA. Pesquisadores internacionais chegaram a Rakai. Subsídios foram distribuídos. No hospital da região, os doentes com HIV passam horas em fila para buscar os seus medicamentos: são grátis.
Foto: DW/S. Schlindwein
Violência sexual
Há cinco anos, que Judith Nakato é seropositiva. Provavelmente ela foi infetada quando foi estuprada e ficou grávida. Pouco antes do parto, os médicos perceberam que ela tinha o vírus e conseguiram evitar uma transmissão ao bebé. Todos os dias, Judith tem que tomar os seus medicamentos contra a SIDA.
Foto: DW/S. Schlindwein
Anti-retrovirais escassos
Desde que Judith Nakato começou a tomar os seus medicamentos, conseguiu voltar a trabalhar. Os comprimidos, chamados anti-retrovirais ou ARV, evitam que a SIDA se desenvolve totalmente. Os medicamentos são pagos pelo Fundo Global contra a SIDA. Mas Judith Nakato tem que deslocar-se a uma outra cidade a mais de cem quilómetros para receber a sua medicação, pois os medicamentos são escassos.
Foto: DW/S. Schlindwein
Pacientes estão moribundos
Olive Hasal de 50 anos emagreceu a pele e ossos. Ela respira com muito esforço e os olhos parecem cansados. Ela mostra o comprimido que está embrulhado num pano. "Este é o último", diz ela. Hasal já viu morrer o seu marido e as suas duas crianças. Ela sabe que ela também vai morrer se ninguém for buscar os medicamentos na capital do distrito que fica a 140 quilómetros de distância.
Foto: DW/S. Schlindwein
Modelo contra a luta de SIDA?
Uganda foi considerado modelo da luta contra a SIDA: grandes somas de dinheiro foram doadas pela comunidade internacional. No início com sucesso: os casos de infeções diminuíram em cerca de dois terços a partir de 1990. Mas nos últimos dez anos, o número das infeções aumentou novamente.
Foto: DW/S. Schlindwein
Testes clínicos e pesquisas
Desde as primeiras tentativas de terapias em 1996, os habitantes foram usados para estudos de longo prazo. Kasensero é o laboratório das pesquisas globais da SIDA. O resultado da pesquisa mais recente: homens circuncidados reduzem o risco de infeção em 70 %. O Uganda aposta agora na circuncisão masculina para reduzir a propagação do HIV-SIDA.