País precisa de angariar 80% do financiamento para eliminar minas terrestres até 2025. Governo angolano faz desminagem apenas em áreas com interesse económico, lamenta instituto britânico.
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Angola precisa de 253 milhões de euros para eliminar as minas terrestres no país, mas tem disponível menos de um quinto desse valor. O alerta foi lançado pelo diretor do Mines Advisory Group, Chris Loughran, que defendeu que a comunidade internacional, em especial o Reino Unido, deve rever as suas prioridades.
Segundo o ativista, Angola tem prometido apenas 19% do valor necessário para a desminagem, frisando que são necessários 34,37 milhões de dólares (31,59 milhões de euros) por ano para atingir o objetivo até 2025.
Loughran falava esta quarta-feira (26.04) num evento no edifício do parlamento britânico, organizado pelo grupo parlamentar de amizade a Angola, intitulado "Ação sobre as Minas em Angola: O Papel da Comunidade Internacional".
"Interesse económico"
Atualmente, a Mines Advisory Group é uma das três organizações não-governamentais estrangeiras que mantêm atividades para a desminagem em Angola. Há também brigadas dirigidas pelas autoridades angolanas, que se têm centrado em limpar áreas estratégicas com maior interesse económico.
Porém, os angolanos "mais rurais, mais desfavorecidos, não tiveram a atenção das autoridades", lamentou o diretor do programa África do Instituto Real de Relações Internacionais, Alex Vines, urgindo o Reino Unido a investir na "desminagem humanitária".
Desde 2010 que o governo britânico deixou de dar apoio humanitário a Angola para priorizar países com menos rendimentos, mas recentemente prometeu 100 milhões de libras (118 milhões de euros) para aplicar na limpeza de minas terrestres nos próximos três anos, estando por decidir quais os países onde vai intervir.
Desminagem
A embaixadora dos Estados Unidos da América (EUA) em Angola, Helen Meagher La Lime, reiterou a necessidade da "desminagem humanitária", que liberta terrenos não só para o uso civil, mas que deixam de ser ameaça direta para a população.
Dos 982 quilómetros quadrados considerados suspeitos de estarem minados, 56% do total, cerca de 549 quilómetros quadrados, foram limpos. O resultado em partes deste território, descreveu, foi o cultivo de campos e a construção de escolas e habitações.
Entretanto, lamentoua embaixadora, atualmente 88 mil vítimas de minas terrestres ainda vivem no país e nos últimos 12 meses morreram 21 pessoas.
A diplomata lembrou que os EUA são atualmente os principais doadores internacionais para a desminagem, seguidos pelo Japão e Suíça e a União Europeia, mas que os donativos caíram 86% na última década.
O embaixador de Angola no Reino Unido, Miguel Gaspar Fernandes Neto, adiantou que tem recebido apoio de outros países como a Rússia e África do Sul. "O processo de diversificação e investimento estrangeiro na economia angolana torna-se difícil quando as pessoas têm conhecimento do problema das minas", reconheceu.
Recursos
Angola é um dos 11 países que ainda têm mais de 100 quilómetros quadrados de áreas com minas terrestres, segundo um relatório da International Campaign to Ban Landmines (ICBL) de 2015.
O país africano lusófono tinha, segundo dados do ano passado, 1.858 áreas livres de minas e 1.435 por limpar, contando apenas com apoio financeiro dos EUA, Japão, Suíça e União Europeia.
A necessidade de 275 milhões de dólares já tinha sido identificada no ano passado, durante o encontro da Comissão Nacional Intersetorial de Desminagem e Assistência Humanitária (CNIDAH) e dos principais doadores da ação contra as minas em Angola, quando pediu também 228 mil dólares (206 mil euros) para atualização das informações sobre as minas no país.
Pobreza no meio da riqueza no sul de Angola
Apesar da riqueza em petróleo, em Angola vive muita gente na pobreza, sobretudo no sul do país. A região é assolada por uma seca desde 2011 e as colheitas voltaram a ser pobres neste ano. Muitos angolanos passam fome.
Foto: Jörg Böthling/Brot für die Welt
Sobras da guerra civil
A guerra civil (1976 -2002) grassou com particular violência no sul de Angola. Aqui, o Bloco do Leste socialista e o Ocidente da economia de mercado livre conduziram uma das suas guerras por procuração mais sangrentas em África. Ainda hoje se vêm com frequência destroços de tanques. A batalha de Cuito Cuanavale (novembro de 1987 a março de 1988) é considerada uma das maiores do continente.
Foto: Jörg Böthling/Brot für die Welt
Feridas abertas
O movimento de libertação UNITA tinha o seu baluarte no sul do país, e contava com a assistência do exército da República da África do Sul através do Sudoeste Africano, que é hoje a Namíbia. Muitas aldeias da região foram destruídas. Mais de dez anos após o fim da guerra civil ainda há populares que habitam as ruínas na cidade de Quibala, no sul de Angola.
Foto: Jörg Böthling/Brot für die Welt
Subnutrição apesar do crescimento económico
Apesar da riqueza em petróleo, em Angola vive muita gente na pobreza, sobretudo no sul. A região sofre de seca desde 2011 e as colheitas voltaram a ser más no ano 2013. Muitos angolanos não têm o suficiente para comer. A Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO) diz que nos últimos anos pelo menos um quarto da população passou fome durante algum tempo ou permanentemente.
Foto: Jörg Böthling/Brot für die Welt
O sustento em risco
Dado o longo período de seca, a subnutrição é particularmente acentuada nas províncias do sul de Angola, diz a FAO. As colheitas falham e a sobrevivência do gado está em risco. Uma média de trinta cabeças perece por dia, calcula António Didalelwa, governador da província de Cunene, a mais fortemente afetada. O Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) também acha que a situação é crítica.
Foto: DW/A. Vieira
Semear esperança
A organização de assistência da Igreja Evangélica Alemã “Pão para o Mundo” lançou um apelo para donativos para Angola na sua ação de Advento 2013. Uma parte dos donativos deve ser reencaminhada para a organização parceira local Associação Cristã da Mocidade Regional do Kwanza Sul (ACM-KS). O objetivo é apoiar a agricultura em Pambangala na província de Kwanza Sul.
Foto: Jörg Böthling/Brot für die Welt
Rotação de culturas para assegurar mais receitas
Ernesto Cassinda (à esquerda na foto), da organização cristã de assistência ACM-KS, informa um agricultor num campo da comunidade de Pambangala, no sul de Angola sobre novos métodos de cultivo. A ACM-KS aposta sobretudo na rotação de culturas: para além das plantas alimentícias tradicionais como a mandioca e o milho deverão ser cultivados legumes para aumentar a produção e garantir mais receitas.
Foto: Jörg Böthling/Brot für die Welt
Receitas adicionais
Para além de uma melhora nas técnicas de cultivo, os agricultores da região também são encorajados a explorar novas fontes de rendimentos. A pequena agricultora Delfina Bento vendeu o excedente da sua colheita e investiu os lucros numa pequena padaria. O pão cozido no forno a lenha é vendido no mercado.
Foto: Jörg Böthling/Brot für die Welt
Escolas sem bancos
Formação de adultos na comunidade de Pambangala: geralmente os alunos têm que trazer as cadeiras de plástico de casa. Não é só em Kwanza Sul que as escolas carecem de equipamento. Enquanto isso, a elite de Angola vive no luxo. A revista norte-americana “Forbes” calcula o património da filha do Presidente, Isabel dos Santos, em mais de mil milhões de dólares. Ela é a mulher mais rica de África.
Foto: Jörg Böthling/Brot für die Welt
Investimentos em estádios de luxo
Enquanto em muitas escolas e centros de saúde falta equipamento básico, o Governo investiu mais de dez milhões de euros no estádio "Welvitschia Mirabilis", para o Campeonato Mundial de Hóquei em Patins 2013, na cidade de Namibe, no sul de Angola. Numa altura em que, segundo a organização católica de assistência “Caritas Angola” dois milhões de pessoas passaram fome no sul do país.
Foto: DW/A. Vieira
Novas estradas para o sul
Apesar dos destroços de tanques ainda visíveis, algo melhorou desde o fim da guerra civil em 2002: as estradas. O que dá a muitos agricultores a oportunidade de venderem os seus produtos noutras regiões. Durante a era colonial portuguesa, o sul de Angola era tido pelo “celeiro” do país e um dos maiores produtores de café de África.
Foto: Jörg Böthling/Brot für die Welt
Um futuro sem sombras da guerra civil
Em Angola, a papa de farinha de milho e mandioca, rica em fécula, chama-se “funje” e é a base da alimentação. As crianças preparam o funje peneirando o milho. Com a ação de donativos de 2013 para a ACM-KS, a “Pão para o Mundo” pretende assegurar que, de futuro, os angolanos no sul tenham sempre o suficiente para comer e não tenham que continuar a viver ensombrados pela guerra civil do passado.