Filho do Presidente congolês acusado de desvio milionário
Clarissa Herrmann | rl
7 de agosto de 2019
ONG diz que Denis Sassou-Nguesso, filho mais novo do Presidente do Congo Brazzaville, terá conseguido lavar dinheiro através de sistema complexo de empresas nos EUA, Ilhas Virgens Britânicas e vários países europeus.
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A organização não-governamental Global Witness acusa Sassou-Nguesso, também conhecido como "Kiki", de ter desviado mais de 50 milhões de dólares dos fundos públicos, entre 2013 e 2014. Documentos a que a ONG teve acesso mostram o rasto do dinheiro desde que saiu do tesouro congolês até às contas de uma empresa com sede no Chipre e que estava em nome do empresário português José Veiga, que volta a ser apontado como o testa de ferro do filho do Presidente.
"Tivemos acesso a um contrato assinado entre José Veiga e Denis Christel, carimbado por um notário de Brazzaville, a capital do Congo. Neste contrato, José Veiga transferia todas as ações e a propriedade das empresas [do Chipre] para Denis Crystel. Ou seja, basicamente, José Veiga era um proprietário de fachada", explica Mariana Abreu, responsável pela investigação da ONG.
Filho do Presidente congolês acusado de desvio milionário
Segundo a investigadora, Denis Crystel era, assim, o verdadeiro dono da Gabox, uma empresa com sede no Chipre, registada em nome de José Veiga, e que foi utilizada para receber a transferência dos 50 milhões de dólares pagos à empresa brasileira Asperbas, que havia sido contratada pelo governo congolês para prestar serviços no país.
"De acordo com a legislação europeia, as transferências de ativos realizadas no estrangeiro não têm de ser divulgadas. Não existe qualquer obrigação de notificar efetivamente o país de constituição, neste caso o Chipre", afirma a Mariana Abreu.
Um padrão já conhecido
Esta já não é a primeira vez que Denis Christel e José Veiga surgem associados a escândalos de corrupção. Em abril deste ano, a mesma ONG britânica havia revelado que Claudia Sassou-Nguesso, irmã de Denis Christel e membro do Parlamento congolês, também havia desviado 20 milhões de dólares do Estado, através de um esquema muito semelhante ao que agora foi revelado.
Com parte deste dinheiro, Claudia Sassou-Nguesso terá adquirido um apartamento de luxo na Trump International Tower em Nova Iorque. Também neste negócio, José Veiga aparecia como proprietário do imóvel.
O clã Sassou-Nguesso tem sido alvo de investigações constantes nas últimas décadas, nomeadamente em França, devido às suas excentricidades. No entanto, o presidente da organização não-governamental "Fórum para Sistemas de Liderança e Direitos Humanos", Maixent Animba, explica que os escândalos de corrupção em que a família presidencial está envolvida não são muito falados no país.
Até porque no Congo a corrupção é "um fenómeno geral", diz. "É um eufemismo dizer que a corrupção é hoje um fenómeno generalizado e que está presente em todos os setores da vida nacional, desde a justiça à educação e às finanças. Encontramos, a todos os níveis, o fenómeno da corrupção."
A DW tentou contactar o filho do Presidente congolês e o porta-voz do Governo, mas sem sucesso.
Presidentes africanos para sempre
Vários presidentes africanos governam há tanto tempo, que muitos cidadãos não conhecem outro líder do seu país. Teodoro Obiang Nguema é o líder africano há mais tempo no poder: governa a Guiné Equatorial desde 1979.
Foto: picture-alliance/AP Photo/S. Alamba
Guiné Equatorial: Teodoro Obiang Nguema
Teodoro Obiang Nguema Mbasogo é atualmente o líder africano há mais tempo no poder, depois de, em 2017, José Eduardo dos Santos ter deixado o cargo de Presidente de Angola, que ocupava também desde 1979. Neste ano, Obiang chegou ao poder através de um golpe de estado contra o seu tio, Francisco Macías. Nas últimas eleições no país, em 2016, Obiang afirmou que não voltaria a concorrer em 2020.
Foto: picture-alliance/dpa/S. Lecocq
Camarões: Paul Biya
Com o seu nascimento no ano de 1933, Paul Biya é o Presidente mais idoso do continente africano e apenas ultrapassado em anos no poder pelo líder da vizinha Guiné Equatorial. Biya chegou ao poder em 1982. Em 2008, uma revisão à Constituição retirou os limites aos mandatos. Em 2018, Biya, foi declarado vencedor das eleições. Os Camarões atravessam uma crise com a rebelião na parte anglófona.
Foto: picture-alliance/AA/J.-P. Kepseu
Uganda: Yoweri Museveni
Com mais de 30 anos no poder, Yoweri Museveni é, para uma grande parte dos ugandeses, o único Presidente que conhecem. 75% dos atuais 35 milhões de habitantes nasceram depois de Museveni ter subido ao poder em 1986. Em 2017, foi aprovada a lei que retira o limite de idade (75 anos) para concorrer à Presidência. Assim sendo, Museveni já pode concorrer ao sexto mandado, nas eleições de 2021.
Foto: picture alliance/AP Photo/B. Chol
República do Congo: Denis Sassou Nguesso
Foi também uma alteração à Constituição que permitiu que Denis Sassou Nguesso voltasse a candidatar-se e a vencer as eleições em 2016 na República do Congo (Brazzaville). Já são mais de 30 anos à frente do país, com uma pequena interrupção entre 1992 e 1997. Denis Sassou Nguesso nasceu no ano de 1943.
Foto: picture-alliance/AA/A. Landoulsi
Ruanda: Paul Kagame
Paul Kagame lidera o Ruanda desde 2000. Antes, já teve outros cargos influentes e foi líder da Frente Patrifótica Ruandesa (FPR), a força que venceu a guerra civil no Ruanda. Em 2017, Kagame ganhou as eleições com 98,8% dos votos. Assim poderá continuar no poder até, pelo menos, 2034. Assim ditou a consulta popular realizada em 2015 que acabou com o limite de dois mandatos presidenciais.
Foto: Imago/Zumapress/M. Brochstein
Burundi: Pierre Nkurunziza
Em 2005, Pierre Nkurunziza chegou ao poder no Burundi. Em 2015, o terceiro mandato de Nkurunziza gerou uma onda de protestos entre a população que, de acordo com o Tribunal Penal Internacional, terá causado cerca de 1.200 mortos e 400.000 refugiados. Em maio de 2018, teve lugar um referendo para alterar a Constituição, que permitiu ao Presidente continuar no cargo até 2034.
Foto: Reuters/E. Ngendakumana
Gabão: Ali Bongo Ondimba
Ali Bongo ainda está longe de quebrar o recorde do pai, que esteve 41 anos no poder, mas já vai no terceiro mandato, ganho em 2017, no meio de muita contestação. Em 2018, a Constituição do Gabão foi revista para acabar com o limite de mandatos. A nova versão da Constituição também aumentou os poderes do Presidente para tomar decisões unilateralmente.
Foto: Reuters/Reuters TV
Togo: Faure Gnassingbé
Em 2005, Faure Gnassingbé substituiu o pai, que liderou o país durante 38 anos. Ao contrário de outros países, o Togo não impunha um limite aos mandatos. Em 2017, após protestos da população contra a "dinastia" Gnassingbé, foi aprovada a lei que impõe um limite de mandatos. No entanto, a lei não tem efeitos retroativos, pelo que o ainda Presidente poderá disputar as próximas eleições, em 2020.
Foto: DW/N. Tadegnon
Argélia: Abdelaziz Bouteflika
Abdelaziz Bouteflika esteve 20 anos no poder na Argélia (1999-2019). Em 2013, sofreu um acidente vascular cerebral (AVC), mas nem a idade, nem o estado de saúde travaram o Presidente de anunciar que iria procurar um quinto mandato em 2019. Em abril de 2019, face a protestos públicos, anunciou a sua renúncia ao cargo. Nesta altura, já teve 82 anos de idade.