Presidente de Moçambique fez as declarações esta quarta-feira (19.10), durante cerimónia de homenagem ao primeiro chefe de Estado moçambicano, falecido há 30 anos. A viúva Graça Machel pediu o "calar das armas" no país.
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A Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO) está a ameaçar a paz por que lutou Samora Machel. Esta foi a declaração do Presidente moçambicano Filipe Nyusi, em Maputo, durante a cerimónia em memória do primeiro chefe de Estado do país, falecido a 19 de outubro de 1986 num acidente aéreo na África do Sul.
Nyusi fez um apelo ao principal partido da oposição moçambicana, pedindo que o partido siga o exemplo de Machel e lute pela paz. "Queremos aproveitar esta ocasião para apelar à RENAMO para que, tal como no passado, mostremos que não há barreiras intransponíveis quando colocamos os interesses do povo moçambicano acima de tudo. Essa foi a lição de Samora", disse Filipe Nyusi, na praça dos Heróis, onde está sepultado o primeiro Presidente de Moçambique.
"A paz por que tanto lutou Machel está ameaçada pelas ações da RENAMO", disse Nyusi, acrescentando que "uma paz total e definitiva" será uma vitória sem dono, "porque pertencerá a todos por igual".
"Justiça ainda deve ser feita"
Aos familiares das vítimas da tragédia de Mbuzini, localidade na África do Sul onde se despenhou o avião presidencial, matando Machel e outras 34 pessoas da sua comitiva, Nyusi disse partilhar uma dor que se agudiza por a verdade nunca ter sido esclarecida.
"A justiça ainda deve ser feita, um direito que vos assiste como parentes dos mártires de Mbuzini e que assiste igualmente a todo o povo moçambicano", declarou, numa alusão às investigações inconclusivas da queda da aeronave Tupolev 134 em que viajava Machel e que as autoridades moçambicanas atribuem ao antigo regime do "apartheid".
O Preseidente da República lembrou ainda o empenho do primeiro de Samora Machel nas lutas dos países vizinhos contra "a dominação estrangeira e regimes ditatoriais", quando Moçambique enfrentava uma situação económica difícil e dava os primeiros passos para se afastar da herança colonial, referindo-se ao "apartheid" e à "desumanidade de um racismo convertido em política de Estado" e ao regime "ilegal e minoritário" da Rodésia de Ian Smith, atual Zimbabué.
Paz em Moçambique
A viúva de Samora Machel, Graça Machel, também participou na cerimónia em Maputo e afirmou que o fim do conflitos militares no país seria uma forma de honrar a memória do primeiro Presidente de Moçambique.
Graça Machel também apontou a luta contra o tribalismo e o nepotismo e a entrega ao trabalho e à educação como formas de honrar a memória de Samora Machel.
"Em solidariedade com todas as viúvas e mães deste país queremos dizer: calem as amas de uma vez por todas, acabe o conflito neste país", disse Graça Machel.
As mães e viúvas das vítimas da tragédia de Mbuzini, prosseguiu Graça Machel, sentiram a dor da perda dos seus familiares e não desejam esse sentimento a outros moçambicanos, que estão sob ameaça da violência militar no centro e norte do país.
"Nós sabemos e vivemos com essa dor e não queremos mais ninguém, dia após dia, a viver aquilo que nós vivemos. Os nossos netos não sabem o que é o colo dos seus avós. Isto tem de acabar, esta família moçambicana tem de saber abraçar-se", afirmou.
Ideais de Samora Machel
Em memória do primeiro chefe de Estado de Moçambique, o ex-presidente moçambicano Armando Guebuza disse à imprensa que os moçambicanos devem inspirar-se nos ideais do primeiro de Samora Machel para ultrapassar a difícil conjuntura que o país atravessa.
"Os ideais dele [Samora Machel] devem permanecer como instrumento para fazer face aos desafios que temos", considerou Guebuza, chefe de Estado durante dez anos até janeiro de 2015.
Segundo Armando Guebuza, os fundamentos que orientaram o primeiro Presidente de Moçambique permanecem úteis para o país. "As ideias são como uma linha que nos ajuda a encontrar o itinerário que temos de percorrer".
20 Anos de Paz em Moçambique: Uma viagem
A 4 de outubro de 1992, FRELIMO e RENAMO assinaram o Acordo Geral de Paz, pondo fim a 16 anos de guerra civil em Moçambique. Apesar da paz, a guerra civil continua a marcar a vida de muitos moçambicanos.
Foto: Marta Barroso
A guerra presente todos os dias
A 4 de outubro de 1992, FRELIMO e RENAMO assinaram o Acordo Geral de Paz, pondo fim a 16 anos de guerra civil em Moçambique. Apesar da paz, a guerra civil continua a marcar a vida de muitos moçambicanos. Joula estava grávida de oito meses quando uma mina anti-pessoal lhe arrancou um pé em 1991. Na noite anterior, a RENAMO tinha atacado a aldeia e plantado minas em redor.
Foto: Marta Barroso
De armas a enxadas... ou cadeiras
Desde 1996, o projeto "Armas em Enxadas" dá um novo destino ao material bélico que destruiu milhares de vidas durante a guerra civil. O objetivo da iniciativa, lançada pelo Conselho Cristão de Moçambique, é criar, com as armas, obras de arte com mensagens de paz. Muitas peças foram encontradas pelo país, outras foram recolhidas a privados.
Foto: Marta Barroso
Ataques inesperados
São as mesmas armas que há 20 anos eram usadas para atacar seres humanos como estes refugiados em Chamanculo, perto da capital, Maputo, em 1992. Chamanculo nunca recuperou da chegada de milhares de refugiados da guerra civil. Ainda hoje, é um bairro pobre. Foi aqui que nasceram figuras ilustres do país como Maria de Lurdes Mutola.
Foto: DW/Cristina Krippahl
Ruas desertas em Maputo
A guerra, que se arrastou por 16 anos, atrasou o desenvolvimento do país. Também a vida social sofreu, até mesmo na capital. Engarrafamentos eram, durante a guerra e nos primeiros anos seguintes, algo raro como se pode ver nesta fotografia do centro de Maputo de 1992.
Foto: DW/Cristina Krippahl
Filhos da guerra
Em 1990, Moçambique era considerado o país mais pobre do mundo. Em 2011, ocupava o lugar 184 entre 187 Estados no Índice de Desenvolvimento Humano do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, PNUD. 20 anos depois de assinada a paz, os moçambicanos continuam a viver, em média, 50 anos.
Foto: DW/Cristina Krippahl
Filhos da paz
20 anos depois do Acordo Geral de Paz, ainda há muito que fazer no combate à pobreza em Moçambique. As províncias do Niassa, de Maputo, Cabo Delgado e Tete (na imagem) são, segundo o Programa da ONU para o Desenvolvimento, PNUD, as que têm maior incidência de pobreza no país.
Foto: Marta Barroso
Casa de Espera
Iniciativas como esta na aldeia de Vinho, no Parque Nacional da Gorongosa, província de Sofala, contribuem para diminuir a mortalidade infantil e materna. Atualmente, em Moçambique cerca de 500 mães morrem por cada 100 mil crianças nascidas vivas. Para evitar que isso aconteça na aldeia de Vinho, a Casa de Espera assiste as mulheres grávidas das redondezas na preparação dos partos.
Foto: Marta Barroso
Economia dominada por megaprojetos
A paz possibilitou megaprojetos, como o da exploração de carvão em Moatize, Tete. De futuro, a esperança é de que os rendimentos destes projetos beneficiem mais a população. Devido aos incentivos fiscais de que gozam as multinacionais ligadas a eles, o Estado moçambicano deixa de ganhar mais de 200 milhões de dólares por ano, segundo o Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE).
Foto: Marta Barroso
Carvão, a euforia de Tete
74 toneladas de carvão já estão carregadas nesta transportadora que pode levar até 400 toneladas. O carvão da província central de Tete tem vindo a atrair investidores nacionais e internacionais à procura do "El Dorado" que tem limitado a diversificação da economia nacional na segunda década de paz em Moçambique.
Foto: Marta Barroso
Cahora Bassa...
Durante a guerra civil, as linhas de transmissão de Cahora Bassa foram alvo de ataques da RENAMO. Hoje, a barragem funciona em pleno. Cahora Bassa tem uma capacidade instalada de 2.075 megawatts, a maior parte da energia é exportada para os países da região: 70% para a África do Sul e 5% para o Zimbabué. Apenas um quarto da eletricidade aqui produzida é consumida em Moçambique.
Foto: DW/M. Barroso
... um elefante branco para esta área do país?
Ainda há poucas casas em redor de Cahora Bassa com acesso regular à eletricidade. Para o economista moçambicano Carlos Castel-Branco do IESE, dever-se-iam estender as bases do desenvolvimento do país às aldeias e vilas em torno da barragem para que também aqui a vida económica se transformasse num elemento de estímulo para o investimento.
Foto: Marta Barroso
Gentes ligadas
A reabilitação das infraestruturas permite agora uma maior mobilidade e fomenta o comércio interno. A linha férrea de Sena liga a província de Tete, no interior de Moçambique, à cidade portuária da Beira. No tempo da guerra civil, foi encerrada e acabou por ser completamente destruída. Nos últimos anos, o corredor ferroviário foi reabilitado para escoar sobretudo o carvão da região de Tete.
Foto: Marta Barroso
Gentes apertadas
O comboio é um dos meios de transporte mais baratos em Moçambique. Em fevereiro de 2012, a Linha de Sena abriu a passageiros em toda a sua extensão. A reconstrução foi feita por troços e acabou por tomar muito mais tempo que o previsto, porque o consórcio indiano responsável pelas obras não cumpriu diversos prazos. Grande parte do dinheiro veio do Banco Mundial.
Foto: Marta Barroso
Há esperança em Moçambique
Idalina Melesse viajou de comboio pela primeira vez em 2012. Durante a guerra civil, os ataques impediram-na de se mover dentro do país. Desde então e até à reabertura da Linha de Sena, não tinha tido dinheiro para longas viagens. A Linha de Sena e outras infraestruturas não só unem moçambicanos, mas devolvem-lhes a liberdade de movimento e a facilidade de comunicação confiscadas pela guerra.