FMI disposto a retomar apoio financeiro a Moçambique
Leonel Matias (Maputo)
13 de novembro de 2019
Em Maputo, Fundo voltou a mostrar abertura para negociar possível programa de apoio financeiro ao país. Para 2020, espera forte recuperação e baixa inflação, além de empenho pelo desenvolvimento e redução da pobreza.
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O anúncio foi feito no final de uma visita de seis dias da missão do Fundo Monetário Internacional (FMI) a Moçambique, esta quarta-feira (13.11). Mais de três anos depois de ter suspendido a ajuda financeira ao país com a descoberta das dívidas ocultas, o FMI mostra-se disponível para dialogar sobre um eventual programa de assistência financeira ao país.
"Se o Governo tiver interesse em conversar sobre um possível programa de apoio financeiro do FMI, nós estamos abertos a esse pedido e a ter essas conversas. Obviamente, o programa não se prepara da noite para o dia, é necessário um trabalho preparatório", dizo chefe da missão do FMI, Ricardo Velloso, lembrando que o novo Governo moçambicano só entra em funções em janeiro.
Em outubro, Abebe Aemro Selassie, diretor do departamento de África do FMI, já havia sinalizado a possibilidade ao admitir disponibilidade para considerar um novo acordo de ajuda a Moçambique.
Para já, segundo Ricardo Velloso, Moçambique é um dos maiores beneficiários da assistência técnica do FMI.
"Nós estamos dispostos a trabalhar com Mocambique da maneira mais próxima possível, da maneira mais conveniente possível para o Governo," sublinha.
"Isso pode ser em forma de consulta de consultas anuais e um programa de assistência técnica bastante robusto," descreve o chefe da missão.
Dívidas ocultas e corrupção
O programa de apoio financeiro do FMI a Moçambique encontra-se suspenso, na sequência da descoberta das dívidas contraídas por três empresas com garantias do Estado sem o conhecimento do Parlamento e dos parceiros internacionais - as chamadas dívidas ocultas.
Recentemente, Moçambique alcançou um acordo com os credores da dívida contraída por uma dessas empresas, a EMATUM, que permite reduzir os pagamentos dos juros dos ‘eurobonds' e prolongar a sua maturidade.
De acordo com Ricardo Velloso, "a reestruturação, que no final foi acordada e implementada, é consistente com as análises de sustentabilidade da dívida".
"A expetativa é de que esse 'rating' vai melhorar ao longo do tempo, dado que Moçambique está empenhado em manter a prudência fiscal e em ter uma administração dessa dívida pública baseada em doações e em créditos concessionais", acrescenta.
A missão do FMI saudou os esforços da Procuradoria Geral da República com vista à responsabilização relativamente às dividas ocultas, bem como as iniciativas do Governo para combater a corrupção e fortalecer a transparência.
FMI reforça disposição para retomar apoio financeiro a Moçambique
Perpectivas para 2020
As perspetivas económicas de Moçambique para 2020 são de uma forte recuperação e de uma baixa inflação - considera a missão do FMI.
A equipa reiterou, no entanto, a importância de o país forjar instituições mais robustas para ajudar que a receita fiscal dos megaprojetos desempenhe um papel significativo no desenvolvimento sustentável e na redução da pobreza.
Espera-se que o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) real venha a atingir os 5,5% em 2020, em relação aos 2,1% projetados para 2019. A inflação deverá permanecer baixa, com uma ligeira subida para 5% no final de 2020 - em relação aos 3% no final de 2019.
A equipa do FMI considera ainda que a taxa de câmbio tem estado relativamente estável e que as reservas internacionais aumentaram, passando a cobrir mais de seis meses de importações esperadas para o próximo ano, excluindo os megaprojetos.
Entretanto, a missão do Fundo Monetário Internacional recomenda "uma consolidação fiscal gradual a médio prazo, com vista a regularizar o défice fiscal primário até 2022, salvaguardando ou aumentando, simultaneamente, despesas sociais bem direcionadas".
Impacto da crise na vida dos moçambicanos
Trabalhadores em Maputo relatam as dificuldades que enfrentam todos os dias, com o país mergulhado numa crise financeira. Alguns ainda conseguem pequenos lucros, enquanto outros tentam estratégias para atrair clientes.
Foto: DW/Romeu da Silva
Novos tempos, menos lucros
Ana Mabonze tem uma loja de gelados há pouco mais de sete anos e diz que os rendimentos não têm sido bons ultimamente. Por dia, lucra apenas o equivalente a cerca de dois euros. O negócio é feito na ponte cais, também conhecida por Travessia. Nestes dias, os lucros baixaram porque os automobilistas que iam de ferryboat para Katembe agora usam a nova ponte.
Foto: DW/Romeu da Silva
"Boa cena"
O negócio de transferência de dinheiro por telefone conhecido por Mpesa está a alimentar muitas famílias. É o caso de Angélica Langane, que na sua banca "Boa Cena" diz ter clientes frequentemente, porque muitos estão preocupados em transferir dinheiro, seja para pagar dívidas, fazer compras ou apenas para ter a sua conta em dia.
Foto: DW/Romeu da Silva
O dinheiro não aparece
Numa das ruas de Maputo também encontramos Dulce Massingue, que montou a sua banca de venda de fruta. Para ela, este negócio não está a dar lucros. Diz que o pouco que ganha apenas serve para pagar o seu transporte. Nestes dias de crise, Dulce pensa em mudar de negócio, mas tudo depende do dinheiro que não aparece.
Foto: DW/Romeu da Silva
Trabalhar para pagar o transporte?
O trabalho de Jorge Andicene é recolher garrafas plásticas para serem recicladas pelos chineses. Sem ter revelado quanto ganha por este negócio, Jorge diz que não chega a ser bom, porque o mercado está muito apertado. Os preços de vários produtos subiram, por isso também os lucros são apenas para pagar o transporte.
Foto: DW/Romeu da Silva
"As pessoas comem menos na rua"
A dona desta barraca não quis ser identificada, mas confessa que por estes dias o negócio baixou bastante. Vende hambúrgueres e sandes. As pessoas agora preferem trazer as suas refeições de casa para poupar dinheiro, diz. O negócio rende-lhe por dia o equivalente a dois euros, dinheiro que também deve servir para comprar outros bens para as crianças.
Foto: DW/Romeu da Silva
Costureira também não vê lucros
O arranjo de roupas é outro negócio pouco rentável, mesmo nos tempos das "vacas gordas". É oneroso transportar todos os dias esta máquina, por isso Maria de Fátima decidiu ficar num dos armazéns na cidade de Maputo, pagando um determinado valor. São poucos os clientes que a procuram para arranjar as suas roupas.
Foto: DW/Romeu da Silva
Negócio já foi mais próspero
Um dos negócios que tinha tendência de prosperar na capital era a venda de acessórios de telefones. Mas como há muitas pessoas que fazem este negócio, a procura agora é menor e o lucro baixou muito. O que salva um pouco estes empreendedores é o facto de cada dia haver novos tipos de telefones.
Foto: DW/Romeu da Silva
Poder de compra reduzido
Nesta oficina trabalham jovens mecânicos especializados na reparação de radiadores. Não quiseram ser identificados, mas afirmam que durante anos este negócio lhes rendia algum dinheiro para pagar a escola. Mas com a crise que se vive agora, a situação agravou-se. São poucos os clientes que os procuram e alegam que muitos moçambicanos perderam poder de compra.
Foto: DW/Romeu da Silva
Nada de brilho
O negócio de engraxador é outro que já não está a render, segundo os profissionais. Os únicos indivíduos que os procuram são estrangeiros de origem europeia, sobretudo portugueses. Os nacionais, diz Sebastião Nhampossa, preferem fazer o serviço por conta própria em casa. Com esta crise, é normal os engraxadores serem visitados apenas por um ou dois clientes por dia.
Foto: DW/Romeu da Silva
Estratégias para atrair o cliente
Quando as atividades da Inspeção Nacional das Atividades Económicas (INAE) trouxeram à tona a real situação de higiene nos restaurantes, muitos cidadãos passaram a não frequentar estes locais. Como forma de deleitar a clientela, o dono deste pequeno restaurante promove música ao vivo de cantores da velha guarda e ten uma sala de televisão para assistir a jogos de futebol.