Missão do FMI chega a Moçambique
30 de novembro de 2017A retoma de um programa financeiro do Fundo Monetário Inbternacional (FMI) com o Estado moçambicano, suspenso em 2016 devido ao escândalo da dívida soberana, não está, para já, em cima da mesa. "Não estamos agora contemplando isso: o foco é realmente o artigo 4.º", dos estatutos do FMI, que rege a visita, e só "eventualmente se discutirá" o tema, referiu Ari Aisen em entrevista à agência de notícias Lusa.
O artigo em referência é uma norma que prevê consultas aos países-membros, nas quais são feitas avaliações do desempenho macroeconómico, em que se discutem "politicas monetárias, fiscais e financeiras para realmente fazer face à conjuntura", detalhou.
Questionado sobre se, nesse cenário, se incluem as dívidas ocultas, Ari Aisen referiu que o dossiê "vai estar sob análise", num contexto de "reformas estruturais" e da "resposta do Governo", nomeadamente sobre "como fechar essa informação em falta na auditoria" ao processo.
"A missão vai indagar quais os planos do governo nessa área", acrescentou.
Equipa do FMI deverá ficar no país até 13 de dezembro
"A ideia é que, no próximo ano, tenhamos um relatório" sobre estas consultas, referiu o representante da instituição. Ari Aisen prevê que o documento seja publicado no início de 2018 "para que a posição do FMI fique retratada".O fundo e o grupo de 14 doadores diretos ao Orçamento de Estado suspenderam em 2016 as transferências para Moçambique na sequência do escândalo das dívidas ocultas.
A dívida foi contraída em 2013 e 2014, durante a presidência de Armando Guebuza, por três empresas públicas detidas pelo Serviço de Informações e Segurança do Estado (SISE): a EMATUM, supostamente dedicada a uma frota de pesca, a ProIndicus, de segurança e vigilância marítima, e a MAM, ligada à manutenção naval.
Negado acesso a informação relevante
Uma auditoria da consultora internacional Kroll pedida pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e divulgada em junho descreve as firmas como uma fachada, sem planos de gestão credíveis e implica vários detentores de cargos públicos em todo o processo, sem os nomear.
A Kroll queixa-se ainda de lhe ter sido negado acesso a informação relevante para perceber para onde foi o dinheiro, sob justificação de ser material sensível relativa à segurança do Estado.
Até ao momento não são conhecidas quaisquer diligências da justiça moçambicana no sentido de apurar responsabilidades.O FMI mantém a posição oficial comunicada no final da última missão a Moçambique, em julho, de que só deverá retomar um programa depois de serem fornecidas informações que foram negadas pelas próprias empresas públicas à Kroll e depois de haver uma forma de responsabilização pelas irregularidades conhecidas.
Entretanto, as agências de notação financeira desceram o 'rating' do país por incumprimento, fechando portas a financiamento nos mercados internacionais.
A atuação dos bancos que concederam os empréstimos está também a ser investigada pelo polícia federal (FBI) e Ministério da Justiça dos Estados Unidos, para além dos reguladores financeiros do Reino Unido e da Suíça.
Moçambique precisa de voltar a ter um programa com o FMI
O ministro das Finanças de Moçambique, Adriano Maleiane, considera que o país precisa de voltar a ter um programa com o Fundo Monetário Internacional (FMI), apesar de o tema estar fora da agenda da missão que chega na quinta-feira (30.11.) ao país. "Nós precisamos de dinheiro, nós precisamos do programa, é preciso ficar claro", referiu o governante na última intervenção pública em que abordou a relação com o fundo e em que perspetivou a visita.
Maleiane falava no início do mês numa conferência internacional promovida pelo jornal Financial Times, em Maputo.
O ministro deu exemplos de reformas em perspetiva nas contas públicas de Moçambique e referiu que "toda a consolidação fiscal vai exigir dinheiro". A reforma da folha salarial do Estado e consequentes aposentações exige um reforço de 300 milhões de dólares para o Instituto Nacional de Previdência Social, "só para atribuir fundos e pagar responsabilidades passadas", referiu.
Noutro exemplo, disse serem necessários 305 milhões de dólares para fazer face à dívida acumulada junto do setor empresarial desde 2009. "E se pegar nas empresas públicas e reestruturá-las" a soma de todos estes processos ascende a mil milhões.
"FMI precisa estar connosco"
Face às verbas necessárias, "o FMI precisa de estar connosco", até porque "é o catalisador" do financiamento de outros parceiros, realçou Adriano Maleiane.A missão que vai chegar a Maputo vai discutir com as autoridades moçambicanas a evolução da economia do país e o processo das dívidas ocultas de dois mil milhões de dólares, que levou à suspensão do programa com o FMI em 2016. "Estamos a trabalhar com o fundo, temos que ultrapassar isso", sublinhou o ministro.
"Pensamos que estamos a caminhar muito bem para que a situação seja clarificada. Penso que tudo está a ser feito para termos a situação normalizada com todos as atores, incluindo particularmente os credores, porque precisamos também deles no futuro", referiu Adriano Maleiane.
Maleiane espera que a visita, com encontros a decorrer de 30 de novembro a 13 de dezembro, sirva para um "balanço".
O último encontro entre Moçambique e FMI ao abrigo do artigo quarto decorreu em outubro de 2015, recordou o ministro das Finanças.