Dezenas de milhares de pessoas estão a passar fome. Presidente sul-sudanês promete "acesso ilimitado" a organizações humanitárias, depois das Nações Unidas se queixarem que a ajuda não estava a chegar a todos os sítios.
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Três anos de guerra civil no Sudão do Sul, uma seca severa e a profunda crise económica que devastou o país levaram a que fosse declarada uma situação de fome em dois condados do estado de Unidade, no norte.
Mais de 100 mil pessoas estão a passar fome na região e teme-se que o problema se alastre. Segundo um relatório das Nações Unidas, mais um milhão de pessoas está em risco.
Dirigentes da ONU denunciaram que o Presidente Salva Kiir continuava a bloquear o acesso de ajuda alimentar a algumas áreas. Mas, esta terça-feira (21.02.), Kiir garantiu que as organizações humanitárias terão "acesso ilimitado" às populações necessitadas em todo o país.
"Estamos cientes do fracasso das colheitas no ano passado e estamos a tomar medidas para evitar uma potencial fome", afirmou o chefe de Estado sul-sudanês, que prometeu ainda a oferta de alimentos básicos e a atribuição de subsídios.
Próximos tempos são "decisivos"
Os dados do Governo e das agências das Nações Unidas apontam para o agravamento da situação nos próximos meses: 4,9 milhões de pessoas, cerca de 42% da população do país, poderão ficar em situação de insegurança alimentar entre fevereiro e abril.
Isaiah Chol Aruai, diretor do Instituto Nacional de Estatística do Sudão do Sul, teme que o número de pessoas afetadas chegue aos 5,5 milhões em julho.
Fome ameaça populações do Sudão do Sul
"Os dados mostram que, a longo prazo, os efeitos do conflito, combinados com o preço elevado dos alimentos, a crise económica e a falta de meios de subsistência estão a contribuir para o agravamento da insegurança alimentar", explica Aruai.
Segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), mais de 250 mil crianças sofrem de malnutrição severa no país e poderão morrer, caso não chegue a tempo a ajuda alimentar.
"Os próximos dias, semanas, meses são decisivos", alerta Marixie Mercado, porta-voz do fundo. "A UNICEF está a tentar a todo o custo salvar estas crianças. A questão é: Se não tratarmos uma criança severamente malnutrida, é muito provável que ela morra. Mas, se conseguirmos chegar às crianças com apoio terapêutico, elas podem recuperar quase na totalidade."
Para quando o fim da guerra?
O Sudão do Sul tornou-se independente do Sudão em julho de 2011. Dois anos depois, começou um conflito entre Salva Kiir e o seu vice-presidente, Riek Machar, que perdura, apesar da assinatura de um acordo de paz em agosto de 2015.
Kiir renovou na terça-feira o apelo à participação no diálogo nacional - segundo o chefe de Estado, essa é uma prioridade do Governo. Kiir referiu que a iniciativa "não é um truque ou uma tática dilatória" para consolidar o poder, ao contrário do que afirmam os críticos.
Os trabalhos da comissão para o diálogo nacional deverão arrancar em março.
Num discurso a propósito do início do ano parlamentar, Kiir assegurou também que tem um "novo plano económico" para melhorar a situação do país, que prevê a reabertura dos poços de petróleo do estado de Unidade.
O Presidente disse ainda que o Executivo sul-sudanês quer melhorar as relações com a comunidade internacional, após três anos de tensão.
Sudão do Sul: caos no país mais jovem do mundo
Por mais de um mês, o ex-vice-presidente Riek Machar luta com seu exército rebelde contra o Governo do Presidente Salva Kiir. Uma guerra que tem tomado contornos étnicos e já custou cerca de 10 mil vidas, segundo a ONU.
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
Cidade destruída
Por mais de um mês, o ex-vice-presidente Riek Machar luta com seu exército rebelde contra o Governo do Presidente Salva Kiir. Uma guerra que tem tomado contornos étnicos e já custou cerca de 10 mil vidas, segundo a ONU. Muitos lugares foram completamente queimados. Tudo o que os habitantes da cidade de Bentiu ainda têm cabe num saco plástico.
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
Soldados versus antigos companheiros
O Exército Popular de Libertação do Sudão (sigla em inglês, SPLA) pôde reconquistar cidades importantes dos rebeldes. Os soldados muitas vezes lutaram contra seus antigos camaradas. Em meados de dezembro, uma parte do exército voltou-se contra o Governo do Presidente Salva Kiir para seguir o líder dos rebeldes, o ex-vice-presidente Machar.
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
De inimigos a aliados
Para vencer a luta contra os rebeldes, o Governo também se aliou a líderes de controversas milícias – como David Yau Yau, cujo exército lutou durante anos contra o Estado. Até há alguns meses, o Governo queria processar Yau Yau por crimes de guerra. Também crianças lutam no exército dele. Isso se deveria "à natureza dos conflitos no Sudão do Sul," disse Yau Yau.
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
O reduto rebelde
Junto com seus aliados, as tropas do Governo querem reconquistar Malakal - a maior cidade nas mãos dos rebeldes. "As tropas de Riek Machar levam os jovens ao equívoco e recrutam meninos de 16 anos de idade", diz Simon Kun Puoch, o governador do estado do Alto Nilo. Ele teme que o conflito faça retroceder em vários anos o desenvolvimento do país.
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
A violência como o único meio?
Peter Adwok Nyaba perdeu uma perna na Guerra da Independência. Desde que o Presidente Kiir dissolveu o gabinete, em julho de 2013, o ex-ministro se solidariza com os insurgentes. "No Sudão do Sul, o exército é considerado o único meio para implementar as metas," disse o político Nyaba. "Também o Presidente acredita poder resolver o conflito entre ele e seus colegas apenas por meios militares."
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
Solução política para o conflito
"Sabemos que a solução para o conflito não é militar", disse o porta-voz do exército Philip Aguer. O Sudão do Sul está numa crise política que também deveria ser resolvida politicamente. "É triste que alguns políticos tentam dividir o exército e o povo sul-sudanês para alcançar seus objetivos."
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
Uma nação dividida
Ambos os lados negociam sem sucesso há várias semanas. Enquanto isso, o conflito tornou-se cada vez mais étnico - também no exército. Akot Arech, um enviado do Presidente, visita um quartel em que 200 soldados de diferentes grupos étnicos assassinaram uns aos outros. "Isso é inconcebível", diz o político visivelmente chocado. "Como vamos reconstruir o nosso país?"
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
Em fuga
Mesmo nos campos de refugiados das Nações Unidas, os vários grupos étnicos são alojados separadamente. Especialmente entre os Dinka, o grupo étnico do Presidente, e os Nuer, ao qual pertence também o líder rebelde Machar, houve repetidos confrontos. Após ataques direcionados na capital Juba, 20.000 Nuer fugiram para o acampamento Tonping da ONU, há semanas irremediavelmente superlotado.
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
O medo de novos ataques
Há meses, o professor Isaac Maet vive com sua esposa no acampamento de refugiados. Ele tem medo de novos ataques e pouca esperança de que possa, em breve, voltar a trabalhar como professor. "Se fosse apenas um conflito político, com certeza haveria uma solução", diz Maet. "Mas agora é um conflito étnico que, certamente, não será resolvido tão rapidamente."