Fome aumenta e atinge 815 milhões de pessoas no mundo
Rafael Belincanta (Roma) | AFP | Reuters
15 de setembro de 2017
Conflitos e condições climáticas agravadas pelo aquecimento global são principais causas, segundo relatório de agências das Nações Unidas (ONU). Nos PALOP, houve um significativo avanço na erradicação do problema.
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A fome no mundo aumentou, pela primeira vez, em mais de uma década e atinge agora 11% da população global. No ano passado, 815 milhões de pessoas foram afetadas pelo problema, 38 milhões a mais do que em 2015 – devido, em parte, ao aquecimento global piorando condições climáticas e também a conflitos. Um crescimento da economia mais lento, que levou ao colapso nos preços de commodities, também teve impacto na habilidade de pessoas, em vários países, de se alimentarem.
A conclusão é de agências das Nações Unidas (ONU) e fruto do primeiro relatório desde que governos internacionais determinaram um prazo para eliminar a fome e a desnutrição no mundo: 2030. É um dos objetivos de desenvolvimento sustentável da ONU, estabelecidos em 2015. "É um retrocesso que nós já esperávamos desde o ano passado, porque nós tínhamos uma intensificação dos conflitos", disse o diretor geral da FAO, o braço da ONU para a agricultura e a alimentação, à DW, José Graziano da Silva.
A fome começou a aumentar em 2014. Cerca de 489 milhões de pessoas atingidas vivem em países que sofrem por conflitos. "Na última década, os conflitos aumentaram dramaticamente em número e se tornaram mais complexos, de difícil solução", afirmam os chefes das cinco agências da ONU envolvidas no relatório.
A escassez de alimentos atingiu partes do Sudão do Sul no início deste ano e há um risco alto de que ela possa retornar – e se desenvolver em outros países também impactados por conflitos: Nigéria, Somália e o Iêmen, que tem 14 milhões de pessoas sem acesso a alimentos, de acordo com o relatório.A Ásia é onde mais pessoas são afetadas pelo problema: 520 milhões de pessoas. Mas é na África Subsaariana onde está a mais alta proporção em relação ao número de habitantes: 20% da população.
Fome aumenta e atinge 815 milhões de pessoas no mundo
Fome na África
Em todo o continente africano, são 243 milhões de pessoas que sofrem com a fome. "A região tomada por conflito hoje na África é muito maior e envolve um número muito maior de pessoas do que os conflitos da Síria e da Líbia, que eram os que nos preocupavam no ano passado", alega José Graziano da Silva, diretor geral da FAO.
No que diz respeito aos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP), houve um significativo avanço na erradicação do problema. Em Moçambique, 26% da população sofre com a insegurança alimentar, aproximadamente 7,4 milhões de moçambicanos. Em Angola, o percentual de famintos atinge 14%, cerca de 3,5 milhões de angolanos. Porém, a crise nos dois países colocam em risco os resultados positivos, diz Graziano. "Os principais instrumentos de combate à fome e à pobreza extrema estão sendo reduzidos", declara. A solução para colocar um ponto final a eles e salvar vidas, segundo o diretor geral da FAO, é através da subsistência.
Fome e crianças
O número de crianças afetadas pela escassez de alimentos caiu de 29,5% em 2005 para 22,9% no ano passado. O mundo tem, atualmente, 155 milhões de crianças com até cinco anos passando fome.
"Há uma redução, também vemos que ela não acontece tão rápido como gostaríamos", diz Victor Aguaya, o diretor de nutrição do Fundo para a Infância da ONU (UNICEF), uma das agências envolvidas na produção do relatório.
Em contrapartida, o relatório também aponta o problema da obesidade infantil – que atinge cerca de 41 milhões de crianças ao redor do mundo."Obesidade vai afetar, cada vez mais, os pobres, causada por dieta ruim e por um estilo de vida sedentário", completa Aguayo.
Artistas da CPLP unidos contra a fome
Mais de 50 artistas doaram as suas obras para a campanha "Juntos contra a Fome". Os trabalhos estão expostos na galeria da UCCLA em Lisboa. O objetivo: angariar fundos para ajudar a erradicar a fome nos países lusófonos.
Foto: DW/João Carlos
Exposição na sede da UCCLA
Por uma causa nobre, mais de 50 artistas dos países de língua portuguesa doaram as suas obras para a campanha "Juntos contra a Fome". Mais de 90 trabalhos estão expostos até ao dia 22 de setembro na Galeria da União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa (UCCLA), em Lisboa. O objetivo: angariar fundos para ajudar a erradicar a fome nos países que falam português.
Foto: DW/João Carlos
Direitos humanos longe de serem realidade
A exposição, cuja organização contou com a ajuda do artista angolano Carlos Bajouca, foi inaugurada a 5 de setembro pela secretária executiva da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). Maria do Carmo Silveira disse que, apesar dos "grandes esforços" no plano nacional e internacional, o direito humano a uma alimentação adequada está longe de ser uma realidade.
Foto: DW/João Carlos
Não depender sempre da ajuda externa
A mostra abre com um painel do são-tomense Estanislau Neto, que, tendo recorrido a imagens de vacas, valoriza a importância da agricultura e da pecuária no processo de produção alimentar. A criação de gado, de acordo com o artista, seria uma das vias sustentáveis no combate à fome, para contrariar a dependência de donativos.
Foto: DW/João Carlos
Estratégia para segurança alimentar
O desafio é mobilizar apoio para milhões de pessoas que vivem com falta de uma alimentação adequada. Nos países onde se fala português, mais de 20 milhões de pessoas enfrentam esta realidade. Na imagem, fotografias da portuguesa Maria João Araújo.
Foto: DW/João Carlos
Envolvimento da sociedade civil
A campanha "Juntos contra a Fome", lançada em fevereiro de 2014, tem mobilizado a sociedade civil, incluindo escritores, académicos, jornalistas, desportistas e políticos. O angolano Marco Kabenda, autor desta obra, é um dos artistas que apadrinha a iniciativa. A ele juntam-se vários pintores, escultores e tecelões dos nove países onde se fala português.
Foto: DW/João Carlos
Abrir mentes contra o preconceito
Júlio Quaresma também ofereceu um dos seus quadros, que representa a explosão das convenções na atual dinâmica da modernidade. O artista angolano acredita que só se consegue dinamizar e fazer avançar as sociedades quando abrirmos as nossas mentes sem preconceitos, em defesa de uma causa como esta: a da luta contra a fome e a pobreza.
Foto: DW/João Carlos
O poder e a gestão da água
Entre os quadros de Ismael Sequeira, destaque para a temática da gestão da água. O artista são-tomense expressa assim a sua inquietação perante a carência deste líquido precioso. Lembra que a água é importante para a vida e necessária para a agricultura, embora não seja distribuída com racionalidade.
Foto: DW/João Carlos
Amor ao próximo para acabar com a fome
As esculturas do moçambicano Frank N’Taluma transportam sempre consigo uma mensagem apelativa. Aqui, o artista apela ao amor ao próximo. "Para acabar com a fome temos que amar o próximo", afirma, condenando o facto de muita comida ser desperdiçada e deitada para o lixo quando se sabe que há milhares de pessoas a necessitarem de alimentação.
Foto: DW/João Carlos
Outros contributos moçambicanos
De igual modo, o conceituado artista plástico moçambicano Lívio de Morais não ignorou o sofrimento dos que fazem parte das estatísticas da fome nos países lusófonos. A sua contribuição é tão valiosa quanto a dos seus conterrâneos Roberto Chichorro ou Malenga, Sérgio Santimano e José Pádua, também representados na exposição.
Foto: DW/João Carlos
Cinco projetos já financiados
Até agora, de acordo com a CPLP, a campanha "Juntos contra a Fome" já angariou 175 mil euros na campanha ", que permitiram viabilizar cinco projetos em Cabo Verde, na Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe e Moçambique. Este quadro do guineense João Carlos Barros é mais um grão no esforço para angariar mais recursos financeiros para apoiar outros países.
Foto: DW/João Carlos
Promover a agricultura familiar
Os projetos são implementados a 100% por organizações não-governamentais locais, visando promover a agricultura familiar sustentável, assim como reduzir o número de famílias afetadas pela fome nos países lusófonos. Abel Júpiter ofereceu este quadro para o acervo de peças doadas pelos mais de 50 artistas.
Foto: DW/João Carlos
Expetativas para o leilão
No final da exposição, no dia 22, será feito um leilão, para o qual os promotores pediram a participação de todos os que querem dar o seu contributo e engrandecer esta causa. Rui Lourido, diretor do Setor Cultural da UCCLA, também abraça a causa. Na foto, alguns dos artistas que apadrinham a campanha "Juntos contra a Fome".