A situação alimentar no país em crise tende a piorar. Milhares de sul-sudaneses deverão chegar ao vizinho Sudão nos próximos meses, prevê o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados.
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Segundo os números da Organização das Nações Unidas (ONU), 100 mil sul-sudaneses estão a passar fome. E 4,9 milhões de pessoas - mais de 40% da população - precisa de ajuda alimentar urgente.
O estado de Leer é uma das regiões mais afetadas. No centro de distribuição do Programa Alimentar Mundial (PAM), milhares de pessoas esperam em longas filas para se poderem registar e obter comida.
Andrew Ran, de 47 anos, com sete filhos, é um dos 56 mil sul-sudaneses que estão a passar fome em Leer. Na fila de espera, conta que sobrevive graças a plantas selvagens: "Vamos ao rio e apanhamos os chamados lírios de água e às vezes pescamos. Mas os inimigos aparecem sempre. É por isso que não podemos cultivar nesta região".
Controlado pelos rebeldes, o estado de Leer é a terra natal do líder rebelde e ex-vice-presidente Riek Machar. Desde dezembro de 2013, os rebeldes fiéis a Machar combatem as forças governamentais do Presidente Salva Kiir.
Por causa do conflito, não há serviços governamentais a funcionar em Leer e as infraestruturas públicas foram queimadas. Os locais dizem que as forças governamentais incendiaram a região em dezembro último.
Comer à noite para sobreviver
Bol Mol, de 45 anos, que diz ter 39 filhos, arranjou uma maneira de sobreviver. "No sistema tradicional, comíamos duas vezes ao dia, de manhã e à noite. Mas numa situação como esta, comemos à noite. Assim, podemos passar a noite e o dia seguinte sem comida, até voltarmos a obter comida à noite", conta.
Fome no Sudão do Sul afeta 100 mil pessoas
Segundo George Fomyien, funcionário do PAM, a insegurança e os bloqueios que o Governo impôs no acesso de organizações de ajuda a algumas regiões só fizeram piorar a situação.
"O maior problema é a insegurança em algumas regiões que torna muito difícil o acesso. Ouvimos das pessoas nesta comunidade que foram constantemente atacadas, que as casas foram queimadas e por isso tiveram de fugir", relata George Fomyien.
Refugiados no Sudão
Desde janeiro, terão entrado no vizinho Sudão cerca de 32 mil sul-sudaneses que fogem do conflito, de acordo com um relatório divulgado pelo Alto Comissariado da ONU para os Refugiados (ACNUR).
Refugiados relataram à agência das Nações Unidas que têm de caminhar cinco a sete dias para chegar à fronteira com o Sudão. A grande maioria (90%) são mulheres e crianças. "Muitos chegam exaustos e em más condições de saúde, muitas vezes com níveis críticos de desnutrição", diz o ACNUR.
Desde o início da guerra civil no Sudão do Sul, em dezembro de 2013, chegaram ao Sudão perto de 330 mil refugiados.
Sudão do Sul: caos no país mais jovem do mundo
Por mais de um mês, o ex-vice-presidente Riek Machar luta com seu exército rebelde contra o Governo do Presidente Salva Kiir. Uma guerra que tem tomado contornos étnicos e já custou cerca de 10 mil vidas, segundo a ONU.
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
Cidade destruída
Por mais de um mês, o ex-vice-presidente Riek Machar luta com seu exército rebelde contra o Governo do Presidente Salva Kiir. Uma guerra que tem tomado contornos étnicos e já custou cerca de 10 mil vidas, segundo a ONU. Muitos lugares foram completamente queimados. Tudo o que os habitantes da cidade de Bentiu ainda têm cabe num saco plástico.
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
Soldados versus antigos companheiros
O Exército Popular de Libertação do Sudão (sigla em inglês, SPLA) pôde reconquistar cidades importantes dos rebeldes. Os soldados muitas vezes lutaram contra seus antigos camaradas. Em meados de dezembro, uma parte do exército voltou-se contra o Governo do Presidente Salva Kiir para seguir o líder dos rebeldes, o ex-vice-presidente Machar.
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
De inimigos a aliados
Para vencer a luta contra os rebeldes, o Governo também se aliou a líderes de controversas milícias – como David Yau Yau, cujo exército lutou durante anos contra o Estado. Até há alguns meses, o Governo queria processar Yau Yau por crimes de guerra. Também crianças lutam no exército dele. Isso se deveria "à natureza dos conflitos no Sudão do Sul," disse Yau Yau.
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
O reduto rebelde
Junto com seus aliados, as tropas do Governo querem reconquistar Malakal - a maior cidade nas mãos dos rebeldes. "As tropas de Riek Machar levam os jovens ao equívoco e recrutam meninos de 16 anos de idade", diz Simon Kun Puoch, o governador do estado do Alto Nilo. Ele teme que o conflito faça retroceder em vários anos o desenvolvimento do país.
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
A violência como o único meio?
Peter Adwok Nyaba perdeu uma perna na Guerra da Independência. Desde que o Presidente Kiir dissolveu o gabinete, em julho de 2013, o ex-ministro se solidariza com os insurgentes. "No Sudão do Sul, o exército é considerado o único meio para implementar as metas," disse o político Nyaba. "Também o Presidente acredita poder resolver o conflito entre ele e seus colegas apenas por meios militares."
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
Solução política para o conflito
"Sabemos que a solução para o conflito não é militar", disse o porta-voz do exército Philip Aguer. O Sudão do Sul está numa crise política que também deveria ser resolvida politicamente. "É triste que alguns políticos tentam dividir o exército e o povo sul-sudanês para alcançar seus objetivos."
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
Uma nação dividida
Ambos os lados negociam sem sucesso há várias semanas. Enquanto isso, o conflito tornou-se cada vez mais étnico - também no exército. Akot Arech, um enviado do Presidente, visita um quartel em que 200 soldados de diferentes grupos étnicos assassinaram uns aos outros. "Isso é inconcebível", diz o político visivelmente chocado. "Como vamos reconstruir o nosso país?"
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
Em fuga
Mesmo nos campos de refugiados das Nações Unidas, os vários grupos étnicos são alojados separadamente. Especialmente entre os Dinka, o grupo étnico do Presidente, e os Nuer, ao qual pertence também o líder rebelde Machar, houve repetidos confrontos. Após ataques direcionados na capital Juba, 20.000 Nuer fugiram para o acampamento Tonping da ONU, há semanas irremediavelmente superlotado.
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
O medo de novos ataques
Há meses, o professor Isaac Maet vive com sua esposa no acampamento de refugiados. Ele tem medo de novos ataques e pouca esperança de que possa, em breve, voltar a trabalhar como professor. "Se fosse apenas um conflito político, com certeza haveria uma solução", diz Maet. "Mas agora é um conflito étnico que, certamente, não será resolvido tão rapidamente."