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"Fundo Soberano não serve os propósitos de desenvolvimento"

10 de janeiro de 2024

Ausência de enquadramento legal sobre gestão de receitas reduz os impactos do Fundo Soberano, critica o Movimento Cívico sobre o Fundo Soberano. Contrariamente ao FMI, para o movimento não há garantias de transparência.

Geldsack Flash-Galerie
Foto: K.-U. Häßler

O Parlamento moçambicano aprovou a 15 de dezembro a criação do Fundo Soberano de Moçambique (FSM) que deverá gerir receitas da exploração de gás natural, que na década de 2040 deverão chegar 5.500 milhões de euros anuais, segundo previsões do Governo. Mas a oposição e a sociedade civil duvidam da sua base e gestão.

O fundo será gerido pelo Banco de Moçambique e o ministro da economia e Finanças, Max Tonela, afirmou que foram levados em conta exemplos "bem-sucedidos no mundo e os casos menos bons". 

Mesmo assim o Movimento Civico sobre o Fundo Soberano aponta uma lista de falhas no processo de criação do fundo que poderão prejudicar o povo moçambicano. Entrevistámos a coordenadora do Movimento Cívico, Fátima Mimbire:

DW: O FMI considera a aprovação do Fundo Soberano de Moçambique pelo Parlamento um "passo importante" para uma gestão transparente...

Fátima Mimbire, coordenadora do Movimento Civico sobre o Fundo SoberanoFoto: Madalena Sampaio/DW

Fátima Mimbire (FM): Permita-me dizer que para o FMI, mesmo uma lei pobre e mal feita sempre vai ser um bom passo, porque o FMI não tem interesse concreto em ajudar Moçambique a crescer e a desenvolver-se, até porque um Moçambique desenvolvido, que cresce é um mau negócio para o FMI que continua a sobreviver à custa do sofrimento de milhares de pessoas e da pobreza de vários países.

DW: O modelo de gestão do Fundo Soberano agora aprovado é o mais ajustado, se considerarmos as circunstâncias atuais de Moçambique?

FM: Não é o modelo ajustado a realidade do país, nós como sociedade civil, e eu particularmente liderando o Movimento Cívico do Fundo Soberano e como gestora de projetos da Nweti, tivemos a oportunidade de alertar relativamente a esta questão. Moçambique adotou um modelo inventado, que prevê que o Fundo Soberano vai albergar 40% do total das receitas nos primeiros 15 anos e apartir do 16 ano vai albergar 50% e o restante vai para o Orçamento do Estado. Isso significa que o Governo não quer provavelmente um Fundo Soberano como um mecanismo de gestão de receitas, mas criou o Fundo Soberano só para dizer ao FMI, que é o padrinho do processo, que tem um Fundo Soberano. Até porque os 40% do Fundo Soberano não vão ser utilizados para investir em absolutamente nada, senão em capitais ao nível internacional. 

DW: Porém, o Governo diz que buscou exemplos em todo o mundo, desde os bem sucedidos aos menos bons...

Sede do Banco de Moçambique em MaputoFoto: Roberto Paquete/DW

FM: Buscou exemplos e copiou mal, porque, por exemplo, o modelo do Gana que é o que me parece que nós fizemos a cópia imperfeita, ele foi criado por uma lei de gestão de receitas. No fundo nós como Moçambique não precisavamos de uma lei que cria o Fundo Soberano, nós precisamos de uma lei de gestão de receitas, [que determina] como vamos gerir as receitas. É aí onde eventualmente entra o mecanismo do Orçamento do Estado, então significaria que na gestão das receitas temos o Fundo Soberano como um mecanismo e depois temos o Orçamento de Estado como outro mecanismo.

DW: Foi feita uma proposta nesse sentido?

FM: Sim, a sociedade civil fez uma proposta em várias discusões, vários debates não só na altura com o Bano de Moçambique, depois como MEF (Ministério da Economia e Finanças) que passou a liderar o processo, com a Assembleia da República através da Comissão do Plano e Orçamento e também com a primeira Comissão dos Assuntos Constitucionais, com as quais tivemos algumas sessões de engajamento. Então, o problema é que o modelo que nós adotamos não vai responder efetivamente aos objetivos de desenvolvimento que seriam de esperar. É verdade que se tentou minimizar isto ao, por exemplo, na parte das receitas que vai para o Orçamento de Estado prever-se investimentos, por exemplo, em infraestruturas, etc. e doseados no plano de desenvolvimento. Mas o Fundo Soberano teria um impacto maior se tivesse sido enquadrado institucionalmente dentro de uma lei de gestão de receitas que cria o Fundo Soberano, que vai albergar até 10, 20% ou 30%, não seria problema, mas com a clareza sobre qual seria o circuíto dessa percentagem que vai do Fundo Soberano para depois financiar o Orçamento, etc.

DW: Então, essa transparência não está salvaguardada como acredita o FMI?

FM: Não está salvaguardada nenhuma transparência, até porque prevalecem na lei algumas zonas preocupantes de intransparência, por exemplo, quando o Governo diz que pode recorrer ao Fundo Soberano para poder financiar o déficit orçamental, vis-à-vis, as projeções que o Governo faz.

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