Fundo soberano para o gás em Moçambique deverá sair em 2020
Marcio Pessôa
17 de dezembro de 2019
O governador do Banco de Moçambique diz que a proposta para a criação de um fundo soberano das receitas do gás estará concluída no próximo ano e terá a participação de todos os atores interessados na questão.
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O Governo moçambicano deve estruturar uma proposta de fundo soberano originário das receitas da exploração do gás natural em 2020. O plano foi revelado pelo governador do Banco de Moçambique, Rogério Zandamela.
Embora os fundos soberanos sejam instrumentos que possibilitem a gestão transparente dos recursos provenientes do setor extrativo, nem sempre funcionam como o esperado.
Em 2017, a imprensa internacional vazou um imenso volume de documentos referentes a investimentos fiscais. O episódio foi conhecido como "Paradise Papers" e, entre outras revelações, apontou o esquema de enriquecimento ilícito dos gestores do Fundo Soberano de Angola. O fundo angolano foi criado em 2012 para investir parte do dinheiro do petróleo no desenvolvimento do país.
Zadamela disse no evento de encerramento do ano económico de 2019, em Maputo, que serão concluídos "trabalhos técnicos visando a implementação de um modelo transparente para a gestão das receitas provenientes dos recursos minerais". O governador do banco salientou que desse esforço técnico sairá uma proposta de fundo soberano.
Cuidados necessários
Moçambique não criou uma plataforma permanente de discussão entre governo, setor privado e sociedade civil para a estruturação de um fundo soberano. A pesquisadora do Centro de Integridade Pública (CIP), Inocência Mapisse, lembra que houve alguns esforços de discussão técnica no início de 2019, mas considera que a participação da sociedade civil foi ainda "muito restrita".
Fundo soberano para o gás em Moçambique deverá sair em 2020
Mapisse elogia a ideia de criação de um fundo soberano, mas indica que, para além do Banco Central moçambicano, são necessárias as participações de instituições do governo, da sociedade civil e do setor privado "para que o fundo contribua para a diversificação da economia".
Moçambique apresenta instrumentos legais que orientam a participação das comunidades que hospedam os projetos na receita da exploração do gás. O percentual de participação, porém, é determinado pelo orçamento público. Segundo Mapisse, mesmo com o percentual de participação das comunidades nas receitas poder variar ao longo dos anos, ele permanece em 2,75% desde 2013.
A frustração das comunidades
As comunidades têm expectativa sobre qual será a sua participação nos recursos gerados pela exploração do gás. No entanto, o que tem se verificado nas comunidades é alguma frustração. A pesquisadora do CIP diz as comunidades ainda não entendem como os valores originários da exploração do gás podem ser alocados.
"Muitos tem a expectativa de ter um valor no próprio bolso para implementar um determinado projeto, mas da forma que isso tudo foi definido não há margem de manobra para que isso aconteça. Quem acaba alocando os valores é o próprio governo", critica Mapisse.
Moçambique tem reservas de gás natural estimadas em cerca de 270 triliões de metros cúbicos. Ainda não há exploração de Gás Natural Liquefeito. A exploração na Bacia do Rovuma, em Cabo Delgado, terá início nos próximos anos, mas já se explora gás natural em Pande, Temane e Inhassoro em Inhambane.
Pemba: degradação em tempos de boom
Apesar do crescimento económico causado pelas descobertas de gás no norte de Moçambique, os edifícios históricos de Pemba continuam degradados. Os investimentos vão à construção de novos edifícios e não à reabilitação.
Foto: DW/E. Silvestre
Casas históricas em ruínas
Apesar do crescimento económico causado pelas descobertas de gás no norte de Moçambique, os edifícios do centro histórico de Pemba continuam degradados. Os investimentos vão à construção de novos edifícios e não à reabilitação. A degradação não poupa prédios com elevado valor histórico como esta casa, que foi na era colonial e até 1979 a residência do governador da província de Cabo Delgado.
Foto: Eleutério Silvestre
Mercado central de Pemba
O mercado localiza-se na cidade baixa da cidade desde 1940. Foi uma atração turística de Pemba, que em tempos coloniais era chamada Porto Amélia. Os números e as letras na placa por cima da fachada da entrada, resistem as intempéries naturais e ainda testemunham o quanto foi importante o mercado para os colonos portugueses.
Foto: Eleutério Silvestre
Negócio parado: as bancas do mercado
Nestas bancas simples eram expostos cereais, leguminosas e outros produtos alimentares. Antes do total abandono nos anos 2000, o mercado era frequentado por cidadãos da classe média de diferentes bairros de Pemba, atraídos pelo nível de higiene que caraterizava na exposição dos produtos. Vendia-se o melhor peixe e a melhor carne da cidade de Pemba.
Foto: Eleutério Silvestre
Abandono total: o cinema de Pemba
O cinema de Pemba, localizado na periferia da cidade baixa, era o único da cidade. Até 1990, eram projetados filmes na sala: das 14 às 16 horas os filmes para menores e das 17 às 21 horas as longas metragens para maiores de 18 anos. O cinema era ponto de encontro de cidadãos de diferentes idades de Pemba. O edifício funcionou também como ginásio de 2008 a 2012.
Foto: Eleutério Silvestre
Novas construções na vizinhança
Em vez de renovar e adaptar edifícios históricos já existentes, constroem-se novos prédios em Pemba, a capital da província moçambicana de Cabo Delgado. Este projeto do anfiteatro de Pemba é fruto de uma parceria público privada, entre o Hotel Wimbe Sun e o Conselho Municipal de Pemba. Mais um exemplo de que os investimentos vão para a construção e não para a reabilitação.
Foto: DW/E. Silvestre
Construir de raiz em vez de reabilitar
Mesmo para escritórios, que facilmente poderiam ser instalados em prédios históricos renovados, a opção preferida é construir de raiz. Assim sendo, o "boom" económico causado pela descoberta de grandes quantidades de gás na Bacia do Rovuma na província de Cabo Delgado não beneficia o centro histórico da cidade de Pemba. Este edifício é destinado para albergar uma filial bancária.
Foto: DW/E. Silvestre
Antiga delegação da Cruz Vermelha
Esta casa localiza-se na principal via de acesso à cidade baixa de Pemba. Serviu em regime de arrendamento como primeira delegação da Cruz Vermelha na província. A partir deste edifício, a Cruz Vermelha desencadeou ações humanitárias durante a guerra civil de Moçambique. Em 1999, a Cruz Vermelha de Moçambique abandonou a casa e mudou para infraestruturas próprias modernas.
Foto: Eleutério Silvestre
Armazém histórico de Pemba
Este armazém na cidade baixa faz parte dos edifícios históricos abandonados. Durante a guerra civil, serviu para o armazenamento de alimentos. Foi aqui que os residentes do bairro mais antigo de Pemba, Paquitequete, compravam produtos de primeira necessidade. Teve um papel muito importante durante a emergência de fome que assolou a população de Pemba durante a guerra civil no ano de 1980.
Foto: Eleutério Silvestre
Porto de Pemba
Quando o centro histórico está em degradação, uma das zonas mais dinámicas de Pemba é o porto. Do lado direito, as antigas instalações, do lado esquerdo a zona de ampliação destinada a carga do material da exploração do gás. O cais flutuante foi construído pela empresa francesa Bolloré. A esperança é que o boom do gás ajuda a reabilitar para além do porto também os edifícios históricos de Pemba.