Futebol no feminino em Maputo
18 de abril de 2013 Para Felizarda Lemos, ser treinadora de futebol de uma equipa masculina é, acima de tudo, um desafio, mas um desafio bom. Ser treinadora de futebol, conta, é ser mãe, ser educadora, ser mestre. A DW África conversou com a treinadora principal do Zixaxa que, depois de ter treinado equipas femininas, tornou-se a primeira moçambicana a dirigir homens nos relvados do país.
DW África: Passou por alguma formação de treinadores?
FL: Sim. Tenho o nível C da CAF [Confederação Africana de Futebol].
DW África: E foi em que ano?
FL: No ano passado. Mas já tinha tirado muitos cursos ao longo da minha carreira como treinadora.
DW África: Treina o Zixaxa desde janeiro até ao momento. Quantos jogos já realizou e quais foram os resultados obtidos?
FL: Fiz quatro jogos de preparação, em que tive três vitórias e uma derrota e agora, no torneio de abertura, fiz quatro jogos e tive duas derrotas e duas vitórias.
DW África: Em poucos momentos da história dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) encontramos treinadoras de futebol masculino. Como se sente por quebrar esta barreira?
FL: Eu sinto-me uma heroína, porque na verdade é muito difícil ser treinadora de futebol masculino, principalmente em África, onde ainda há um tabu de que a mulher não pode estar no futebol, a dirigir o futebol masculino. Entao, sinto-me uma heroína. Espero que muitas mulheres sigam o exemplo e que consigamos vencer este tabu.
DW África: Sente alguma discriminação no seu dia a dia como treinadora de uma equipa masculina?
FL: Muita discriminação, principlamente por parte dos outros treinadores.
DW África: E como reage?
FL: Naturalmente. [A parte positiva] é que, no final de tudo, eles reconhecem que aqui [não está apenas uma mulher, mas] uma treinadora. É isso que me dá mais força para trabalhar. Eu tenho notado ultimamente que, quando os outros treinadores sabem que vão jogar [contra a minha equipa], trabalham mais, esforçam-se mais, porque nenhum homem quer perder [contra] uma mulher. Então, a minha presença no torneio, no campeonato, acaba sendo boa para os treinadores [para que eles trabalhem] mais, porque muitos deles sentem-se humilhados quando perdem [contra mim] e isso é bom para o desporto.
DW África: E do lado do público sofre discriminação?
FL: Do lado do público e das outras mulheres tenho recebido muito apoio. Mas do lado dos colegas ainda sofro um pouco de discriminação. Mas creio que vai passar.
DW África: mas porque é que ainda existe este tipo de discriminação num país como Moçambique?
FL: Porque nunca aconteceu isso em Moçambique. Pelo que sei, nunca houve uma mulher a treinar homens. Já apareceram algumas mulheres a treinar mulheres, mas a treinar homens é um caso único. Então, acaba sendo normal a reação deles.
DW África: Aliás, o futebol feminino nos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa não é valorizado.
FL: Não é valorizado. E a minha presença como treinadora de uma equipa masculina é para provar também que a mulher pode fazer algo. É mais para tentar abrir um pouco a mente de alguns dirigentes para valorizarem mais a mulher. Porque temos muito talento no futebol feminino, mas não é valorizado.
DW África: Qual foi o seu momento mais feliz enquanto treinadora?
FL: Ainda não tive. Foi um treino, então não o considero [o momento mais feliz]. Foi contra o Desportivo de Maputo e venci, mas não conta muito.
DW África: A relação com os jogadores tem sido boa?
FL: Muito boa, muito positiva. São eles que acabam por me dar muita força.
DW África: Quem é Felizarda Lemos?
FL: Felizarda Lemos é mãe, esposa, mulher.
DW África: E o que é que o seu marido pensa da sua profissão?
FL: (risos) Graças a deus, posso dizer que sou uma felizarda como esposa, porque o meu marido apoia-me em tudo. Posso dizer que sou obra do meu marido. Porque ele sempre me apoiou em tudo o que eu pensei fazer. E continua a apoiar-me. Em nenhum momento me desanimou, pelo contrário: quando eu quis desistir, ele deu-me força para continuar.
DW África: Então não pensa desistir da profissão?
FL: Nunca.