O novo coronavírus fez recuar os preços do gás no mercado internacional e 24 empresas que operam neste setor em Moçambique já perderam mais de 240 milhões de dólares. Investimentos de sonho transformaram-se num pesadelo?
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O sonho dos investimentos bilionários no setor da indústria extrativa no norte de Moçambique está a transformar-se num pesadelo, devido aos impactos do novo coronavírus. Alguns megaprojetos das Áreas 1 e 4 na bacia do Rovuma estão já a ressentir-se da pandemia, que forçou a baixa do preço do gás.
Até ao momento, 32% das empresas do setor extractivo, nas áreas 1 e 4 da bacia do Rovuma, registaram uma redução de 100% no volume de negócios. As pequenas e médias empresas são as mais sacrificadas, diz o empresário Munir Sacur, do pelouro de hidrocarbonetos e energia da Confederação das Associações Económicas (CTA).
"Mais de 500 pequenas e médias empresas associadas à indústria extrativa foram afetadas pelo impacto da Covid-19 até à data, pelo que 87% dessas empresas fecharam completamente devido à suspensão temporária de contratos", revelou o empresário em conferência de imprensa, em Maputo.
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Nem o megaprojeto de liquefação da gigante francesa Total na Área 1, avaliado em 26 mil milhões de dólares, nem o projeto Coral Sul, da plataforma flutuante de liquefação, estão a resistir à Covid-19.
"Poderá atrasar dois a três meses e ainda assim mantém-se a perspectiva de exploração em 2022. A Exxon Mobile adiou a decisão final de investimento do projeto do complexo Mamba na Área 4, que estava prevista para abril, e projeta um corte de 30% de custos internacionais devido à queda de preço de petróleo e Covid-19", foi ainda anunciado.
O presidente do pelouro dos Recursos Minerais Hidrocarbonetos e Energia da CTA, Simon Santi, acredita que apesar dos efeitos catastróficos do coronavírus na Área 1, liderada pela Total, a preocupação é temporária. "E a partir de junho, os primeiros trabalhos, as primeiras obras vão voltar no acampamento de Afungi, que vai ser limpo por causa do coronavírus", assegurou.
Alerta para mudança de modelo
A pesquisadora do Centro de Integridade Pública (CIP), Inocência Mapisse, não tem dúvidas de que a queda do preço do gás no mercado mundial vai criar prejuízos económicos a Moçambique.
"A manter-se esta situação, da pandemia e queda de preço do petróleo, as empresas irão rever a sua estrutura de custos. Porque como houve restrições na circulação de pessoas e bens, isso acaba tendo um impacto nas compras e aquisições dessas empresas", explica.
Para que o sonho dos investimentos bilionários na bacia do Rovuma não seja um pesadelo, Inocência Mapisse recomenda um modelo do preço de gás que se baseie na dinâmica da procura e oferta do mercado.
"Olhamos isso como uma espécie de alerta, porque usando este argumento pode-se optar por qualquer mecanismo de estabelecimento do preço do gás natural diferente daquele que está a ser usado a nível internacional, que tenta dissociar um pouco mais o preço do gás e do petróleo."
Os empresários apelam ao diálogo com o Ministério dos Recursos Minerais e Energia e Instituto Nacional de Petróleos, para avaliar as condições de Moçambique para enfrentar o problema de preços.
Pemba: degradação em tempos de boom
Apesar do crescimento económico causado pelas descobertas de gás no norte de Moçambique, os edifícios históricos de Pemba continuam degradados. Os investimentos vão à construção de novos edifícios e não à reabilitação.
Foto: DW/E. Silvestre
Casas históricas em ruínas
Apesar do crescimento económico causado pelas descobertas de gás no norte de Moçambique, os edifícios do centro histórico de Pemba continuam degradados. Os investimentos vão à construção de novos edifícios e não à reabilitação. A degradação não poupa prédios com elevado valor histórico como esta casa, que foi na era colonial e até 1979 a residência do governador da província de Cabo Delgado.
Foto: Eleutério Silvestre
Mercado central de Pemba
O mercado localiza-se na cidade baixa da cidade desde 1940. Foi uma atração turística de Pemba, que em tempos coloniais era chamada Porto Amélia. Os números e as letras na placa por cima da fachada da entrada, resistem as intempéries naturais e ainda testemunham o quanto foi importante o mercado para os colonos portugueses.
Foto: Eleutério Silvestre
Negócio parado: as bancas do mercado
Nestas bancas simples eram expostos cereais, leguminosas e outros produtos alimentares. Antes do total abandono nos anos 2000, o mercado era frequentado por cidadãos da classe média de diferentes bairros de Pemba, atraídos pelo nível de higiene que caraterizava na exposição dos produtos. Vendia-se o melhor peixe e a melhor carne da cidade de Pemba.
Foto: Eleutério Silvestre
Abandono total: o cinema de Pemba
O cinema de Pemba, localizado na periferia da cidade baixa, era o único da cidade. Até 1990, eram projetados filmes na sala: das 14 às 16 horas os filmes para menores e das 17 às 21 horas as longas metragens para maiores de 18 anos. O cinema era ponto de encontro de cidadãos de diferentes idades de Pemba. O edifício funcionou também como ginásio de 2008 a 2012.
Foto: Eleutério Silvestre
Novas construções na vizinhança
Em vez de renovar e adaptar edifícios históricos já existentes, constroem-se novos prédios em Pemba, a capital da província moçambicana de Cabo Delgado. Este projeto do anfiteatro de Pemba é fruto de uma parceria público privada, entre o Hotel Wimbe Sun e o Conselho Municipal de Pemba. Mais um exemplo de que os investimentos vão para a construção e não para a reabilitação.
Foto: DW/E. Silvestre
Construir de raiz em vez de reabilitar
Mesmo para escritórios, que facilmente poderiam ser instalados em prédios históricos renovados, a opção preferida é construir de raiz. Assim sendo, o "boom" económico causado pela descoberta de grandes quantidades de gás na Bacia do Rovuma na província de Cabo Delgado não beneficia o centro histórico da cidade de Pemba. Este edifício é destinado para albergar uma filial bancária.
Foto: DW/E. Silvestre
Antiga delegação da Cruz Vermelha
Esta casa localiza-se na principal via de acesso à cidade baixa de Pemba. Serviu em regime de arrendamento como primeira delegação da Cruz Vermelha na província. A partir deste edifício, a Cruz Vermelha desencadeou ações humanitárias durante a guerra civil de Moçambique. Em 1999, a Cruz Vermelha de Moçambique abandonou a casa e mudou para infraestruturas próprias modernas.
Foto: Eleutério Silvestre
Armazém histórico de Pemba
Este armazém na cidade baixa faz parte dos edifícios históricos abandonados. Durante a guerra civil, serviu para o armazenamento de alimentos. Foi aqui que os residentes do bairro mais antigo de Pemba, Paquitequete, compravam produtos de primeira necessidade. Teve um papel muito importante durante a emergência de fome que assolou a população de Pemba durante a guerra civil no ano de 1980.
Foto: Eleutério Silvestre
Porto de Pemba
Quando o centro histórico está em degradação, uma das zonas mais dinámicas de Pemba é o porto. Do lado direito, as antigas instalações, do lado esquerdo a zona de ampliação destinada a carga do material da exploração do gás. O cais flutuante foi construído pela empresa francesa Bolloré. A esperança é que o boom do gás ajuda a reabilitar para além do porto também os edifícios históricos de Pemba.