Gabão: Militares anunciam "fim do regime" de Ali Bongo
DW (Deutsche Welle) | AFP | Lusa
30 de agosto de 2023
Um grupo de militares gaboneses anunciou na televisão, esta madrugada, "o fim ao atual regime" e a anulamento das eleições que, de acordo com os resultados oficiais, foram ganhas pelo Presidente Ali Bongo, no sábado.
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O anúncio da dissolução de todas as instituições democráticas foi feito por cerca de uma dúzia de soldados gaboneses, num comunicado de imprensa lido no Gabon 24, um canal de televisão detido pela Presidência, e surgiu depois de o órgão eleitoral estatal ter declarado o Presidente Ali Bongo vencedor das eleições presidenciais.
Depois de constatada "uma governação irresponsável e imprevisível que resultou numa deterioração contínua da coesão social que corre o risco de levar o país ao caos", declarou um dos soldados, "em nome do povo gabonês, decidimos defender a paz pondo fim ao atual regime."
O militar, que disse falar em nome do "Comité de Transição e Restauração Institucional" e surgiu ladeado por um grupo coronéis do exército, membros da Guarda Republicana de elite, soldados regulares e outros, disse que todas as fronteiras do Gabão estavam "encerradas até nova ordem".
Ali Bongo Ondimba encontra-se neste momento em prisão domiciliária. Outras pessoas do Governo foram detidas sob várias acusações. Um dois filhos do Presidente encontra-se igualmente detido, anunciaram os militares.
Durante a transmissão televisiva ouviram-se tiros de metralhadoras automáticas na capital, Libreville.
Horas antes, às 03:30, o Centro Eleitoral do Gabão tinha divulgado na televisão estatal os resultados oficiais das eleições presidenciais.
Tensão elevada desde as eleições
A tensão no país aumentou após as eleições de sábado (26.08), com Ali Bongo Ondimba a concorrer a um terceiro mandato, apesar dos apelos da oposição à mudança no país.
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A comissão eleitoral disse esta madrugada que o Presidente Bongo, no poder há 14 anos, tinha conquistado um terceiro mandato nas eleições de sábado com 64,27% dos votos expressos, derrotando o principal rival, Albert Ondo Ossa, que obteve 30,77% dos votos.
O anúncio foi feito numa altura em que o Gabão estava sob recolher obrigatório e com o acesso à Internet suspenso em todo o país, medidas impostas pelo Governo no dia das eleições.
O Governo invocou o risco de violência, na sequência das declarações de Ondo Ossa, que exigia ser declarado vencedor. O exército e a polícia montaram bloqueios de estradas em toda a capital, durante a madrugada, para impor o recolher obrigatório pela terceira noite consecutiva.
As ligações de internet foram, entretanto, restabelecidas no Gabão, três dias após terem sido cortadas pelo governo. De acordo com a Agência France Presse, o sistema foi restabelecido após o anúncio dos militares.
UE adverte para aumento da instabilidade
O Alto Representante da União Europeia (UE) para os Negócios Estrangeiros afirmou hoje que a eventual confirmação do golpe de Estado no Gabão "aumentará a instabilidade em toda a região" central de África.
"Se isto se confirmar, é mais um golpe militar que aumenta a instabilidade em toda a região", declarou Josep Borrell, ao chegar à reunião de ministros da Defesa da UE, que se realiza em Toledo, em Espanha.
Borrell confirmou que a situação na África subsaariana "não está propriamente a melhorar", visto as notícias que recebeu sobre o Gabão.
Questionado sobre a reação da União Europeia caso se confirme-se o golpe militar no Gabão, o chefe da diplomacia da UE respondeu com "vamos ver". "É difícil antecipar o que os ministros vão dizer" sobre o Gabão durante a reunião que se realiza em Toledo, avaliou Borrell.
Golpes de Estado em África: Um mal endémico
Em menos de um ano, o continente africano viveu oito golpes e tentativas de golpe de Estado. A maior parte aconteceu na África Ocidental, região do continente mais fértil para as intentonas. Não há fator surpresa.
Foto: Radio Television Guineenne/AP Photo/picture alliance
Níger: Tentativa de golpe fracassada
A tentativa de golpe de Estado aconteceu a 31 de março de 2021, dois dias antes da tomada de posse do Presidente Mohamed Bazoum. Na capital, Niamey, foram detidos alguns membros do Exército por detrás da tentativa. O suposto líder do golpe é um oficial da Força Aérea encarregado da segurança na base aérea de Niamey. O Níger já sofreu 4 golpes de Estado: o último, em 2010, derrubou Mamadou Tandja.
Foto: Bernd von Jutrczenka/dpa/picture alliance
Chade: Uma sucessão com sabor a golpe de Estado
Pouco depois do marechal Idriss Déby ter vencido as presidenciais, morreu em combate contra rebeldes. A 21 de abril de 2021, o seu filho, o general Mahamat Déby, assumiu a liderança do país, sem eleições, nomeando 15 generais para o Conselho Militar de Transição, entre eles familiares seus. Idriss governou o Chade por mais de 30 anos com mão de ferro e o filho dá sinais de lhe seguir os passos.
Foto: Christophe Petit Tesson/REUTERS
Mali: Um golpe entre promessas de eleições
O coronel Assimi Goita foi quem derrubou Bah Ndaw da Presidência do Mali a 24 de maio de 2021. Justifica que assim procedeu porque tentava "sabotar" a transição no país. Mas Goita prometeu eleições para 2022 e falou em "compromisso infalível" das Forças Armadas na defesa da segurança do país. Pouco depois, o Tribunal Constitucional declarou o coronel Presidente da transição.
Foto: Xinhua/imago images
Tunísia: Um golpe de Estado sem recurso a armas
No dia 25 de julho de 2021, Kais Saied demitiu o primeiro ministro, seu rival, Hichem Mechichi, e suspendeu o Parlamento por 30 dias, o que foi considerado golpe de Estado pela oposição, que convocou manifestações em nome da democracia. Saied também levantou a imunidade dos parlamentares e garantiu que as decisões foram tomadas dentro da lei. Nas ruas de Tunes, teve o apoio da população.
Foto: Fethi Belaid/AFP/Getty Images
Guiné-Conacri: Um golpista da confiança do Presidente
O dia 5 de setembro de 2021 começou com tiros em Conacri, uma capital que foi dominada por militares. O Presidente Alpha Condé foi deposto e preso pelo coronel Mamady Doumbouya - que dissolveu a Constituição e as instituições. O golpista traiu Condé, que o tinha em grande estima e confiança. Doumboya tinha demasiado poder e não se entendia com a liderança da ala castrense.
Foto: Radio Television Guineenne via AP/picture alliance
Sudão: Golpe compromete transição governativa
A 25 de outubro de 2021, os golpistas começaram por prender o primeiro ministro, Abdalla Hamdok, e outros altos quadros do Governo para depois fazerem a clássica tomada da principal emissora. No comando estava o general Abdel Fattah al-Burhan, que dissolveu o Conselho Soberano. Desde então, o Sudão vive manifestações violentas, com a polícia a ser acusada de uso excessivo de força.
Foto: Mahmoud Hjaj/AA/picture alliance
Burkina Faso: Golpe de Estado festejado
A turbulência marcou o começo do ano, mas a intentona foi celebrada em grande nas ruas da capital, Ouagadougou. A 23 de janeiro de 2022, o tenente-coronel Paul Damiba liderou o golpe de Estado ao lado do Exército. Ao Presidente Roch Kaboré não restou outra alternativa se não demitir-se. Tal como os golpistas de outros países, comprometem-se a voltar à ordem constitucional após consultas.
Foto: Facebook/Präsidentschaft von Burkina Faso
Guiné-Bissau: Intentona ou "inventona"?
Tiros, alvoroço, mortos e feridos no Palácio do Governo marcaram o dia 1 de fevereiro de 2022 em Bissau. O Presidente Umaro Sissoco Embaló diz que os golpistas queriam matá-lo e ao primeiro ministro, Nuno Nabiam. Houve algumas detenções, mas até hoje não se conhece o líder golpista. No país, acredita-se que tudo não passou de um "teatro" orquestrado pelo próprio Presidente, amplamente contestado.