General do Exército empossado vice-presidente do Zimbabué
Columbus Mavhunga (Harare) | cvt
28 de dezembro de 2017
Dois vice-presidentes tomaram posse no Zimbabué esta quinta-feira (28.12). Presença do ex-chefe do Exército Constantino Chiwenga no gabinete acende debate sobre influência dos militares no Governo.
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Juntamente com o ministro da Defesa, Kembo Mohadi, o general Constantino Chiwenga foi empossado, esta quinta-feira (28.12), como vice-presidente do Zimbabué. A Constituição do país prevê dois cargos de vice-presidente.
Um dos principais temas de que os vice-presidentes se ocuparão é uma economia moribunda, que quase entrou em colapso sob a liderança do então Presidente Robert Mugabe, que ao longo de 37 anos dirigiu o Zimbabué com mão de ferro, explicou o Presidente Emmerson Mnangagwa.
"Acredito que eles são muito experientes. Eles têm que dirigir os ministros. O desempenho dos ministros será um reflexo da supervisão que eles darão. Então, o desempenho dele será reflectido nos resultados dos ministros que dirigem", afirmou o Presidente.
Faltam novidades
Mas a posse do ex-chefe do Exército, Costantino Chiwenga, que comandou a operação militar que afastou Robert Mugabe do poder, em novembro passado, não foi bem recebida por todos. O general Chiwenga é o militar que apareceu na televisão estadual que precedeu a tomada das ruas pelo exército e a prisão domiciliar de Mugabe, que pavimentaram o caminho para Emmerson Mnangagwa se tornar Presidente.
"Para mim, isso é apenas retórica. Não há nada de novo. Estas são pessoas que têm estado no Governo já há algum tempo e não estou a esperar nada de novo. Talvez se lhes dermos alguns meses. Mas, neste momento, estou muito cética sobre a composição [do Governo]", critica Dambudzo Maupa, uma comerciante de 34 anos.
"Estávamos à espera de sangue novo, pessoas mais jovens. Pessoas que alcançaram resultados nas indústrias. Mas agora não há nada nesse sentido", acrescenta a comerciante.
General do Exército empossado vice-presidente do Zimbabué
Dúvidas persistem
Para os zimbabueanos, o novo gabinete é considerado um híbrido de golpistas e civis, explica o diretor da Comissão Internacional de Juristas em África, Arnold Tsunga.
"A designação do general que liderou a intervenção militar que resultou na remoção do Presidente Mugabe do poder, levanta novamente a questão sobre se houve ou não um golpe de Estado no Zimbabué ou, nas palavras da União Africana, sobre se houve uma mudança inconstitucional de Governo", avalia Tsunga.
"Mas o que é importante agora é conseguir que o novo Governo restaure completamente o Estado de Direito e a autoridade civil através da organização de eleições livres, justas e credíveis", conclui o diretor da Comissão Internacional de Juristas em África.
Espera-se que o Zimbabué realize eleições em meados de 2018. Mnangagwa já indicou que irá concorrer. Grupos de direitos humanos temem que o envolvimento do Exército no policiamento dos cidadãos - desde que o aparente golpe teve lugar, em novembro - pressione os zimbabueanos à submissão e que, por isso, o resultado das urnas não refleta os desejos dos eleitores. A suspeita agravou-se, quando o assessor especial do Presidente Mnangagwa disse que o partido no poder, ZANU-PF, usaria os militares para garantir a vitória no pleito de 2018.
De herói a vilão: a vida de Robert Mugabe
Depois de 37 anos no poder, chega ao fim a governação do humilde camponês que se tornou, aos olhos de muitos, um ditador. Robert Mugabe renunciou à Presidência do Zimbabué.
Foto: picture-alliance/abaca/G. Buthaud
Origens humildes
Nascido, em Harare, no seio de uma família humilde – o seu pai era carpinteiro e a sua mãe professora – Robert Gabriel Mugabe foi educado numa escola jesuíta até se tornar professor primário. Entre os anos de 1942 e 1960, exerceu na antiga Rodésia, Zâmbia e no Gana. Estudou Inglês, História, Educação e tirou uma licenciatura em Economia, na Universidade de Londres.
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Uma década detido
Aos 36 anos, Mugabe dá inicio à sua luta política focada na independência da Rodésia do Sul do Reino Unido. Funda a União Nacional Africana do Zimbabué – Frente Patriótica (ZANU-PF) em 1963 e, um ano depois, é preso. Em 1974, altura em foi libertado, Mugabe vai para Moçambique, onde liderou uma guerrilha contra o Governo de minoria branca de Ian Smith. Em 1979, Mugabe voltou ao seu país.
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Mugabe torna-se primeiro-ministro
Em 1980, Robert Mugabe é eleito primeiro-ministro da ex-Rodésia do Sul. Em abril deste ano, é declarada a independência do país que passa a chamar-se “Zimbabué”. Na altura, Mugabe afirmou: "O facto de os brancos nos terem oprimido no passado quando detinham o poder jamais poderá justificar que, hoje, os negros os oprimam só porque agora detêm o poder".
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Povo esperançoso
A subida de Mugabe ao poder trouxe a esperança. O líder do ZANU-PF prometeu melhorias na vida dos cidadãos. Começou por introduzir o ensino primário gratuito, assim como o acesso a assistência médica básica para os mais desfavorecidos, ainda que estas medidas apenas tenham chegado a uma parte da população. Mugabe foi mesmo comparado a Nelson Mandela.
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Chegam os massacres
Dois anos mais tarde, em 1982, Mugabe rompe a coligação do seu partido (ZANU-PF) com a União Popular Africana do Zimbábue (ZAPU) de Joshua Nkomo. Nesta disputa pelo poder, Nkomo teve o apoio das etnias Ndebele. É nesta altura que tem lugar um dos piores massacres que o país tem memória. As forças armadas leais a Mugabe cometeram atrocidades, matando cerca de 20.000 civis.
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Mugabe a Presidente
Em 1987, Mugabe torna-se Presidente do Zimbabué. Já aqui se falava na deterioração do seu estado de saúde. No entanto, o sexagenário deixava claro que a reforma não estava para breve: “O partido irá encontrar um sucessor. Eu vim do povo. O povo na sua sabedoria irá selecionar alguém, assim que eu diga que me vou aposentar. Mas ainda não é altura. Nesta idade ainda posso seguir em frente”, disse.
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Um homem, várias perspetivas
Em 1994, enquanto milhares de cidadãos do Zimbabué continuavam dependentes de ajuda humanitária, não tendo acesso aos cuidados básicos, o presidente era distinguido pela Coroa britânica, em Londres. No Zimbabué, os primeiros protestos deixavam perceber que no país não havia motivo de orgulho no Presidente. No final dos mesmos anos 90, as manifestações contra o poder começaram a intensificar-se.
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A trágica reforma agrária
Em resposta ao descontentamento social, Mugabe lança a reforma agrária no início de 2000, uma medida que levou à nacionalização forçada das propriedades agrícolas que pertenciam à população branca para serem redistribuidas pelos negros. No entanto, os mais beneficiados foram a família de Mugabe e a elite partidária do ZANU-PF que ficaram com várias explorações. A produção agrícola caiu muito.
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"Deixem-me ser Hitler vezes dez"
Até aqui, Mugabe já tinha ganho as eleições de 1984, 1990 e 1996. A cada nova eleição sucediam-se as acusações de fraude, o que fez com que, em 2002, os Estados Unidos e a União Europeia aplicassem sanções ao país. Aos que o apelidavam de ditador, disse: "Sou o Hitler da nossa época. O Hitler que tem por objetivo a justiça para o povo. Se isso é ser um Hitler, deixem-me ser Hitler vezes dez".
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"Fatídico" 2008
Em 2008, Mugabe perdeu mesmo a maioria no Parlamento, tendo o Movimento para a Mudança Democrática (MDM) de Morgan Tsvangiari conseguido um maior número de lugares. As eleições ficaram marcadas pelo elevado número de mortes em consequência de confrontos. O ano de 2008 ficou ainda marcado pela inflação, que atingiu valores recorde, e pela epidemia de cólera que matou milhares de zimbabueanos.
Foto: dpa
Aniversários excêntricos
Do percurso do vilão não se esquecem também as famosas festas de aniversário. Enquanto grande parte do seu povo vivia na miséria, Mugabe exibia a sua excentricidade. No seu 93º aniversário, comemorado este ano, estima-se que Mugabe tenha gasto cerca de 1,9 milhões de euros numa festa que contou com cem mil convidados. Na mesma altura, cinco milhões de zimbabueanos dependem de ajuda internacional.
Foto: Getty Images/AFP/J. Njikizana
Grace, a não sucessora
Em 2015, começa a falar-se da possibilidade da primeira-dama, Grace - segunda mulher de Mugabe, 40 anos mais nova, e que já mantinha um caso com o Presidente enquanto era sua secretária - poder ser a sua sucessora. O que intensificou os conflitos dentro do ZANU-PF. Emmerson Mnangagwa, o vice de Mugabe, foi humilhado e demitido de funções e fugiu do país após um braço-de-ferro com Grace Mugabe.
Foto: Reuters/Philimon Bulawayo
15 de novembro de 2017 - o início do fim
Na festa dos seus 93 anos, em fevereiro, Mugabe nem sonhava o que 2017 tinha reservado para si. Em outubro, foi eleito embaixador da boa vontade da Organização Mundial da Saúde, mas uma chuva de críticas internacionais fez com que a nomeação fosse retirada. Cerca de um mês depois, militares próximos de Mnangagwa protagonizavam um aparente golpe de Estado que culminou com a detenção do Presidente.
Foto: Reuters/Zimpapers/J. Nyadzayo
Adeus Mugabe
A 19 de novembro esperava-se que Mugabe anunciasse a sua demissão depois de ter sido deposto da liderança do seu partido. Mas, num discurso à nação, rejeitou que a intervenção militar no país tenha sido "um desafio" à sua "autoridade como chefe de Estado". Dois dias mais tarde, foi anunciada a sua renúncia, ao mesmo tempo que o Parlamento debatia uma moção de censura contra o agora ex-governante.