Golpe em Bissau: Militares detidos em "péssimas condições"
Iancuba Dansó (Bissau)
11 de agosto de 2022
Advogado dos militares acusados de tentativa de golpe de Estado na Guiné-Bissau denuncia condições em que vivem na cadeia e acusa autoridades de recusarem acatar decisões judiciais que ordenaram a libertação dos detidos.
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Em conferência de imprensa, esta quinta-feira (11.08), em Bissau, Marcelino Intupe, que representa 18 das várias dezenas de detidos há seis meses no âmbito das investigações sobre a tentativa de golpe de Estado do passado 1 de fevereiro, criticou o tratamento que está a ser dado aos seus constituintes.
O advogado denunciou que os militares estão doentes e detidos em celas expostas à chuva, facto que disse ser do conhecimento das autoridades. "Os sequestradores sabem muito bem que as celas não estão em melhores condições. Há riscos e quem lá for vai, de facto, constatar esta situação", garante.
O advogado citou ainda um despacho recente da juíza que se pronunciou sobre o caso "e absolveu totalmente das acusações" os detidos "e já não há julgamento dessas pessoas". Porém, "ninguém cumpriu" essa decisão, critica Intupe, acrescentando que "a juíza intimou para que as pessoas sejam libertadas, mas ninguém cumpriu".
Marcelino Intupe denunciou também que o procurador-geral da República, Bacar Biai, estará a ser pressionado, sem no entanto dizer por quem, para transferir o processo dos seus constituintes para o Tribunal Militar, de forma a serem condenados.
Tentativa de golpe de Estado na Guiné-Bissau
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Críticas às organizações internacionais
Por outro lado, o advogado criticou o silêncio das organizações internacionais sobre o caso. "A União Europeia (UE) não se pronunciou sobre esta situação. É verdade que a Guiné-Bissau é um Estado independente e há uma questão interna que deve ser resolvida por guineenses e pelos órgãos do Estado. Mas a UE podia pronunciar sobre o não cumprimento das decisões judiciais e as Nações Unidas também deviam pronunciar-se, através da sua comissão dos direitos humanos, sobre o não cumprimento das decisões judiciais", defendeu.
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A DW África contactou uma fonte do Ministério do Interior, que pediu anonimato, e disse que os detidos não estão sob a alçada deste órgão, mas sim do Estado Maior General das Forças Armadas. A fonte explicou que o envolvimento do Ministério do Interior se limita a ter colocado à disposição as celas da Segunda Esquadra sob o seu controlo.
"Perante os riscos elevados de vida que alguns detidos em conexão com o caso 1 de fevereiro se encontra neste momento, em consequência da dramática situação nos diversos centros de detenções, exortamos mais uma vez o governo e demais instituições do Estado, no sentido de cumprirem rigorosamente as decisões judiciais", insiste.
Bubacar Turé disse ainda que o caso da tentativa de golpe de Estado deve ser esclarecido, mas defendeu que o combate à impunidade "não é sinónimo de vingança".
Em 1 de fevereiro deste ano, um grupo de pessoas armadas atacou o Palácio do Governo, em Bissau, onde decorria a reunião extraordinária do Conselho de Ministros. O Governo considerou o ato uma "tentativa de golpe e de decapitação do Estado". Morreram 11 pessoas, na sua maioria elementos da Guarda Presidencial.
Golpes de Estado em África: Um mal endémico
Em menos de um ano, o continente africano viveu oito golpes e tentativas de golpe de Estado. A maior parte aconteceu na África Ocidental, região do continente mais fértil para as intentonas. Não há fator surpresa.
Foto: Radio Television Guineenne/AP Photo/picture alliance
Níger: Tentativa de golpe fracassada
A tentativa de golpe de Estado aconteceu a 31 de março de 2021, dois dias antes da tomada de posse do Presidente Mohamed Bazoum. Na capital, Niamey, foram detidos alguns membros do Exército por detrás da tentativa. O suposto líder do golpe é um oficial da Força Aérea encarregado da segurança na base aérea de Niamey. O Níger já sofreu 4 golpes de Estado: o último, em 2010, derrubou Mamadou Tandja.
Foto: Bernd von Jutrczenka/dpa/picture alliance
Chade: Uma sucessão com sabor a golpe de Estado
Pouco depois do marechal Idriss Déby ter vencido as presidenciais, morreu em combate contra rebeldes. A 21 de abril de 2021, o seu filho, o general Mahamat Déby, assumiu a liderança do país, sem eleições, nomeando 15 generais para o Conselho Militar de Transição, entre eles familiares seus. Idriss governou o Chade por mais de 30 anos com mão de ferro e o filho dá sinais de lhe seguir os passos.
Foto: Christophe Petit Tesson/REUTERS
Mali: Um golpe entre promessas de eleições
O coronel Assimi Goita foi quem derrubou Bah Ndaw da Presidência do Mali a 24 de maio de 2021. Justifica que assim procedeu porque tentava "sabotar" a transição no país. Mas Goita prometeu eleições para 2022 e falou em "compromisso infalível" das Forças Armadas na defesa da segurança do país. Pouco depois, o Tribunal Constitucional declarou o coronel Presidente da transição.
Foto: Xinhua/imago images
Tunísia: Um golpe de Estado sem recurso a armas
No dia 25 de julho de 2021, Kais Saied demitiu o primeiro ministro, seu rival, Hichem Mechichi, e suspendeu o Parlamento por 30 dias, o que foi considerado golpe de Estado pela oposição, que convocou manifestações em nome da democracia. Saied também levantou a imunidade dos parlamentares e garantiu que as decisões foram tomadas dentro da lei. Nas ruas de Tunes, teve o apoio da população.
Foto: Fethi Belaid/AFP/Getty Images
Guiné-Conacri: Um golpista da confiança do Presidente
O dia 5 de setembro de 2021 começou com tiros em Conacri, uma capital que foi dominada por militares. O Presidente Alpha Condé foi deposto e preso pelo coronel Mamady Doumbouya - que dissolveu a Constituição e as instituições. O golpista traiu Condé, que o tinha em grande estima e confiança. Doumboya tinha demasiado poder e não se entendia com a liderança da ala castrense.
Foto: Radio Television Guineenne via AP/picture alliance
Sudão: Golpe compromete transição governativa
A 25 de outubro de 2021, os golpistas começaram por prender o primeiro ministro, Abdalla Hamdok, e outros altos quadros do Governo para depois fazerem a clássica tomada da principal emissora. No comando estava o general Abdel Fattah al-Burhan, que dissolveu o Conselho Soberano. Desde então, o Sudão vive manifestações violentas, com a polícia a ser acusada de uso excessivo de força.
Foto: Mahmoud Hjaj/AA/picture alliance
Burkina Faso: Golpe de Estado festejado
A turbulência marcou o começo do ano, mas a intentona foi celebrada em grande nas ruas da capital, Ouagadougou. A 23 de janeiro de 2022, o tenente-coronel Paul Damiba liderou o golpe de Estado ao lado do Exército. Ao Presidente Roch Kaboré não restou outra alternativa se não demitir-se. Tal como os golpistas de outros países, comprometem-se a voltar à ordem constitucional após consultas.
Foto: Facebook/Präsidentschaft von Burkina Faso
Guiné-Bissau: Intentona ou "inventona"?
Tiros, alvoroço, mortos e feridos no Palácio do Governo marcaram o dia 1 de fevereiro de 2022 em Bissau. O Presidente Umaro Sissoco Embaló diz que os golpistas queriam matá-lo e ao primeiro ministro, Nuno Nabiam. Houve algumas detenções, mas até hoje não se conhece o líder golpista. No país, acredita-se que tudo não passou de um "teatro" orquestrado pelo próprio Presidente, amplamente contestado.