Protestar em Angola é seguro? Ativistas duvidam
29 de janeiro de 2025A sociedade civil angolana acusa o Governo do Presidente João Lourenço de ter apresentado, em Genebra, um relatório sobre os Direitos Humanos que não corresponde à realidade do país.
Angola está entre os 14 Estados avaliados pelo Grupo de Trabalho da Revisão Periódica Universal do Conselho dos Direitos Humanos das Nações Unidas. Durante a 4.ª revisão periódica, realizada na semana passada em Genebra, o ministro Marcy Lopes defendeu que nenhum cidadão é preso de forma arbitrária por protestar, afirmando que a liberdade de expressão é um direito garantido pela Constituição.
"Nenhum cidadão é punido, detido, preso, julgado ou condenado por livremente se manifestar. As pessoas que são detidas são aquelas que, no exercício do direito de manifestação, violam regras públicas, atentam contra os direitos de terceiros, praticam atos de vandalismo e atacam outras pessoas", declarou o ministro.
Estas afirmações foram feitas poucas semanas depois de o Estado angolano ter libertado, através de um indulto presidencial, quatro ativistas presos por ultraje e injúrias ao Presidente da República durante uma manifestação em Luanda, em 2023. Um dos ativistas indultados, Hermenegildo André, conhecido como "Gildo das Ruas", manifestou a sua indignação com as palavras do ministro.
"Os dirigentes aqui têm uma posição e, quando vão para esses eventos, mostram uma Angola que está distante da nossa realidade. Penso que existem dois Ministérios: um conhecido por nós, que é o Ministério da Injustiça e dos Direitos Humanos, e outro que é o Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos, que apresenta um quadro como se pertencêssemos a um país do primeiro mundo", afirmou o ativista.
Contrariando as palavras do ministro, "Gildo das Ruas" assegura que, na prática, não são permitidos protestos contra o Governo em Angola, apesar de a Constituição prever o direito à liberdade de manifestação. Segundo ele, todas as manifestações antigovernamentais são reprimidas logo no momento da concentração dos manifestantes.
Liberdade ou repressão?
O ativista denuncia ainda um desrespeito generalizado pelos Direitos Humanos no país. "Continuamos a assistir a agressões policiais contra as zungueiras, com a polícia a matar cidadãos em plena luz do dia, a prisões arbitrárias e a pessoas a comerem nos contentores do lixo. Em novembro, vamos completar 50 anos de independência e, em abril, 23 anos de paz. Ainda assim, fervemos água para beber", lamentou.
Pedro Gonga, outro defensor dos Direitos Humanos em Angola, lembra que as denúncias de abusos são públicas e frequentemente documentadas por organizações internacionais como a Amnistia Internacional e a Human Rights Watch.
"O ministro foi infeliz na sua abordagem. O caso mais recente que contraria claramente essas alegações é aprisão dos quatro jovens ativistas, que foram considerados presos políticos e recentemente libertados pelo indulto presidencial, após um ano e cinco meses de prisão, por terem participado numa manifestação pacífica. No entanto, a Constituição da República consagra esse direito aos seus cidadãos", sublinha Gonga.
O ativista lamenta ainda que os responsáveis pelas violações dos direitos dos cidadãos continuem impunes e critica a postura do Governo em Genebra, que, segundo ele, demonstra uma resistência em melhorar a situação dos Direitos Humanos no país.
"Para que Angola avance ou progrida em matéria de Direitos Humanos, é imprescindível que as autoridades reconheçam os problemas, abracem os passos para o diálogo com a sociedade civil e implementem reformas que protejam os direitos e liberdades fundamentais de todos os cidadãos", conclui Pedro Gonga.