Moçambique procura reduzir sobrelotação das cadeias
Bernardo Jequete (Manica)
2 de setembro de 2022
O maior problema é a falta de investimento no setor da Justiça. Medidas para solucionar o problema incluem a liberdade condicional para reclusos e construir mais penitenciárias.
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Muitas prisões de Moçambique estão sobrelotadas. Uma delas é a Penitenciária Regional na província central de Manica, também conhecida como "Cabeça do Velho". A população da penitenciária está estimada em mais de 3.200 reclusos, o que representa quase o dobro da capacidade instalada.
Como descongestionar as prisões de Moçambique é um dos grandes desafios a que a ministra da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos, Helena Kida, tem vindo a tentar dar resposta.
Prisões de Moçambique estão sobrelotadas
Kida disse que os órgãos de administração da Justiça estão a conceder liberdade condicional aos arguidos condenados que já cumpriram metade da pena, com vista a resolver o problema da sobrelotação.
Sem avançar datas, Helena Kinda referiu que outra alternativa encontrada pelo Governo é a expansão da rede dos estabelecimentos penitenciários a nível dos distritos, pois nem todos possuem estabelecimentos prisionais.
Referindo-se à província de Manica, a governante informou que os estabelecimentos prisionais detêm mais de mil reclusos, um número muito além das suas capacidades. "Já começámos com trabalhos para descongestionar. O nosso objetivo é retirar quem já não tem que estar cá dentro. Mas percebemos que a solução ideal passa necessáriamente pela expansão da rede dos estabelecimentos penitenciários", disse Kinda.
O dia a dia dos reclusos de Manica
A Penitenciária Regional Centro, na província moçambicana de Manica, é temida por quem passa por aqui. No entanto, os reclusos aprendem vários ofícios para facilitar a sua integração na sociedade após cumprirem as penas.
Foto: DW/Bernardo Jequete
Estabelecimento exemplar
A Penitenciária Regional Centro de Manica, também conhecida por "Cabeça do Velho", é considerada uma das melhores do país. E é temida por quem passa por aqui. Tentativas de fuga não têm sido bem sucedidas devido ao forte esquema de segurança. Também a disciplina é uma das regras entre os reclusos. Os "frutos amargos do desacato" recaem sobre os próprios infratores, contam.
Foto: DW/Bernardo Jequete
Tempo para estudar
Os reclusos têm direito a continuaros seus estudos na prisão. E para quem nunca frequentou uma sala de aula há programas de alfabetização e educação de adultos. A oferta vai desde a alfabetização até ao nível básico do primeiro ciclo. Alguns presidiários contam que, ao serem presos, tinham apenas a 5ª ou a 6ª classe. Agora, muitos deles já concluíram a 10ª classe.
Foto: DW/Bernardo Jequete
Aprender para empreender
A penitenciária promove diversos cursos de curta duração. O objectivo é passar conhecimentos sólidos para que, em liberdade, os detidos possam integrar-se na sociedade e não voltem a cometer outros crimes.
Foto: DW/Bernardo Jequete
A arte da cestaria
Os trabalhos de cestaria e tapeçaria são os mais visíveis na cadeia de Manica. Em pouco tempo, os jovens aprendem rapidamente a fazer ou trançar chapéus, cestos, tapetes e outras peças. Os reclusos que beneficiaram dos cursos profissionalizantes costumam ter bastante trabalho para se ocupar.
Foto: DW/Bernardo Jequete
Trabalho bem feito
Este conjunto de mesa e cadeiras foi produzido pelos reclusos. Os detidos afirmam que estão preparados para enfrentar os desafios do ramo de empreendedorismo, quando forem libertados depois do cumprimento da pena.
Foto: DW/Bernardo Jequete
Viagens garantidas após libertação
O dinheiro conseguido com a venda de móveis e outros produtos serve para custear as despesas de viagem quando os presidiários regressam às suas zonas de origem. O gesto, segundo eles, é bastante gratificante. Antigamente, não tinham como regressar às suas províncias depois do cumprimento da pena.
Foto: DW/Bernardo Jequete
"Somos especialistas"
Os jovens reclusos já se sentem especialistas no ofício da carpintaria. E dizem-se lisonjeados pela oportunidade que lhes foi dada. Garantem que, depois de serem soltos, não vão abandonar a profissão.
Foto: DW/Bernardo Jequete
Bons carpinteiros
Alguns reclusos encaram as capacitações com seriedade. Já existem bons carpinteiros que estão apenas a aguardar a liberdade para prosseguircom a formação. Dizem que, apesar de terem cometido um crime, o Governo sai a ganhar com a prisão. Porque eles constrOem, produzem a comida na machamba e fazem outras atividades em prol da penitenciária.
Foto: DW/Bernardo Jequete
Cozinhar as próprias refeições
Os reclusos também cozinham as suas refeições. Há uma escala a ser seguida na cozinha. Segundo os detidos, a comida fica boa quando é feita por eles. O Estado gasta mais de dois milhões de meticais por mês só para a alimentar os cerca de dois mil reclusos.
Foto: DW/Bernardo Jequete
Refeição especial
Aos doentes, é oferecida uma refeição diferente da que é servida aos restantes reclusos: sopa de esparguete com tomate, óleo, cebola e outros temperos. Para os saudáveis, a comida basta ter "água e sal, não há problemas", conta um dos detidos.
Foto: DW/Bernardo Jequete
Hora de distração
Para além dos trabalhos desenvolvidos na penitenciária, os reclusos também têm direito a momentos de distração - uma forma de respeitar os direitos humanos. No entanto, dizem que se trata de "um refrescamento de memória". Muitos aproveitam a oportunidade para respirar ar puro, tomar banho de sol e até dançar.
Foto: DW/Bernardo Jequete
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Segundo a titular da pasta, outra causa do problema tem a ver com a falta de investimentos no Ministério da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos para construção de mais cadeias com maior capacidade com vista a descongestionar as que estiverem cheias.
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Ministra 'impressionada' com atividades dos reclusos
Kida avançou que o ideal seria que houvesse uma penitenciária onde houvesse um tribunal. "Acreditamos que muitos daqueles que estão a encher os estabelecimentos penitenciários provinciais poderão ser alojados nos estabelecimentos penitenciários distritais”.
A ministra visitou recentemente a Cadeia Regional Centro, onde disse ter ficado impressionada com as atividades desenvolvidas pelos reclusos, como a produção agrícola, a carpintaria, cestaria, tapeçaria e outras. Encorajou ainda os reclusos a continuarem a produzir, bem como a aprenderem um ofício, para facilitar a reintegração nas suas comunidades após o cumprimento da pena. Kida referiu que muitas vezes a opção pela criminalidade é resultado da falta de emprego.
Jurista sugere soluções alternativas
O jurista Nelson Benjamim realça que a superlotação também mina o trabalho de ressocialização dos reclusos pela administração prisional..
Benjamim acrescenta que os tribunais não estão a fazer cumprir as penas alternativas à prisão, pois a maior parte dos reclusos que se encontra nas prisões está a cumprir penas de dois ou três meses. Entende, por isso, que o Governo deve encontrar alternativas à privação da liberdade.