Nampula: Governo satisfeito com investimento chinês na pesca
Sitoi Lutxeque (Nampula)
26 de janeiro de 2019
Chineses já investiram cerca de 87 mil euros, o que permitirá a passagem das atuais 200 toneladas de peixe para as cinco a dez mil, diz governador da província. Críticos lembram que "chineses não respeitam ambiente".
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Duas empresas de capitais chineses - Semi-industrial de Moma e Stonechen Comercial Produtos de Pesca Limitada - estão a fazer investimentos milionários na exploração da atividade pesqueira na costa da província de Nampula, no norte de Moçambique, com vista à exportação para a China.
Só a Stonechen Comercial Produtos de Pesca, cujo licenciamento dá direito à exploração nos distritos de Moma, Angoche e Nacala-Porto, já investiu mais de 100 mil dólares [cerca de 87 mil euros] na aquisição de cinco embarcações e criação de um centro de processamento de pescado.
Chen Jun, um dos representantes da Stonechen Comercial, disse à DW que a sua empresa emprega cerca de mil trabalhadores, na sua maioria, moçambicanos. Garantindo que a empresa poderá processar os pecados a nível local para a exportação, o mesmo representante não detalhou, no entanto, quais as espécies de pescado alvo da atividade da empresa.
"Em Moma, temos uma sala de processamento [de peixe] de grande escala, com capacidade de 1500 toneladas. Temos barcos semi-industriais para pesca. Esses produtos [quando pescados] são levados para Moma para serem processados e depois exportados para a China e países europeus. O remanescente vendemos em Moçambique. Estaremos a pescar apenas peixe'', explicou.
Da pesca artesanal à semi-industrial...
O Governo moçambicano está satisfeito e considera que os investimentos poderão alavancar o setor. Em entrevista à DW, o governador da província de Nampula, Victor Borges, que no final do ano passado inaugurou cinco embarcações da Stonechen Comercial, no distrito de Angoche, afirmou que, com estes novos investimentos chineses, "Nampula pode passar de um patamar que, até 2016, era de 100 a 200 toneladas, na pesca comercial, para cinco a dez mil toneladas nos próximos anos". Números estes apenas referentes ao primeiro investimento, nota Victor Borges, acrescentando que: "temos outro [investimento] de pesca de atum, que está a decorrer em Nacala, também com uma empresa privada. Portanto, Nampula já está a sair da pesca artesanal para a pesca semi-industrial de grande escala'', disse.
Governo e ambientalistas discordam sobre investimento chinês no setor da pesca em Nampula
O chefe do executivo provincial fez saber que os chineses não só irão pescar na costa de Angoche, Moma e Nacala, mas também vão produzir o peixe. "Existe uma área de dois mil hectares, em Moma, para promover a aquacultura, o que é bastante bom para nós. Eles não vão fazer o transbordo em alto mar, vão ter que processar em terra e depois levar ao alto mar para exportar para a China e outros países. Uma parte do pescado vai ficar para consumo interno'', disse.
Ameaças ao ecossistema
No entanto, o investimento chinês na indústria pesqueira não agrada a todos, como é o caso de algumas organizações da sociedade civil, que trabalham na defesa dos recursos naturais e marinhos em Moçambique. Uma delas é a "Solidariedade Moçambique''. O seu diretor, António Mutoua, lembra, em primeiro lugar, que "o arquipélago das ilhas primeiras e segundas, que parte de Pebane (Zambézia) e Angoche (Nampula), foi declarado área de conservação". E nesse sentido, diz que "o que temos vindo a ver é contrário àquilo que, em algum momento, o próprio Governo legislou. Depois da madeira, que já acabou, os chineses não têm como e aderiram ao negócio de pescas'', disse.
António Mutoua chama ainda a atenção para as ameaças desta atividade para o ecossistema e algumas espécies de difícil reprodução, como é o caso dos tubarões."Até hoje, não sabemos que tipo de produtos pesqueiros eles vão pescando. Sabemos que os chineses, a nível mundial, não respeitam o ambiente. Para eles, não há problema em acabar com o tubarão, que em termos de ecossistema é muito rico. E é de difícil reprodução'', disse.
A Solidariedade Moçambique diz que o Governo e as empresas concessionadas não ouviram as populações que dependem do mar, sobretudo os pescadores, para a exploração daquelas áreas. A organização garantiu que brevemente vai reunir-se com os pescadores da região para traçar estratégias em defesa do ambiente marinho na província.
Nampula: População de Angoche insatisfeita com contributos de mineradora chinesa
Contributos dados pela mineradora Haiyu Mozambique Mining Company não são suficientes, diz a população. Problemas relacionados com serviços básicos mantêm-se, não se antevendo melhorias.
Foto: DW/S. Lutxeque
Poucos benefícios para população
As populações de Angoche, considerada a terceira maior da província de Nampula e onde está instalada a mineradora chinesa Haiyu Mozambique Mining Company, continuam, depois de cerca de oito anos depois do início da exploração das areias pesadas, a enfrentar sérios problemas relacionados com serviços básicos, nomeadamente, acesso a água, corrente eléctrica e maus acessos rodoviários.
Foto: DW/S. Lutxeque
Comunidades pobres em zonas ricas
No distrito, as comunidades de Sangache, Murrua e Namue, são exemplo da pobreza extrema que assola esta região de exploração de minérios. As habitações são, maioritariamente, de construção precária, feitas com base em tijolos menos resistentes, paus e folhas de coqueiros.
Foto: DW/S. Lutxeque
Muita produção para pouco retorno
A mineradora chinesa iniciou a exploração das areias pesadas em Sangache, em 2010. E, até à data, a produção continua em alta, apesar da oscilação dos preços no mercado internacional. No entanto, a população diz continuar a não ver o retorno da exportação dos valiosos minerais explorados nas suas terras, como são o ilmenite e o zircão.
Foto: DW/S. Lutxeque
Défice de água potável
A água potável de qualidade e em quantidade, para consumo humano, é um dos problemas que tira o sossego aos milhares de habitantes destas regiões. Nos populosos bairros de Murrua e Namue, por exemplo, existem poucos furos de água potável, apesar de, nos últimos meses, a mineradora ter construído dois poços.
Foto: DW/S. Lutxeque
Degradação de estradas
Outro dos problemas é a degradação das estradas. No interior do distrito de Angoche, assim como nas suas vias de acesso, desde Nampula, as estradas não estão em boas condições. São todas de terraplanagem e, consoante a estação do ano, apresentam poeira, buracos ou lamas. A população queixa-se de falta de sensibilidade da mineradora na resolução deste problema, que também afeta a sua atividade.
Foto: DW/S. Lutxeque
Reabilitação para benefício próprio
Para além de desiludidos com a empresa chinesa, os citadinos sentem-se também enganados. Enquanto a população se queixa das dificuldades provenientes do mau estado da estrada que liga Angoche a Nampula, a mineradora está a reabilitar um troço - inferior a dez quilómetros - que dá acesso ao porto local, de forma de facilitar o transporte dos produtos da sua fábrica ao porto.
Foto: DW/S. Lutxeque
Armazéns cheios
Nos armazéns da Haiyu Mozambique Mining Company, os produtos continuam a entrar e a capacidade de armazenamento revela-se cada vez mais esgotada. Não há espaço no interior do armazém da empresa, localizado no porto de Angoche. É daqui que saem os recursos que são exportados para o mercado internacional.
Foto: DW/S. Lutxeque
Pressão popular
Apesar das promessas, a contribuição das multinacionais para a população tem sido fraca. Os líderes comunitários dizem-se desapontados. À DW, Lopes Vasco, líder comunitário de Angoche, diz que estas empresas "não estão, até agora, a responder às suas obrigações. Não se justifica que as populações continuem pobres enquanto elas fazem muito dinheiro com os nossos recursos".
Foto: DW/S. Lutxeque
Iluminação
Depois de muita pressão por parte dos líderes comunitários, e depois de uma reunião com o governo, a mineradora celebrou, em setembro de 2018, um memorando para a criação de um plano estratégico de responsabilidade social para o período de 2017-2020. A construção desta Rede de Baixa Tensão, que custou cerca de dez milhões de meticais, cerca de 140 mil euros, foi uma das ações acordadas.
Foto: DW/S. Lutxeque
Mais emprego
Desde 2010, quando iniciou a sua atividade em Sangache, a empresa chinesa tem vindo também a apostar na mão-de-obra nacional, em detrimento da estrangeira, tendo já levado dezenas de moçambicanos para formação técnico-profissional na China. Atualmente, a empresa conta com 500 trabalhadores, dos quais apenas 30 são estrangeiros, na sua maioria de nacionalidade chinesa.
Foto: DW/S. Lutxeque
Melhorias na saúde
Além da abertura de alguns furos de água e expansão da corrente elétrica, a mineradora está também a dar o seu contributo ao setor da saúde. No final do ano passado, a Haiyu Mozambique Mining Company comprou uma ambulância equipada para as comunidades de Angoche, avaliada em mais de quatro milhões de meticais, cerca de 56 mil euros.