Três dias de luto pelas vítimas da tragédia de Tete
Lusa | ar
18 de novembro de 2016
Governo moçambicano decretou esta sexta-feira (18.11.) três dias de luto nacional pelas vítimas da explosão de um camião-cisterna na província de Tete, centro do país, e que provocou 56 mortos confirmados e 108 feridos.
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O luto tem início às 00:00 de sábado (19.11.) e prolonga-se até 21 de novembro, informou Mouzinho Saíde, porta-voz do Conselho de Ministros, que esteve reunido na manhã desta sexta-feira em sessão extraordinária em Maputo.
"Durante o período de luto nacional, a bandeira nacional será içada a meia-haste em todo o território nacional e nas missões diplomáticas e consulares de Moçambique", disse aos jornalistas Mouzinho Saíde.
É a segunda vez em menos de dois anos que o Governo decreta luto nacional por causa de uma tragédia na província de Tete, após 75 pessoas terem morrido em Chitima em janeiro de 2015 de envenenamento por uma bebida tradicional quando regressavam de um funeral.
O porta-voz do Conselho de Ministros avançou igualmente que será criada uma comissão de inquérito para investigar a explosão, a ser liderada pelo Ministério da Justiça e integrada pelos ministérios do Interior, Administração Estatal e Função Pública e Energia e Recursos Minerais.
O balanço apresentado esta sexta-feira pelo Governo indica a existência de 56 mortos confirmados e 108 feridos, abaixo das 73 vítimas mortais avançadas na noite de quinta-feira pela Rádio Moçambique, citando o Governo Provincial de Tete.
Segundo a versão do Governo, o camião desviou-se da sua rota para a localidade de Caphiridzange, no distrito de Moatize, onde ocorreu a tragédia, após o motorista ter abandonado o veículo em sobreaquecimento.
Dezenas de pessoas, de acordo com o Governo, tentavam retirar o combustível do camião quando foram surpreendidas por uma explosão.
PR moçambicano quer flexibilidade na assistência às populações atingidas pela tragédia de TeteO Presidente moçambicano lamentou hoje a tragédia ocorrida com a explosão de um camião-cisterna na província de Tete na quinta-feira, provocando dezenas de mortos, e disse que é preciso flexibilidade das autoridades na assistência às vítimas.
"A tragédia bateu à nossa porta uma vez mais, através da província de Tete. O importante agora é ser flexível na assistência às populações e tomar medidas", afirmou Filipe Nyusi à entrada de uma sessão extraordinária do Conselho de Ministros em Maputo e que tem como ponto único o desastre ocorrido em Caphiridzange, distrito de Moatize, no centro do país.
Governo moçambicano cria comissão de inquérito para tragédia de Tete
O Conselho de Ministros extraordinário ocorreu em paralelo com o envio para o local da tragédia de uma equipa governamental, dirigida pela ministra da Administração Estatal e Função Pública, Carmelita Namashulua, acompanhada pelo ministro dos Transportes e Comunicações, Carlos Mesquita, pelo vice-ministro da Saúde, Mouzinho Saíde, e pelo diretor do Instituto Nacional de Gestão de Calamidades, Osvaldo Machatine.
Faces de Tete e do carvão de Moçambique
A vida mudou na província de Tete desde a chegada de empresas multinacionais para explorarem o carvão. Os ventos da mudança trouxeram, para alguns, oportunidades para melhorar de vida; para outros, novas preocupações.
Foto: DW/Marta Barroso
Coque, o trabalhador
Coque tem 28 anos. Trabalha há quatro anos na empresa mineira britânica Beacon Hill. Lá, amarra lonas nos camiões que transportam o carvão até ao vizinho Malawi. Tal como muitos jovens na região, dantes Coque fabricava tijolos que vendia no mercado local. Mas hoje, diz, vive melhor. Por camião recebe 800 meticais, cerca de 20 euros, que divide com o colega que estiver com ele no turno.
Foto: Marta Barroso
Paulo, o diretor de operações da Vale
Apesar dos enormes incentivos fiscais de que gozam as empresas dos megaprojetos em Moçambique, como a brasileira Vale, Paulo Horta diz que um projeto de mineração como o de Moatize gera uma cadeia produtiva tão grande que a população local beneficia em grande medida com a sua vinda para Tete: através da criação de outras empresas, serviços, tributos gerados por terceiros e criação de empregos.
Foto: DW/Marta Barroso
Gomes António, vítima de maus tratos
Gomes António Sopa foi espancado e detido pela polícia na sequência da manifestação de 10 de janeiro de 2012, quando os habitantes de Cateme bloquearam a passagem do comboio que transportava carvão das minas até ao porto da cidade da Beira. Muitas das promessas feitas pela Vale, responsável pelo reassentamento de centenas de famílias, continuam por cumprir. Ainda hoje, Gomes António sente dores.
Foto: Marta Barroso
Duzéria, a curandeira
Os habitantes do Centro de Reassentamento de 25 de Setembro, no distrito de Moatize, queixam-se de que muitos aspetos culturais não foram respeitados durante o processo de reassentamento pelas empresas mineiras. A curandeira do bairro, por exemplo, diz que no planeamento do complexo não se teve em conta a construção de uma casa para o seu espírito.
Foto: Marta Barroso
Lória, a rainha
Provavelmente Lória Macanjo e a sua comunidade deverão ser reassentadas brevemente: a multinacional Rio Tinto está já a operar um mina de carvão em Benga, perto da sua aldeia, Capanga. Também aqui, debaixo da terra que herdou do pai, a empresa mineira descobriu carvão. Mas a rainha sabe do destino dos que já se mudaram e recusa-se a deixar a sua casa.
Foto: DW/Marta Barroso
Olivia, a cabeleireira
Olivia (esq.) tem 29 anos e veio em 2008 do seu país, o Zimbabué, fugindo à crise financeira que lá se vive. Tete é agora a terra das grandes oportunidades, tinham-lhe dito. Hoje, é cabeleireira no Mercado Primeiro de Maio e, tal como a amiga Faith (dir.) faz trabalhos de manicure. Diz que, por dia, consegue 500 a 1000 meticais, entre 15 e 25 euros. Com esse dinheiro consegue sustentar-se.
Foto: DW/Marta Barroso
Guta, o empresário
Ao todo, Guta emprega 130 homens nas áreas de carpintaria e construção civil na cidade de Tete. Diz que desde a chegada das grandes empresas à região não sentiu grandes alterações no seu negócio. Os projetos de mineração requerem quantidades às quais não consegue responder. Uma vez, conta, a Vale pediu que fornecesse, juntamente com outra carpintaria da cidade, 5000 portas em 60 dias.
Foto: DW/Marta Barroso
Canelo, o vendedor de amendoins
Canelo diz que tem 11 anos. E diz também que frequenta a segunda classe. Todas as tardes vende amendoins no centro de Tete. "Para ajudar a mãe que não tem trabalho." O pai também está desempregado. Canelo é uma de muitas crianças que vendem amendoins na cidade. Um saco pequeno fica por dois meticais, cerca de cinco cêntimos de euro, o maior custa cinco meticais, treze cêntimos de euro.
Foto: DW/Marta Barroso
Catequeta, o ativista
Manuel Catequeta mudou-se para Tete em 2001. O ativista dos direitos humanos sabe o que custa viver com a subida constante do custo de vida. O seu salário não lhe permite luxos. A sala de sua casa "de dia é sala, de noite vira quarto". Mas mudar de casa, para já, está fora de questão. Hoje em dia, uma boa casa na capital provincial passa dos 5.000 dólares, cerca de 4.000 euros, por mês.
Foto: DW/Marta Barroso
Júlio, o otimista
O músico Júlio Calengo vê oportunidades de negócio, agora que em Tete há tantas empresas novas. O seu objetivo é, em breve, montar uma empresa de limpeza: tanto nos escritórios das empresas mineiras como nos das firmas que entretanto apareceram na cidade. Interessados não vão faltar, diz Júlio. O que é preciso é ter criatividade e, claro, dinheiro.