Governo moçambicano quer discutir descentralização
Leonel Matias (Maputo)
14 de dezembro de 2016
O primeiro-ministro Carlos Agostinho do Rosário foi, esta quarta-feira (14.12), ao Parlamento responder às perguntas dos deputados.
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O calar imediato das armas é a prioridade do Governo moçambicano, afirmou o primeiro-ministro Carlos Agostinho do Rosário.
Do Rosário disse ainda que o executivo é a favor de uma maior celeridade nas negociações em torno do pacote legislativo sobre o processo de descentralização a nível da Comissão Mista entre o Governo e a RENAMO (Resistência Nacional Moçambicana), o principal partido da oposição.
Foi assim que o primeiro-ministro respondeu a uma pergunta no Parlamento sobre os esforços em curso com vista ao restabelecimento da paz no país.
Questionado sobre as medidas tomadas na sequência da denúncia de um alegado caso de corrupção na aquisição de duas aeronaves da empresa brasileira Embraer pelas Linhas Aéreas de Moçambique, Carlos Agostinho do Rosário garantiu que "está em curso a respetiva investigação para o esclarecimento do assunto".
A Procuradoria-Geral da República abriu já um processo, através do Gabinete de Combate à Corrupção. "Encorajamos os órgãos da administração da justiça a continuarem o seu trabalho no âmbito da prevenção e combate à corrupção", acrescentou o primeiro-ministro de Moçambique.
Resultados da auditoria só em fevereiro
Os deputados quiseram saber igualmente quais são os termos de referência para o inquérito internacional às dívidas contraídas por três empresas (Empresa Moçambicana de Atum, Proindicus e Mozambique Asset Management) com garantias do Estado e sem o conhecimento do Parlamento e dos parceiros internacionais.
O primeiro-ministro disse que o inquérito está a ser realizado por uma empresa internacional, denominada Kroll, que deverá apresentar os resultados em fevereiro próximo.
Carlos Agostinho do Rosário explicou, no Parlamento, que a auditoria tem como objectivo fornecer uma análise dos contratos de financiamento, dos fundos obtidos, das aquisições efetuadas pelas três empresas, bem como a identificação e análise de eventuais irregularidades na administração e utilização dos fundos. Os empréstimos contraídos sem o aval do Parlamento e dos parceiros internacionais estão avaliados em cerca de 2,2 mil milhões de dólares.
"Em respeito estrito à Constituição da República no que tange à separação de poderes, o nosso Governo não pode nem pretende imiscuir-se no trabalho em curso ao nível da Procuradoria-Geral da República", afirmou o primeiro-ministro.
Relativamente a uma queixa da oposição de que as autarquias por si administradas não estão a beneficiar do processo de transferência de funções e competências da gestão dos serviços primários e de saúde, Carlos Agostinho do Rosário reiterou a posição do Governo: essa transferência deve ser feita observando a existência local de capacidades técnicas e organizativas.
A bancada do partido no poder, Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), mostrou-se satisfeita com as respostas do Governo. Já a oposição fez uma apreciação negativa. A sessão de perguntas ao Governo prossegue na quinta feira (15.12).
Voltar a ganhar a confiança do FMI será difícil, admite ministro
Num outro desenvolvimento, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Oldemiro Baloi, encorajou, esta quarta-feira (14.12), os parceiros internacionais a continuarem a trabalhar com Moçambique com vista à retoma plena dos fluxos financeiros.
Baloi reagia aos resultados da visita que uma missão do Fundo Monetário Internacional (FMI) concluiu na segunda-feira (12.12) ao país. A visita tinha como objectivo iniciar as negociações para a retoma da ajuda do FMI a Moçambique, que se encontra suspensa na sequência da descoberta de dívidas não declaradas pelo Governo.
"Houve várias sessões de trabalho e, como já prevíamos, a retoma de confiança há-de ser um processo difícil, complexo, muito exigente, mas estamos determinados a seguir por esse caminho", afirmou Oldemiro Baloi.
O Fundo Monetário Internacional advertiu, na terça-feira (13.12), que Moçambique vai precisar de mais medidas de ajuste macroeconómico em 2017. Há trabalho a fazer em relação à contenção de salários, eliminação gradual dos subsídios gerais aos preços, redução de isenções fiscais e fortalecimento da gestão da receita, salientou em comunicado a missão do FMI que terminou a visita a Maputo. As negociações entre as partes serão retomadas no primeiro trimestre de 2017.
“A Palavra e o Gesto” de Samora Machel
Na Fundação Mário Soares, em Lisboa, estão expostas as fotografias de Samora Moisés Machel, líder da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO). As imagens são do fotógrafo moçambicano Kok Nam (1939-2012).
Foto: Fundação Mário Soares/Estúdio Kok Nam
Dos primeiros retratos do Presidente
O conceituado fotojornalista moçambicano, Kok Nam, registou as imagens e os gestos que tornaram lendária a figura e o carisma do primeiro Presidente da República de Moçambique. Machel foi Presidente de 25 de junho de 1975 a 19 de outubro de 1986.
Os registos fiéis de Kok Nam
A exposição, inaugurada no dia 24 de novembro, abre com esta imagem de 1985 em que o Presidente moçambicano falava à população. No verso Kok Nam escreveu “The maestro of the mass rally” (O maestro do comício de massas). Após a independência, em 1975, com a fuga generalizada dos quadros brancos, Machel lançou programas de reorganização económica, com o apoio dos países socialistas.
Foto: Fundação Mário Soares/Estúdio Kok Nam
Graça Machel: primeira-dama
Em 1976, casa com Graça Simbine, que entrara em 1969 para a organização clandestina da FRELIMO. Além de primeira-dama, Graça Machel foi ministra da Educação até 1989. Uma das figuras mais conhecidas da História africana, Graça Machel é a única mulher que foi primeira-dama de dois países. Depois da morte de Samora, casou com Nelson Mandela, primeiro Presidente da África do Sul do pós-apartheid.
Foto: Fundação Mário Soares/Estúdio Kok Nam
Político frontal e didático
Frontal, direto, seguro de si e desafiador no discurso à população: esta foto de 1983 captou um dos gestos típicos do político. Samora convencia pela simplicidade com que abordava os assuntos mais complexos do país e dos moçambicanos. Foi assim que conquistou a adesão das populações às suas mensagens e doutrina.
Foto: Fundação Mário Soares/Estúdio Kok Nam
A mobilização dos jovens
Nascido a 29 de setembro de 1933, em Xilambene, na província de Gaza, Machel viria a assumir-se como um combatente pela liberdade. O seu objetivo era dar continuidade à luta iniciada pelo seu antecessor, Eduardo Mondlane, assassinado em fevereiro de 1969, e que fundou a FRELIMO em junho de 1962. Nesta foto, Machel dirige-se aos jovens militares na base de Nachingwea (1974).
Foto: Fundação Mário Soares/Estúdio Kok Nam
Unir todos os moçambicanos
Conversa com uma cidadã moçambicana (1983). Samora sabia escutar a voz do povo. Das suas frases, esta proferida em setembro 1973 expressa bem uma das suas maiores preocupações: "Unir todos os moçambicanos, para além das tradições e línguas diversas, requer que na nossa consciência morra a tribo para que nasça a Nação.”
Foto: Fundação Mário Soares/Estúdio Kok Nam
Capacidade de diálogo
A unidade da Nação ainda hoje é uma prioridade defendida pela FRELIMO, no poder desde 1975. Samora afirmou que "O povo não é um conjunto de raças. É um conjunto de homens iguais". Perante o olhar atento de populares e da imprensa, o líder conversa com uma senhora, dando provas da sua capacidade de diálogo no período de transição entre a dominação colonial e a independência de Moçambique.
Foto: Fundação Mário Soares/Estúdio Kok Nam
Atenção à saúde dos moçambicanos
Samora Machel em visita a uma unidade hospitalar moçambicana em 1983. Machel dizia que o doente era sagrado para o hospital: "Um enfermeiro, um servente, um médico, não conhecem a vingança na sua missão. O pessoal médico não discrimina doentes", dizia. Gostava de dar orientações em todos os setores e momentos da vida moçambicana.
Foto: Fundação Mário Soares/Estúdio Kok Nam
A ligação ao bloco soviético
Samora Machel tratou sempre de privilegiar a relação com o bloco socialista, que apoiou a luta de libertação das antigas colónias portuguesas. Kok Nam registou o Presidente à partida para uma visita à então União Soviética. Esta desempenhou um papel relevante nos chamados países da “Linha da Frente” de luta contra o regime do apartheid da África do Sul.
Foto: Fundação Mário Soares/Estúdio Kok Nam
Morte em Mbuzini
Samora Machel morreu em 19 de outubro de 1986, quando o avião em que seguia se despenhou em Mbuzini, na vizinha África do Sul, na fronteira com Moçambique. Regressava a Maputo vindo de uma cimeira na Zâmbia, com os presidentes de Angola, Eduardo dos Santos, e do Zaire, Mobuto Sese Seko, entre outros. A exposição em Lisboa assinala os 30 anos da sua morte.