Governador de Luanda aproveitou a visita do Presidente de Angola para alertar sobre a insuficiência da rede de água da província. Chefe de Estado admite "diálogo contínuo" com o Governo regional.
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Luanda tem mais de oito milhões de habitantes e é a província angolana com maior densidade populacional. No entanto, a população continua a depender de cisternas para ter acesso a água potável. O dilema foi apresentado ao Presidente da República, João Lourenço, na quarta-feira (18.12) no âmbito de um périplo do Governo por instituições públicas e privadas daquela província angolana.
Segundo o governador da capital, Luther Rescova, apesar de algumas melhorias, o atual nível de fornecimento de água potável, 500 mil metros cúbicos/dia, continua aquém das necessidades da população, que é mais de metade da atual capacidade. "A província precisa de pelo menos mais de um milhão de metros cúbicos para atender à demanda das populações, uma vez que grande parte consome água de cisternas", afirmou o responsável na abertura de uma reunião com o Presidente angolano, João Lourenço.
O chefe de Estado reuniu-se com os membros do Governo da província de Luanda no âmbito de uma visita de trabalho de dois dias à capital do país, estando ainda previsto para esta quinta-feira (19.12) uma reunião do Conselho de Auscultação e Concertação Social.
O Governo angolano admitiu a necessidade de "duplicar significativamente" o fornecimento de água potável em Luanda, afirmando que estão em falta dois novos sistemas de abastecimento. "É preciso duplicar essa capacidade, que se traduz em mais 500 mil metros cúbicos. Para isso faz falta que sejam iniciadas as obras de construção dos dois novos sistemas de abastecimento do Bita e o Quilonga", afirmou o ministro da Energia e Águas angolano, João Baptista Borges, aos jornalistas.
Vários problemas assolam a província
O Presidente angolano considerou que a situação da segurança pública em Luanda "melhorou" e que há "diálogo contínuo" com os membros do Conselho de Auscultação e Concertação Social da capital angolana para a resolução dos problemas da província.
A condição das infraestruturas, a mobilidade e reabilitação das vias de acesso, o fraco acesso à saúde e educação, bem como os níveis de criminalidade foram algumas das inquietações apresentadas no encontro do Presidente com líderes religiosos e tradicionais, jovens, classe empresarial e sindicatos.
O governador de Luanda, Luther Rescova, também lamentou os "conflitos de competências" na gestão das estradas nacionais. O responsável referiu que a capital angolana conta com seis entidades que emitem títulos de direito de superfície, surgindo daí "vários conflitos". "Isto significa certamente criar confusão e esses gabinetes, muitos deles, emitem títulos de direito de superfície, concedem terras, fazem loteamentos, desalojam população, mas sempre que há um problema o nome do governo provincial é envolvido", afirmou.
O governador de Luanda apontou também a necessidade de acabar com os conflitos de competência na gestão das estradas nacionais, referindo que a situação está a "condicionar a recuperação e reabilitação" de estradas por parte das administrações municipais.
A necessidade da recuperação e reabilitação de vias estruturantes da capital angolana foram igualmente sublinhadas pelo governante, que se manifestou também preocupado com a progressão de ravinas em alguns municípios e distritos. Segundo Luther Rescova, o "maior problema infraestrutural" de Luanda é a drenagem das águas residuais e pluviais, uma vez que, explicou, a província cresceu e "não foi acompanhada pelas infraestruturas", defendendo "ações com caráter de continuidade".
População de Luanda sem acesso a água potável
"A rede viária é um dos maiores problemas de Luanda, mas estamos satisfeitos porque ao nível do PIIM (Plano Integrado de Intervenção nos Municípios) conseguimos inscrever um número de estradas considerável", assinalou.
O ministro da Construção e Obras Públicas, Manuel Tavares de Almeida, admitiu que os contratos para a manutenção de alguns troços - como a estrada que liga Viana ao Calemba 2 -exigem muitos recursos financeiros. Como solução, o Governo decidiu enquadrar os referidos projetos no PIIM.
"O que encontrámos de solução neste momento é enquadrá-lo no PIIM e com os recursos do PIIM vamos adotar uma solução que vai assegurar provisoriamente o tráfego normal entre Viana e Camama. Posteriormente quando tivermos os recursos assegurados para o projeto definitivo, então o retomaremos", garantiu o ministro Manuel Tavares de Almeida.
Já a ministra da Saúde, Sílvia Lutucuta, garantiu que os municípios de Cacuaco e Viana, os mais populosos da capital do país, vão ganhar novos hospitais de referência.
Água potável em Angola, privilégio para poucos
Para quem tem água encanada em casa, a vida sem ela é inimaginável. Esta é, no entanto, a realidade para mais da metade da população angolana. Todos os dias, muitos angolanos fazem uma maratona para obter água.
Foto: DW/C. Vieira
Abastecimento, uma maratona diária
Para quem tem água encanada em casa, a vida sem ela é inimaginável. Esta é, no entanto, a realidade para mais da metade da população angolana, segundo a Universidade Católica de Angola (UCAN). Todos os dias, os angolanos fazem uma maratona que consume uma quantia considerável de tempo e dinheiro para obter água.
Foto: DW/C. Vieira
O dia começa no chafariz púlico
Nas regiões periféricas da capital de Angola, Luanda, o dia começa cedo a caminho do chafariz público. No município de Cazenga, esta é uma cena comum. Mulheres e crianças são as principais responsáveis pelo abstecimento de água das famílias angolanas. O consumo diário é geralmente limitado pela capacidade de aquisição e transporte da água.
Foto: DW/C. Vieira
Preço alto e falta d'água
Segundo um estudo do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), as fontes mais comuns para o abastecimento de água segura em Angola são: chafarizes (16%), furos protegidos (12%) e cacimbas (6%). Em Luanda, um galão de 20 litros de água custa 10 kwanzas no chafariz – o equivalente a 0,10 dólares. As famílias chegam cedo. Mas, muitas vezes, o chafariz está fechado por falha no abastecimento.
Foto: DW/C. Vieira
O sonho de ter água em casa
Aqueles que têm condições constroem tanques para armazenar a água em casa. O custo da obra supera os 1.500 dólares – uma despesa pesada com a qual poucos podem arcar. A água é entregue por um caminhão pipa privado e cada fornecimento de 20 mil litros custa 20 mil kwanzas – o equivalente a 0,20 dólares por 20 litros de água.
Foto: DW/C. Vieira
Água, um bom negócio?
Apesar de custar o dobro do preço pago no chafariz público, o tanque pode se tornar um bom negócio. Muitas pessoas vendem parte de sua água a 50 kwanzas por galão – o equivalente a 0,50 dólares por 20 litros. Uma margem de revenda de 150%. Esta mulher de Luanda compra água de sua vizinha e armazena em tonéis em casa.
Foto: DW/C. Vieira
Situação difícil também nas províncias
A falta de abastecimento de água leva a população a enfrentar muitas dificuldades para o transporte. Mulheres transportam a água até suas casas. Na foto: a cidade do Lobito, na província de Benguela. Além de ter que suportar o peso da bacia cheia, é preciso muito equilíbrio para não deixar a água pelo caminho.
Foto: DW/C. Vieira
Armazenar para garantir o abastecimento
As residências onde há encanamento são um privilégio para poucos angolanos. Ainda assim, não há garantia de que haverá sempre água. O abastecimento falha com frequência. No Lobito, muitos moradores investem em tanques para a armazenagem. Este comporta 3.000 litros de água e é a garantia para uma família de oito pessoas. O investimento foi de 560 dólares.
Foto: DW/C. Vieira
Criatividade para vencer a dificuldade
O transporte da água depende da criatividade e das possibilidades de cada um. Depois de adquirir a água, será preciso prepará-la para o consumo. Apesar da transparência, a água precisa ser tratada ou fervida para ser considerada potável - ou seja, livre de impurezas e que não oferece o risco de se contrair uma doença.
Foto: DW/C. Vieira
Água potável é saúde
A população de Luanda enfrenta muitas dificuldades para o transporte da água. Além disso, muitas crianças morrem de diarreia ou de outras doenças relacionadas com a água e o saneamento em Angola. Em 2006, um surto de cólera afectou mais de 85.000 pessoas e ceifou cerca de 3.000 vidas em 16 das 18 províncias angolanas.
Foto: DW/C. Vieira
Cobertura sanitária pouco abrangente
Segundo a Organização Mundial de Saúde, cerca de 2,6 mil milhões de pessoas no mundo não têm acesso a condições sanitárias adequadas. Na África sub-saariana, a cobertura sanitária abrange apenas 31% da população. Em Angola, apenas cerca de 25% da população têm acesso ao saneamento básico, segundo a Universidade Católica de Angola. Em Luanda, é preciso conviver com esgotos a céu aberto.
Foto: DW/C. Vieira
Saneamento básico para combater doenças
A falta de saneamento básico é um pesadelo também para os moradores do município de Cazenga, em Luanda. Não há como escoar a água das ruas e enormes poças se formam. A água parada é o paraíso para a reprodução dos mosquitos transmissores da dengue e da malária – esta última ainda é a principal causa de mortes em Angola.
Foto: DW/C. Vieira
Higiene, uma questão de saúde
A falta de saneamento básico aumenta o risco da transmissão de doenças como a diarreia, a cólera e o tifo. Em toda a África, 115 pessoas morrem a cada hora de doenças ligadas à falta de saneamento, empobrecida higiene e água contaminada. Lavar as mãos após defecar, antes de cozinhar e antes das refeições ajuda a evitar doenças e pode reduzir em até 45% a incidência da diarreia.