Greve dos médicos: "Assistência vai deteriorar-se bastante"
27 de maio de 2025
A partir de 1 de junho, os médicos residentes iniciam uma paralisação do trabalho extraordinário no Hospital Central de Maputo, em Moçambique. Os profissionais exigem o pagamento de horas extra referentes a cerca de 16 meses que se encontram em atraso.
O presidente da Associação Médica de Moçambique (AMM) diz que o voto de confiança dado também ao novo Governo de Daniel Chapo para resolver a celeuma acabou. Henriques Viola entende que os médicos lesados de certa forma financiam indiretamente o sistema de saúde, ao recorrem a recursos próprios para exercerem o seu trabalho.
DW África: Pode contextualizar a situação dos médicos residentes?
Henriques Viola (HV): Em Moçambique, em particular no Hospital Central de Maputo, os médicos residentes - já são médicos, mas estão a fazer a especialidade - de facto, são a principal massa trabalhadora médica. São aqueles que tomam maior conta do cuidado assistencial aos pacientes, principalmente nos serviços de urgência. Decidiram realizar uma paralisação em relação ao trabalho extraordinário com início no dia 1 de junho de 2025 devido, essencialmente, ao não pagamento das horas extraordinárias, digamos que praticamente desde janeiro de 2024.
Portanto, são médicos que realizam a sua atividade normal em enfermarias durante o dia, das 07:30 até às 15:30 horas. Depois, à tarde e à noite, nos finais de semana e em feriados devem fazer tal trabalho para garantir a assistência de urgência num regime extraordinário. Aquilo que ficou definido por estes colegas é que não irão realizar trabalho extraordinário até que seja realizado o pagamento destas horas que lhes são devidas.
DW África: Então, estamos a falar de uma greve pontual, relativa apenas ao pagamento de horas extraordinárias e apenas uma greve de médicos do Hospital Central de Maputo?
HV: Sim, estamos a falar de médicos residentes. Cerca de 50% dos médicos que estão no Hospital Central de Maputo simplesmente não se irão fazer presente ao trabalho depois das 15:30, nas noites ou em feriados.
DW África: É possível qualificar os efeitos desta paralisação parcial.
HV: Bom, não há dúvida nenhuma que estamos a falar de um serviço nacional de saúde que "per si” já é deficitário. Então, significa necessariamente que a situação da assistência aos pacientes, principalmente nos serviços de urgência, vai deteriorar-se bastante. Já estamos numa situação, por assim dizer, limite. E agora, vai piorar ainda mais. Estou a falar dos bancos de socorros, de pacientes que foram vítimas de acidentes de viação e que precisam de atendimento imediato, terão um atendimento muito mais lento. Porque necessariamente, por exemplo, em se tratando de atendimento ao trauma, 75% dos médicos que atendem esses pacientes são médicos residentes. Então, quero dizer que há uma redução em cerca de 75% da capacidade de assistência. Se esse paciente precisa de uma cirurgia de urgência, também vai ter alguma dificuldade.
DW África: Enquanto isso, já foram iniciadas negociações com o Ministério da Saúde para que o vosso problema seja rapidamente ultrapassado?
HV: Sim, as negociações prevalecem, não têm sido interrompidas. O facto é que os médicos estão, desde agosto de 2024, à espera de uma resposta em relação ao pagamento. Na verdade, o que se sente e se vê na prática é que esses médicos, de alguma forma, têm estado a usar o seu salário para financiar o Serviço Nacional de Saúde. Porque, por exemplo, significa que esse médico, se tem que vir trabalhar à noite, vai ter que usar transporte, vai ter que comprar alimentação.