Greve na Justiça guineense ameaça data das presidenciais
Iancuba Dansó (Bissau)
2 de outubro de 2019
A menos de dois meses das presidenciais na Guiné-Bissau, a realização das eleições a 24 de novembro pode estar em perigo. Paralisação dos magistrados tem impedido que juízes apreciem as candidaturas entregues no Supremo.
Publicidade
A paralisação de sete dias, que começou na passada quinta-feira (26 de setembro), foi convocada pelos Sindicatos dos Magistrados do Ministério Público e dos Magistrados Judiciais (AMAMP e ASMAGUI), para exigir o cumprimento de oito pontos do caderno reivindicativo, entre eles a aplicação do Estatuto Remuneratório dos Magistrados.
A greve está a ter efeitos negativos no setor da justiça, sobretudo porque os juízes conselheiros estão impossibilitados de dar início à apreciação das 19 candidaturas às eleições presidenciais, que na semana passada deram entrada no Supremo Tribunal de Justiça (STJ), para a posterior validação das mesmas.
A Comissão Nacional de Eleições (CNE) depende e muito do pronunciamento desse órgão judicial para a realização do sorteio de posicionamento dos candidatos ao pleito presidencial, antes da impressão dos boletins de voto. Todos esses trabalhos e prazos estão a ser postos em causa com a greve, colocando desta forma, em causa, a data de 24 de novembro para as eleições presidenciais, afirma o jurista Augusto Nhaga.
Greve na Justiça guineense ameaça data das presidenciais
"O artigo 19 da lei número 10 de 2013, no seu número dois, fixa oito dias para a verificação das candidaturas, depois do término do prazo da entrega. Não havendo continuidade dos trabalhos por causa da greve, significa que a data de 24 de novembro ficará seriamente ameaçada. Eu não quis dizer que ficará comprometida, mas ficará seriamente ameaçada", diz o especialista em entrevista à DW África, explicando que poderão estar em causa os prazos legais para a análise das candidaturas, a afixação da lista provisória dos candidatos e a notificação dos mandatários "para suprir eventuais irregularidades".
Existe uma saída para esta situação, mas não deixa de haver consequências jurídicas, lembra Augusto Nhaga. "O Supremo Tribunal de Justiça poderá recorrer às outras vias, neste caso, do encurtamento de prazos, fazer um trabalho célere, fora do prazo normal do serviço, para poder corresponder às expetativas. Mas se assim for, num processo eleitoral em que há vários interesses conflituosos, estará a criar condições para qualquer um poder ter o fundamento de impugnar o ato, posteriormente ", diz, alertanto ainda para o risco de o processo se tornar "muito vulnerável ao ataque de qualquer pessoa, agindo ela de boa ou má fé ".
Greve retomada na próxima semana
A greve dos magistrados do Ministério Público e dos magistrados judiciais vai continuar a partir de segunda-feira (07.10), por mais sete dias. Por falta de entendimento com o Governo, as organizações sindicais já entregaram mais um pré-aviso de greve.
Jorge Gomes, porta-voz da comissão negocial da greve, disse à DW África que há pontos em reivindicação, que são inegociáveis, como "o novo estatuto remuneratório, a lei sobre a diuturnidade, tempo de exercício da função efetiva, como também a questão da segurança nos tribunais."
O porta-voz minimiza a possibilidade de a greve provocar a alteração da data das eleições presidenciais, mas destaca o impacto negativo desta paralisação nas pessoas detidas, cujas prisões preventivas e prazos de detenção estão a ser extravasados.
A DW África tentou, sem sucesso, ouvir o governo guineense sobre a greve dos magistrados.
Carências do principal hospital de Bissau
O Hospital Nacional Simão Mendes é considerado a unidade hospitalar de referência na Guiné-Bissau. Mas falta quase tudo: pessoal especializado, medicamentos básicos, aparelhos de diagnóstico.
Foto: Gilberto Fontes
Crise política deixa hospital a meio gás
Com a instabilidade política agravaram-se as necessidades no principal hospital da Guiné-Bissau e caíram por terra as expectativas da equipa hospitalar que esperava mais atenção por parte das autoridades. A Cruz Vermelha e os Médicos Sem Fronteiras prestam apoio. Mas, mesmo assim, perdem-se muitas vidas por falta de condições básicas de assistência.
Foto: Gilberto Fontes
À espera da hemodiálise...
O país ainda não consegue tratar doentes com insuficiência renal. O hospital tem estas instalações novas para iniciar tratamentos. Só falta a máquina da hemodiálise. Curioso é que o equipamento está no hospital, fechado há anos numa sala, cuja chave está com o Ministério da Saúde, segundo fonte hospitalar. Um nefrologista e vários técnicos fizeram formação em diálise, que ainda não podem aplicar.
Foto: Gilberto Fontes
Enquanto isso a população sofre
Doentes, como esta senhora, só podem receber tratamentos de hemodiálise no Senegal. No entanto, cada sessão chega a custar 150 euros. O que é insustentável para muitos doentes que, normalmente, necessitam de várias sessões semanais. Quando a doença é detetada numa fase inicial, aciona-se a evacuação para Portugal. Mas o processo é moroso. Muitos doentes acabam por falecer por falta de tratamento.
Foto: Gilberto Fontes
Há equipamentos novos parados...
O técnico de radiologia Hécio Norberto Araújo lamenta que este aparelho novo de radiografias esteja praticamente parado. Só faz alguns exames, em casos de urgência. Também o equipamento de mamografia nunca funcionou devido à falta de acessórios, como o chassi e o aparelho de revelação. O hospital militar continua a ser o único no país a fazer mamografias e tomografias, que podem custar 100 euros.
Foto: Gilberto Fontes
E máquinas obsoletas em uso
Na falta de opções, este velho aparelho de raio x continua a ser muito requisitado. Ninguém sabe quantos anos tem o equipamento que funciona com arranjos improvisados de fita-cola. A pequena sala de diagnóstico está desprovida de qualquer proteção contra as radiações. O único avental de proteção está estragado. Os técnicos de radiologia estão diariamente expostos a radiações eletromagnéticas.
Foto: Gilberto Fontes
Sem mãos a medir na pediatria
Esta unidade costuma estar cheia, principalmente na época das chuvas, com o aumento de casos de malária ou paludismo e diarreia nas crianças. Neste serviço com 158 camas, há apenas nove médicos efetivos e quase 40 enfermeiros. Entre o pessoal médico, conta-se um único especializado em pediatria. A falta de um eletrocardiograma é responsável pelo diagnóstico tardio de cardiopatias entre os menores.
Foto: Gilberto Fontes
Nem medicamentos para emergências
Nos cuidados intensivos há apenas um cardiologista. A maioria do pessoal médico são clínicos gerais. Por vezes, em plena situação de paragem cardíaca, falta medicação de urgência que os familiares do doente têm de se apressar em providenciar. A equipa hospitalar quer mais investimento em formação e em condições de trabalho. Só assim pode salvar mais vidas e diminuir a evacuação para o exterior.
Foto: Gilberto Fontes
Faltam lençóis e comida
O Hospital Nacional Simão Mendes tem mais de 500 camas. Mas não tem lençóis que cheguem para fazer a cobertura de todas elas. Devido à falta de pijamas, muitos doentes ficam hospitalizados com a roupa que trazem no corpo. Além disso, não há como providenciar alimentação aos pacientes que, na maior parte das vezes, ficam dependentes da comida que os familiares conseguem fazer chegar.