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Greve na Saúde: Sociedade civil pede "cedências e consensos"

Djariatú Baldé
8 de maio de 2024

O apelo é do Observatório do Cidadão para Saúde (OCS), que descreve situações preocupantes que se registam durante este período da greve nos centros hospitalares em Moçambique e diz que as consequências são visíveis.

Mosambik Hospital Central de Nampula
Foto: Sitoi Lutxeque/DW

O Governo moçambicano e os profissionais de saúde ainda não chegaram a consenso para suspender a greve do setor por melhores condições de trabalho que decorre desde a semana passada. Na segunda-feira (06.05), a Associação dos Profissionais de Saúde Unidos e Solidários de Moçambique (APSUSM),que convocou a greve, disse que, na última semana, 327 pacientes morreram nas unidades sanitárias do país, na sua maioria crianças, por dificuldades de assistência médica.

Em entrevista à DW, Antônio Mathe, coordenador do Pilar de Participação Pública no Observatório do Cidadão para Saúde (OCS), afirma que a situação atual mostra claramente que há uma crise em Moçambique. 

Antônio Mathe diz que as consequências da greve são visíveis, citando a falta de atendimento, pacientes  mandados de volta para casa e até mesmo mortes. Por isso, enfatiza que o diálogo, cedências e consensos serão necessários para ultrapassar a greve

DW Africa: Como estão a acompanhar a greve no sector de saúde em Moçambique?

Antônio Mathe (AM): O observatório, enquanto uma organização que trabalhar na área de governação no setor de saúde e que está preocupada com a promoção de políticas públicas e reformas que criem impacto na vida dos cidadãos, olha para esta situação com muita aflição e, por isso mesmo, o observatório está interessado e se preocupa com este assunto. Neste momento, estamos a fazer uma monitoria da greve a nível nacional e, por isso, temos algumas constatações que nos preocupam como sociedade civil. 

DW África: E quais são estas constatações?

AM: Essas constatações podem ser avaliadas em quatro cenários. No primeiro cenário, temos algumas unidades sanitárias ao nível do país que estão a funcionar a meio gás - uma vez que nem todos os profissionais aderiram à greve. Isto verifica-se no Centro de Saúde Primeiro de Maio a nível da cidade de Maputo. Temos um segundo cenário em que temos unidades sanitárias em que os profissionais de saúde aderiram por completo a esta greve, como é o caso do Centro de Saúde Primeiro de Junho onde estão a funcionar apenas serviços mínimos assegurados pelos diretores clínicos e chefes de gabinete. Temos um terceiro cenário em que temos as unidades sanitárias onde quase todos os serviços estão condicionados e os utentes são mandados de volta para casa por falta de pessoal para fazer o atendimento. E temos o último cenário, que é o cenário mais pessimista que acontece ao nível das cidades de Inhambane, Maxixe, Tete e distrito de Panda, onde os serviços foram todos encerradosem algumas unidades unitárias.

Um outro aspecto importante que vamos fazer referência é que este fenómeno remete-nos à perceção de que estamos, de facto, diante de uma crise o nível do serviço nacional de saúde. Embora os discursos das autoridades de saúde contrariem, esta perceção e baseada em evidências e estudos que já foram feitos, mas também em trabalho de campo. Temos ainda alguns cenários que acompanhamos em que alguns profissionais de saúde relatam que estão a sofrer intimidações pelo facto de aderirem a greve.

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DW África: Como analisa as declarações do Ministro da Saúde que afirmou ontem que a melhoria das condições de trabalho não é apenas uma etapa, é um processo dinâmico e anunciou que 60.000 funcionários da saúde já foram reenquadrados?

AM: Não queremos desvalorizar aquilo que já foram os ganhos do Governo junto à mesa de negociações. Por isso que eu falei, há avanços e retrocessos. No entanto, é preciso trazer uma abordagem realista e não idealista dos factos, dos fenómenos que estão a ocorrer. Portanto, penso que esta é uma abordagem de autodefesa, mas também de falta de honestidade e de falta de humildade para lidar com a situação. Eu penso que este é o momento de a máquina governativa do setor de saúde usar um mecanismo diplomático que esteja mais próximo da verdade, da realidade e do contexto atual que o sistema nacional de saúde enfrenta neste momento.

Quanto mais o Governo aparecer a desconstruir ou desvalorizar o caderno reivindicativo que desse grupo de profissionais de saúde reclama, penso que estaremos muito mais longe de chegar ao diálogo . É o utente do serviço nacional de saúde que sofre as consequências e estas consequências são visíveis com a falta de atendimento, pacientes mandados de volta para casa, situações de mortes por causa dessa negligência, desta incapacidade de governação, de administração e de gestão desse conflito.

DW África: Regista-se um impasse nas negociações entre o Governo e os profissionais de Saúde, que tem agravado os desafios enfrentados pela população para acessar os serviços de saúde que já são precários. O que a sociedade civil espera das partes?

AM: Em três palavras seria diálogo, cedências e consensos e termos também uma perspetiva mais realista dos problemas. Porque quando o Governo aparece publicamente a falar apenas de alguns pontos que conseguiu cumprir - que muita das vezes não estão muito alinhados com aquilo que é o caderno reinvidicativo - mas com a lógica da ação governativa do setor de saúde, nós encontramos ali um problema.

É importante que o Governo use uma comunicação mais diplomática quando estiver a fazer o seu comunicado de imprensa para que, de facto, não separe as partes. A mensagem da aproximação deve ser a pauta da agenda para o fim dessa greve dos profissionais de saúde e vemos que, neste momento, é a única solução. O Governo deve falar dos aspetos positivos, mas também ter a capacidade de reconhecer quais são os aspetos negativos que ainda não conseguiu cumprir e que afligem este grupo dos profissionais de saúde.