No 44º aniversário da independência do país, que se assinala neste domingo, 24 de setembro, artistas guineenses mostram-se preocupados com a situação política do país e lembram que a arte "faz parte do desenvolvimento".
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A 24 de setembro de 1973, nas matas de Colinas de Boé, o Presidente Nino Vieira, na altura presidente da Assembleia Nacional Popular, proclamou a independência da Guiné-Bissau. 44 anos depois, os indicadores de desenvolvimento do país continuam aquém do desejado.
Para os artistas plásticos guineenses João Carlos Barros, Sidney Cerqueira e Edy Matos, a Guiné-Bissau ainda não conseguiu cumprir o seu objetivo maior: desenvolver-se em todas as suas dimensões e dar uma vida digna aos seus filhos.
O país e o povo acima dos interesses políticos
"É uma tristeza, eu sinto uma grande mágoa com a situação política na Guiné, por isso mesmo estou há 35 anos fora da minha terra", lamenta João Carlos Barros. O artista foi estudar para Portugal e nunca mais voltou à Guiné-Bissau. No entanto, sublinha, não esquece "as raízes e a terra".
João Carlos Barros fala em "avanços e recuos sistemáticos, um ciclo vicioso que nunca mais acaba, um atraso atroz", considerando que "se os políticos guineenses fossem humildes e conversassem entre eles pondo, acima de tudo, a Guiné-Bissau e o povo guineense, ultrapassariam facilmente essas confusões que existem entre eles".
Não perder a esperança
O artista plástico guineense Sidney Cerqueira, vive também em Portugal. Tal como João Carlos Barros, diz ser um homem triste perante a situação do seu país de origem.
"Acho que já era tempo suficiente para aprendermos com os nossos erros e tentarmos fazer melhor", afirma.
Apesar da crise política e do impasse que reina há dois anos na Guiné-Bissau, Sidney Cerqueira mostra-se optimista num futuro melhor: "Vivo sempre com a esperança de que o país vai melhorar. Estamos a atravessar um momento muito complicado, mas a esperança de um dia melhor está a caminho".
Em Dacar, no Senegal, o artista Edy Matos afirma que vê "com muita pena a Guiné-Bissau nesta situação". O artista plástico destaca o exemplo de Cabo Verde, que se tornou independente mais tarde, em 1975, mas apresenta um maior desenvolvimento: "Há muita diferença entre Cabo Verde e a Guiné-Bissau. Para mim não houve nenhuma mudança na Guiné, aliás a mudança que houve foi para pior".
Falta aposta na cultura
Olhando para o setor da cultura, particularmente nas artes plásticas, João Carlos Barros nota que, 44 anos depois da independência do país, os artistas continuam a ser mal apoiados."Não há mercado e também não há aposta do Governo nesta área da cultura que é a arte plástica. Gostam, mas não incentivam nem apostam, é tudo por iniciativa própria, não há estímulos ao nível do Estado", sublinha.
Ainda assim, João Carlos Barros não baixa os braços: "Água mole em pedra dura tanto bate até que fura. Nós somos a água que bate na pedra com tanta força que um dia há de furar".
Nesse dia, para Edy Matos, os governantes vão perceber que a cultura e o desenvolvimento devem estar de mãos dadas: "Vão tomar a consciência do que estamos a fazer e compreender que a arte pode levar um país muito longe. A arte faz parte do desenvolvimento de um país e as autoridades guineenses deviam apoiar muito mais os artistas".
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"Doz Korpu um Korson”
Os três guineenses estão em Cabo Verde a participar numa exposição coletiva com artistas cabo-verdianos e a promover as artes plásticas da Guiné-Bissau no âmbito do projeto "Doz Korpu um korson” que, em português, significa "dois corpos, um coração".
Sidney Cerqueira acredita que um projeto semelhante ao da Rua de Arte, na Cidade da Praia, seria bastante útil em alguns pontos de Bissau, sobretudo, na parte velha da capital guineense – Bissau Velho. Rua de Arte, no bairro da Terra Branca, na Cidade da Praia, é uma galeria a céu aberto e ponto de atração turística. A rua foi toda pintada por diversos artistas plásticos cabo-verdianos e guineenses. "A ideia é levar essa arte, essa envolvência dos artistas para a Guiné-Bissau".
Guiné-Bissau: O país onde nenhum Presidente terminou o mandato
Desde que se tornou independente, a Guiné-Bissau viu sentar na cadeira presidencial quase uma dúzia de Presidentes - incluindo interinos e governos de transição. Conheça todas as caras que passaram pelo comando do país.
Foto: DW/B. Darame
Luís de Almeida Cabral (1973-1980)
Luís de Almeida Cabral foi um dos fundadores do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) e também o primeiro Presidente da Guiné-Bissau - em 1973/4. Luís Cabral ocupou o cargo até 1980, data em que foi deposto por um golpe de Estado militar. O antigo contabilista faleceu, em 2009, vítima de doença prolongada.
Foto: Bundesarchiv/Bild183-T0111-320/Glaunsinger
João Bernardo Vieira (1980/1994/2005)
Mais conhecido por “Nino” Vieira, este é o político que mais anos soma no poder da Guiné-Bissau. Filiado no PAIGC desde os 21 anos, João Bernardo Vieira tornou-se primeiro-ministro em 1978, tendo sido com este cargo que derrubou, através de um golpe de Estado, em 1980, o governo de Cabral. "Nino" ganhou as eleições no país em 1994 e, posteriormente, em 2005. Foi assassinado quatro anos mais tarde.
Foto: picture-alliance/dpa/L. I. Relvas
Carmen Pereira (1984)
Em 1984, altura em que ocupava a presidência da Assembleia Nacional Popular, Carmen Pereira assumiu o "comando" da Guiné-Bissau, no entanto, apenas por três dias. Carmen Pereira, que foi a primeira e única mulher na presidência deste país, foi ainda ministra de Estado para os Assuntos Sociais (1990/1) e Vice-Primeira-Ministra da Guiné-Bissau até 1992. Faleceu em junho de 2016.
Foto: casacomum.org/Arquivo Amílcar Cabral
Ansumane Mané (1999)
Nascido na Gâmbia, Ansumane Mané foi quem iniciou o levantamento militar que viria a resultar, em maio de 1999, na demissão de João Bernardo Vieira como Presidente da República. Ansumane Mané foi assassinado um ano depois.
Foto: picture-alliance/dpa
Kumba Ialá (2000)
Kumba Ialá chega, em 2000, à presidência da Guiné-Bissau depois de nas eleições de 1994 ter sido derrotado por João Bernardo Vieira. O fundador do Partido para a Renovação Social (PRS) tomou posse a 17 de fevereiro, no entanto, também não conseguiu levar o seu mandato até ao fim, tendo sido levado a cabo no país, a 14 de setembro de 2003, mais um golpe militar. Faleceu em 2014.
Foto: AP
Veríssimo Seabra (2003)
O responsável pela queda do governo de Kumba Ialá foi o general Veríssimo Correia Seabra, Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas. Filiado no PAIGC desde os 16 anos, Correia Seabra acusou Ialá de abuso de poder, prisões arbitrárias e fraude eleitoral no período de recenseamento. O general Veríssimo Correia Seabra viria a ser assassinado em outubro de 2004.
Foto: picture-alliance/dpa/R. Bordalo
Henrique Rosa (2003)
Seguiu-se o governo civil provisório comandado por Henrique Rosa que vigorou de 28 de setembro de 2003 até 1 de outubro de 2005. O empresário, nascido em 1946, conduziu o país até às eleições presidenciais de 2005 que deram, mais uma vez, a vitória a “Nino” Vieira. O guineense faleceu, em 2013, aos 66 anos, no Hospital de São João, no Porto.
Foto: AP
Raimundo Pereira (2009/2012)
A 2 de março de 2009, dia da morte de Nino Vieira, o exército declarou Raimundo Pereira como Presidente da Assembleia Nacional do Povo da Guiné-Bissau. Raimundo Pereira viria a assumir de novo a presidência interina da Guiné-Bissau, a 9 de janeiro de 2012, aquando da morte de Malam Bacai Sanhá.
Foto: AP
Malam Bacai Sanhá (1999/2009)
Em julho de 2009, Bacai Sanhá foi eleito presidente da Guiné Bissau pelo PAIGC. No entanto, a saúde viria a passar-lhe uma rasteira, tendo falecido, em Paris, no inicio do ano de 2012. Depois de dirigir a Assembleia Nacional de 1994 a 1998, Bacai Sanhá ocupou também o cargo de Presidente interino do seu país de maio de 1999 a fevereiro de 2000.
Foto: dapd
Manuel Serifo Nhamadjo (2012)
Militante do PAIGC desde 1975, Serifo Nhamadjo assumiu o cargo de Presidente de transição a 11 de maio de 2012, depois do golpe de Estado levado a cabo a 12 de abril de 2012. Este período de transição terminou com as eleições de 2014, que foram vencidas por José Mário Vaz. A posse de “Jomav” como Presidente marcou o regresso do país à ordem constitucional no dia 26 de junho de 2014.