Guiné-Bissau: Abstenção pode ser sinal de falta de confiança
29 de novembro de 2019
Segunda volta das eleições presidenciais na Guiné-Bissau está em risco de ter uma afluência mais fraca que a primeira volta. Eleitores falam em falta de confiança na classe política. CNE vai reforçar apelo ao voto.
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Durante a primeira volta das eleições presidenciais de 24 de novembro na Guiné-Bissau, os observadores eleitorais admitiram que o grande vencedor foi a abstenção que atingiu um número recorde de 25,63%, uma das mais altas de sempre.
Num país onde mais de metade dos eleitores são jovens, Saturnino de Oliveira, um ativista social, considera que o povo não confia nos políticos. "É claro que a sociedade guineense, sobretudo a camada juvenil, está sem esperança. Passámos várias eleições em que votámos, mas não conseguimos ver os resultados da votação", começa por explicar.
"Entretanto, os jovens hoje compreenderam que as eleições tornam-se apenas num instrumento para legitimar as pessoas que depois das eleições não respondem às necessidades do povo ou da juventude, sobretudo", lamenta.
Saturnino de Oliveira aponta que é possível minimizar o número da abstenção na segunda volta do escrutínio, "mas para isso é preciso que os próprios candidatos, os políticos e a sociedade se empenhem”.
"Os dois candidatos devem usar discursos que vão incentivar os jovens a participar no processo, caso contrário a taxa de abstenção vai aumentar", sugere.
Segunda volta antecipada
Inicialmente a segunda volta estava agendada para 5 de janeiro de 2020, mas devido à pressão dos doadores internacionais, as autoridades guineenses acabaram por antecipar o escrutínio para 29 de dezembro, que coincide precisamente a quadra festiva do Natal e Ano Novo.
"Essa data é a nossa preocupação aqui na diáspora. Porque nessa altura, de 23 de dezembro a 2 de janeiro, muitos emigrantes vão de férias. Estamos a tentar ver com a CNE a possibilidade de deixar eleitores nestas situações votarem com antecendência antes de viajarem. Esta é a nossa maior preocupação", admite José Rachid de Barros, imigrante guineense em Bona, na Alemanha.
Na votação de 24 de novembro, dos 761 676 eleitores inscritos, 195 203 não votaram, de acordo com os resultados definitivos divulgados esta sexta-feira (29.11) pela Comissão Nacional de Eleições (CNE).
Guiné-Bissau: Abstenção pode ser resultado da falta de confiança nos políticos
Mau tempo demoveu eleitores na Europa
Na Europa, muitos eleitores justificaram-se com o "mau tempo" para não votar. "Conversámos com as pessoas para irem votar. De Portugal ouvi dizer que foi por causa do mau tempo. Estou muito preocupado, porque a segunda volta acontece no inverno, em dezembro, ainda faz mais frio e mau tempo e ainda temos a questão das férias", comentou José Rachid de Barros.
Contactada pela DW África, a porta-voz da CNE, Felisberta Moura Vaz, afirma que é preciso reforçar a mensagem deste órgão de administração eleitoral para intensificar a campanha de educação cívica junto da população, reforçando o apelo ao voto.
A CNE tem realizado encontros para pedir mais apoios financeiros para combater a taxa de abstenção na segunda volta. De acordo com a CNE, a campanha eleitoral para a segunda volta decorre durante 15 dias, entre 13 e 27 de dezembro.
Presidenciais: Futuro da Guiné-Bissau adiado para segunda volta
Domingos Simões Pereira e Umaro Sissoco Embaló disputam segunda volta das presidenciais na Guiné-Bissau, a 29 de dezembro. Balanço da primeira volta das eleições feito pela CPLP, CEDEAO e União Africana é positivo.
Foto: DW/B. Darame
Domingos Simões Pereira vs Umaro Sissoco Embaló
Domingos Simões Pereira foi o vencedor das presidenciais na Guiné-Bissau, no entanto, não alcançou a maioria necessária para assumir o poder. O candidato apoiado pelo PAIGC conseguiu 222.870 votos, o que representa 40,13% do eleitorado. Seguiu-se Umaro Sissoco Embaló, do MADEM-G15, com 153.530 votos, ou seja, 27,65%.
Foto: DW/B. Darame
Medalha de bronze para Nabiam
Em terceiro lugar ficou Nuno Nabiam, com 13,16% dos votos. Seguiu-se José Mário Vaz, com 12,41%, Carlos Gomes Júnior, com 2,66%, e Baciro Djá, com 1,28% do eleitorado. Vicente Fernandes conseguiu 0,77% dos votos, Mamadu Iaia Djaló 0,51%, Idriça Djaló 0,46% e Mutaro Intai Djabi 0,43% dos votos. Os candidatos que obtiveram os piores resultados foram Gabriel Fernando Indi e António Afonso Té.
Foto: picture alliance/dpa
PAIGC pede apoio de APU e FREPASNA
Segue-se agora a segunda volta, marcada para 29 de dezembro. Domingos Simões Pereira, do PAIGC, já pediu o apoio aos partidos APU-PDGB e FREPASNA. DSP disse aceitar e respeitar os resultados eleitorais divulgados e deixou um recado a Sissoco Embaló: que na campanha para a segunda volta, não serão tolerados discursos de divisão dos guineenses: "serão atacados judicial e politicamente", disse.
Foto: DW/B. Darame
MADEM-G15 conta com apoiantes de Jomav
Por sua vez, Umaro Sissoco Embaló disse confiar na vitória na segunda e voltou a fazer acusações ao adversário Domingos Simões Pereira. "A Guiné-Bissau era um país laico e de concórdia nacional, Domingos Simões Pereira semeou o ódio e a divisão entre os guineenses". Embaló já havia anunciado, antes da primeira volta, que existia um acordo entre vários partidos contra DSP, em caso de segunda volta.
Foto: Privat
Grande derrotado
O antigo chefe de Estado da Guiné-Bissau, José Mário Vaz, é já considerado o grande derrotado das presidenciais. Jomav, que concorreu como independente às eleições de 24 de novembro, ficou em quarto lugar na votação, atrás de Domingos Simões Pereira, Umaro Sissoco Embaló e Nuno Nabiam. O ex-Presidente conseguiu apenas 12,41% dos votos.
Foto: DW/B. Darame
Votação ordeira
A votação de 24 de novembro foi acompanhada por 23 observadores da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), 54 da União Africana, 60 da CEDEAO e 47 dos Estados Unidos da América. Todos elogiaram a "calma" e "serenidade" do processo.
Foto: picture-alliance/Xinhua News Agency
Votação "transparente"
Também a CNE deu nota positiva ao processo, dando conta de que não foram registados incidentes que possam comprometer a votação. Nestas eleições, nenhum dos 12 candidatos apresentou contestações ao processo de votação. Já na véspera das eleições presidenciais, Felisberta Moura Vaz, porta-voz da CNE, havia garantido à DW que o sistema eleitoral no país "é tão transparente que não permite fraude".
Foto: DW/B. Darame
Monitorização da sociedade civil
As eleições presidenciais, assim como aconteceu nas legislativas, voltaram a contar com o trabalho da Célula de Monitorização Eleitoral da Sociedade Civil. Após a votação, a plataforma deu nota positiva ao dia eleitoral, salientando que tudo "decorreu conforme o previsto". A rede contou com 422 observadores em todas as regiões da Guiné-Bissau.
Foto: DW/B. Darame
Doze candidatos
Durante a campanha eleitoral, foram muitas as críticas feitas aos considerados fracos discursos e programas de governação apresentados. Em entrevista à DW, a Rede Nacional das Associações Juvenis considerou que alguns candidatos deixavam muito a desejar e que outros "confundem os poderes do Presidente da República com os do Executivo nas promessas eleitorais que fazem nos comícios".
Foto: DW/B. Darame
Jomav demite governo
A campanha para as presidenciais ficou marcada pela nomeação, por parte de José Mário Vaz, de um novo Governo liderado por Faustino Imbali, que foi recusado pela comunidade internacional, e que acabou por se demitir pouco tempo depois. O próprio Jomav disse-se desautorizado pelas forças de segurança, que não facilitaram a efetivação do decreto presidencial que ditou esta nomeação.