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Guiné-Bissau: "Machadada final à Justiça"

Iancuba Dansó
30 de julho de 2024

Presidente da Liga Guineense dos Direitos Humanos diz que o país assiste à "consagração do absolutismo" enquanto três juízes continuam desaparecidos. "Estamos num Estado de caos, de anarquia", afirma Bubacar Turé à DW.

Presidente guineense, Umaro Sissoco Embaló
Presidente guineense, Umaro Sissoco EmbalóFoto: Braima Darame/DW

Os três juízes conselheiros do Tribunal Militar Superior da Guiné-Bissau continuam a não ser vistos em público desde que, há cerca de uma semana, proferiram o acórdão que ordenou a libertação imediata dos militares e civis detidos e acusados de envolvimento na alegada tentativa de golpe de Estado em 01 de fevereiro de 2022.

Apesar do Estado-Maior das Forças Armadas não ter assumido oficialmente a detenção dos magistrados, fontes familiares garantem à DW que os juízes se encontram detidos na instituição militar e alguns membros da família já os visitaram.

Para a Liga Guineense dos Direitos Humanos (LGDH), os três juízes foram "sequestrados" a mando do chefe de Estado-maior General das Forcas Armadas, Biaguê Na N´tan, "em cumprimento de ordens políticas absolutamente ilegais e arbitrárias". Em curta nota nas redes sociais, esta terça-feira (30.07), a organização dos direitos humanos apela ao cumprimento "rigoroso" e "sem demoras" do acórdão do Tribunal Militar Superior que ordenou a libertação de todos os detidos em conexão com o caso 01 de fevereiro.

Em entrevista à DW, o presidente da LGDH, Bubacar Turé, diz que se vive o caos na Guiné-Bissau com a detenção dos juízes.

DW África: Como é que a Liga Guineense dos Direitos Humanos está a acompanhar o caso da detenção dos juízes?

Bubacar Turé (BT): Estamos a acompanhar este caso com muita preocupação e estamos em contacto permanente com os familiares desses juízes sequestrados. Nós pensamos que este caso é mais uma prova inequívoca da situação grave em que se encontra o país, sobretudo do caráter autoritário do regime no poder na Guiné-Bissau.

É inqualificável que o Estado, através do chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas [Biaguê Na N`tan], mande sequestrar juízes, só pelo facto de terem decidido nos termos da lei. O único crime que esses juízes cometeram é o de terem decidido à luz da lei e da sua consciência, tal como mandam as normas processuais em vigor na Guiné-Bissau.

Bubacar Turé, presidente da Liga Guineense dos Direitos HumanosFoto: privat

DW África: Por que é que a Liga Guineense dos Direitos Humanos responsabiliza o chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas pela detenção dos juízes do Tribunal Militar Superior?

BT: Porque a ordem da detenção partiu do chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas. Pelas informações irrefutáveis de que dispomos, essas pessoas foram chamadas ao Estado-Maior a mando do chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas. Portanto, Biaguê Na N`tan está a cumprir ordens ilegais e arbitrárias provenientes do poder político, e isso para nós é inaceitável num Estado de Direito democrático.

DW África: Com este caso, como fica a independência do poder judicial?

BT: Este caso é uma machadada final contra a Justiça. Aliás, este não é o primeiro caso. Nós assistimos a vários casos de interferências e pressões, atos que consubstanciam a destruição da independência dos juízes.

Tudo isso revela o caráter autoritário desse regime, que pretende consolidar a ditadura, confiscar os direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos e concentrar todo o poder numa única pessoa. Ou seja, a consagração do absolutismo na Guiné-Bissau. 

DW África: Apesar do acórdão ter sido conhecido, os detidos do caso 01 de fevereiro de 2022 continuam nas celas. O que acha que poderá estar em causa para a não libertação desses detidos até agora?

BT: Para o poder atual, só existe justiça quando as decisões são lhe favoráveis. [Mas] quando as decisões não lhe são favoráveis, não existe justiça.

Portanto, a vontade do atual poder prevalece sobre as leis, e as ordens superiores substituíram a ordem jurídica na Guiné-Bissau. A Justiça deixou de ser um órgão de soberania. Estamos num Estado de caos, de anarquia, que é a expressão máxima do absolutismo.

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