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Líder comunitária guineense garante fim da mutilação genital

Lusa | nn
15 de setembro de 2018

Binta Mandjam, líder das mulheres de Cutiá, no norte da Guiné-Bissau, garante que naquela comunidade "há muito que não se pratica o fanado", como é conhecida a prática da mutilação genital.

Foto: picture alliance/dpa/EPA/UNICEF/HOLT

Cutiá é uma das várias localidades guineenses onde atuam organizações da sociedade civil da Guiné-Bissau, mas também de Portugal, no combate às práticas nefastas à saúde da mulher e da criança, nomeadamente os casamentos precoce e forçado e, sobretudo, a mutilação genital feminina ou infibulação.

O Governo português é um dos principais financiadores das ações daquelas organizações. Durante uma visita de cinco dias, que terminou hoje, as secretárias de Estado portuguesas para Cidadania e Igualdade, Rosa Monteiro, e da Saúde, Rosa Matos, visitaram várias comunidades na capital e no interior da Guiné-Bissau para constatarem o que tem sido feito.

Na sexta-feira, as duas governantes portuguesas foram às localidades de Cutiá e Mansoa, onde conversaram com líderes comunitários e chefes religiosos, os imãs. No alpendre da casa do imã Bacar Seidi, em Cutiá, e perante cerca de duas dezenas de pessoas, na sua maioria mulheres, a líder comunitária Binta Mandjam garantiu que na aldeia já não se pratica a excisão e que se souber quem a faça vai denunciar a situação à presidente do comité para o abandono das práticas nefastas à saúde da mulher e criança, Fatumata Djau Baldé.

Funcionários da UNICEF distribuem panfletos em Katiola, Costa do Marfim, a alertar para as consequências nefastas da mutilação genital femininaFoto: picture alliance/dpa/EPA/UNICEF/ASSELIN

Um telemóvel para fazer denúncias

O único problema, disse Mandjam, é que não tem um telemóvel para fazer as denúncias. O problema foi de pronto resolvido, com Djau Baldé, antiga chefe da diplomacia guineense, a entregar dinheiro à líder comunitária para que compre um aparelho.

As duas secretárias de Estado portuguesas assistiram à conversa, tendo ambas deixado o apelo para o abandono da mutilação genital feminina e para os pais levaram as meninas à escola. "De agora em diante quem ousar fazer o fanado, se eu souber, ligo-lhe diretamente e informo", declarou a líder das mulheres de Cutiá, dirigindo-se a Djau Baldé.

O compromisso de Binta Mandjam e a atitude de Djau Baldé mereceram rasgados aplausos dos presentes que foram à casa do chefe religioso Bacar Seidi, para acolherem as hóspedes portuguesas.

As governantes portuguesas ainda ouviram o diretor da única escola pública de Cutiá, Yaya Sow, a lamentar-se de falta de água potável, de cursos de alfabetização para adultos que não sabem ler e escrever, e ainda da falta de salas de aulas para acolher os 800 alunos da vila. O diretor da escola queixou-se também que só conta com 22 professores (dos quais quatro do sexo feminino) para responder à cada vez maior demanda do ensino formal, sobretudo das raparigas.

Segundo o diretor e professor da escola do ensino básico - até ao sexto ano -, a escola de Cutiá tem cerca de 400 alunos do sexo feminino, o que, disse, demonstra que as raparigas vão à escola.

Dúvidas quando ao fim da prática

Em Mansoa, ativistas locais que trabalham na sensibilização à população sobre os riscos da prática da mutilação genital feminina também explicaram que o fenómeno "está a acabar", mas o médico Duarte Castillo disse ser "difícil perceber se de facto há ou não a erradicação" da excisão, já que, regra geral, as mulheres só vão ao médico no trabalho do parto.

Médicos na Guiné-Bissau não sabem se, de facto, a prática da mutilação genital feminina tem diminuído porque as mulheres não são observadas clinicamente de forma regularFoto: picture alliance/dpa/W. Kastl

"Se a mulher é excisada só o vais saber lá mais para frente, se um dia for ao hospital em trabalho do parto", observou o médico.

O ativista Alfa Umaro de Mansoa contou à Lusa que cada vez mais a excisão é feita às crianças de tenra idade, o que, disse, se torna difícil saber, já que não há festas "como no passado" para anunciar o acontecimento nas comunidades.

O que é a mutilação genital feminina?

A mutilação genital feminina, que causa lesões físicas e psíquicas permanentes, é mantida em cerca de 30 países africanos, entre os quais a lusófona Guiné-Bissau. A prática é feita de diversas formas: em algumas corta-se o clítóris, noutras os grandes e os pequenos lábios. Uma vez concretizada, é irreversível e se a vítima sobreviver irá sofrer consequências físicas e psicológicas o resto da vida.

Além do sofrimento que as mutiladas sentem no momento do corte, o processo de cicatrização é acompanhado com frequência por infeções, devido ao uso de utensílios contaminados, e dores ao urinar e defecar. A incontinência urinária e infertilidade são outras das sequelas frequentes. O facto de serem usadas as mesmas lâminas para mutilar várias crianças aumenta o risco de se contrair o vírus do VIH/SIDA.

Uma vítima de mutilação genital dá a cara

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