A campanha eleitoral na Guiné-Bissau arranca este sábado num clima de tensão política, depois da posse de um novo Governo não reconhecido pela comunidade internacional. Entretanto, a CEDEAO vai a Bissau mediar o impasse.
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Este sábado (02.11), mesmo dia do arranque da campanha eleitoral, uma missão da Comunidade Económica de Desenvolvimento dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) chega a Bissau para ajudar a acabar com o impasse despoletado pelo Presidente José Mário Vaz, que demitiu o Governo de Aristides Gomes no início da semana e, nesta quinta-feira, deu posse a Faustino Imbali como primeiro-ministro.
É uma situação inédita na história da Guiné-Bissau. Há dois governos. Um resultante das eleições legislativas de março, reconhecido pela comunidade internacional, e outro nomeado pelo Presidente da República, que terminou o mandato desde junho.
Os ministérios e outros departamentos governamentais continuam a ser ocupados pelos membros do Executivo de Aristides Gomes, que estão a ser assegurados pela ECOMIB, a força militar da CEDEAO presente no país, já que a organização sub-regional, da qual a Guiné-Bissau é membro, só reconhece o Governo resultante das urnas.
Partidos apoiam o Presidente
A intervenção da CEDEAO no processo político guineense está a ser criticada pelos partidos que apoiam o novo Governo. Numa carta enviada ao secretário-geral das Nações Unidas, o Movimento para Alternância Democrática (MADEM G-15), o Partido da Renovação Social (PRS) e a Assembleia do Povo Unido-Partido Democrático da Guiné-Bissau (APU-PDGB) denunciam a alegada parcialidade "de alguns funcionários" da CEDEAO.
No documento a que a DW África teve acesso, os partidos insistem que o Presidente guineense, candidato às eleições presidenciais de 24 de novembro e cujo mandato terminou a 23 de junho, está "apenas limitado relativamente ao poder de dissolver a Assembleia Nacional Popular, mas não quanto ao poder de demissão de Governo" e a nomeação de um novo Executivo.
Sociedade civil reage
Entretanto, a comunidade religiosa da Guiné-Bissau já reagiu à situação política vigente no país. Numa alusão aos recentes decretos do Presidente cessante José Mário Vaz, os líderes católicos, evangélicos e muçulmanos, pela voz do Bispo de Bissau, Dom José Câmnate na Bissign, pedem respeito aos princípios democráticos e a vontade do povo exprimida nas urnas.
"Aqueles que representam os órgãos de soberania, quando o povo manifesta a sua vontade e há um Governo que sai de eleições, todos devem respeitar esse Governo e deixá-lo trabalhar até ao período para o qual foi escolhido pelo povo", referiu o Bispo, acrescentando que "as leis devem ser respeitadas, porque as leis é que nos mostram como é que podemos viver em democracia". "Quem sai deste quadro, o de respeitar a vontade do povo e das leis que orientam a nossa convivência, é a pessoa que se autoexcluiu dessa regra", criticou.
As organizações juvenis da Guiné-Bissau também estão contra os decretos presidenciais de José Mário Vaz. A Presidente do Conselho Nacional da Juventude (CNJ), Aissatu Forbs Djaló, pede uma posição firme da comunidade internacional e apelou à população em geral "para não criar situações que possam trazer problemas" e "cumprir com aquilo que está na Constituição da República da Guiné-Bissau".
Guiné-Bissau: Missão da CEDEAO vai mediar crise política
A União Africana, a União Europeia, a CEDEAO, a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) e as Nações Unidas já condenaram a decisão do Presidente. Também os Estados Unidos, através de um comunidado da sua embaixada em Dacar, declararam apoio ao Governo de Aristides Gomes.
Eleições asseguradas
No entanto, a menos de 24 horas para o início da campanha eleitoral, a Comissão Nacional de Eleições (CNE) já garantiu que estão criadas todas as condições para a realização do ato eleitoral a 24 de novembro.
Segundo o presidente da CNE, José Pedro Sambu, "os trabalhos feitos até aqui permitem-nos afirmar categoricamente de que estão reunidas todas as condições básicas e fundamentais para a realização do pleito eleitoral na data prevista".
Ainda de acordo com Sambu, "o processo eleitoral exige das forças de segurança a maior prontidão, profissionalismo, ética e nobreza, para poderem lidar com eventuais situações difíceis e complexas".
A DW África tentou, sem sucesso, o contacto com as principais forças políticas da Guiné-Bissau, que se mantém em reuniões de forma constante, sobre o atual processo político do país.
Farpas e elogios: Frases das eleições na Guiné-Bissau
Principais partidos políticos, sociedade civil e comunidade internacional acompanham de perto contagem de votos na Guiné-Bissau. CNE só divulga resultados na quarta-feira (13.03), mas PAIGC já canta vitória.
Foto: Getty Images/AFP/SEYLLOU
PAIGC
O PAIGC declarou-se, na segunda-feira (11.03), vencedor das eleições legislativas de 10 de março na Guiné-Bissau. O porta-voz do partido João Bernardo Vieira garantiu que o povo conferiu ao PAIGC os destinos do país. No domingo, após votar, o líder do PAIGC, Domingos Simões Pereira, disse que estas eleições representam "um momento de viragem" para que, na Guiné-Bissau, "o império da lei vingue".
Foto: DW/F. Tchumá
MADEM-G15
Após o anúncio do PAIGC, o Movimento para a Alternância Democrática frisou que ninguém ganhou as eleições com maioria absoluta e que também fará parte do próximo Governo do país. As declarações de Braima Camará no domingo, dia das eleições, foram das mais críticas, pois o líder do MADEM-G15 acusou o primeiro-ministro de "usar dinheiro público para corromper líderes de opinião no dia de reflexão".
Foto: DW/J. Carlos
PRS
O Partido da Renovação Social disse, esta terça-feira, que "é falsa a informação da maioria folgada que o PAIGC sustenta para semear a confusão"."Nenhuma das forças políticas atingiu sequer a barra dos 40 deputados", disse Vítor Pereira. No domingo, depois de votar, Alberto Nambeia, líder do PRS, disse que esta votação constitui um "balão de oxigénio" para o povo, que quer mudanças no país.
Foto: DW/B. Darame
FREPASNA
Baciro Djá considera que era o candidato com mais experiência nestas eleições e, por isso, o justo vencedor. No entanto, esta segunda-feira, o líder do partido Frente Patriótica para a Salvação Nacional (FREPASNA) foi o primeiro a reconhecer a derrota no pleito. "Consideramos que o nosso resultado foi péssimo e a responsabilidade máxima é minha, enquanto presidente do partido", disse.
Foto: Presidency of Guinea-Bissau
Comissão Nacional de Eleições (CNE)
Pouco depois do arranque do pleito, no domingo, José Pedro Sambú, presidente da CNE, disse aos jornalistas que o processo estava a decorrer num "clima de transparência e sem sobressaltos". O mesmo cenário foi reportado pela porta-voz da comissão, ao final do dia. Felizberta Vaz garantiu ainda que os "pequenos problemas" que surgiram foram resolvidos. A CNE divulga os resultados esta quarta-feira.
Foto: CNE
Presidente da República
Em declarações aos jornalistas, depois de votar, no domingo, José Mário Vaz garantiu que os observadores estavam "surpresos" pela positiva com a Guiné-Bissau. O Presidente guineense pediu à imprensa para que passasse lá para fora essa "grande imagem" da Guiné-Bissau como um país onde "não há problemas". "Considero a Guiné-Bissau hoje campeã da liberdade", disse.
Foto: Getty Images/AFP/Seyllou
Primeiro-ministro guineense
Também no domingo, o primeiro-ministro guineense disse estar emocionado com a concretização de um processo eleitoral "difícil e intenso", no qual foi "necessária a intervenção da comunidade internacional". Aristides Gomes acrescentou ainda que, apesar das dificuldades, este foi um processo cheio de "pedagogia".
Foto: Präsidentschaft von Guinea-Bissau
Organização das Nações Unidas
David McLachlan-Karr, enviado das Nações Unidas à Guiné-Bissau, tem estado a reportar, com frequência, o ambiente vivido no país nestas eleições, nas redes sociais. Esta segunda-feira, o representante da ONU deu os parabéns à população guineense que, "em todo o país, saiu [às ruas] para votar pacificamente e com muito orgulho cívico".
Foto: DW/B. Darame
Comunidade dos Países de Língua Portuguesa
Também a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), na pessoa de Luiz Villarinho Pedroso, acompanhou de perto a votação. No domingo, dia da eleição, o chefe da missão da CPLP disse que estas eleições foram um "exercício cívico exemplar", que decorreu com a "maior tranquilidade e normalidade". O balanço preliminar do escrutínio será feito ao longo desta terça-feira (12.03).
Foto: DW/N. dos Santos
CEDEAO
À semelhança da ONU e da CPLP, também a CEDEAO deu nota positiva às eleições guineenses. Numa conferência de imprensa, esta segunda-feira (11.03), Kadré Désiré Ouedraogo, chefe da Missão de Observação da CEDEAO, disse que as legislativas no país decorreram "de forma pacífica e transparente". Acrescentou ainda que espera que "todos [os partidos] aceitem os resultados".
Foto: DW/B. Darame
União Africana
Após o encerramento das urnas na Guiné-Bissau, Rafael Branco, chefe da Missão de Observação Eleitoral da União Africana destacou a forma tranquila com que decorreu o processo e salientou a "participação cívica notável".
Foto: DW/Nélio dos Santos
Liga Guineense dos Direitos Humanos
Também as organizações locais fizeram chegar elogios. À semelhança do que foi dito pela CNE, Augusto Mário da Silva, presidente da Liga Guineense dos Direitos Humanos, disse ter havido registo de "algumas falhas", mas "que foram imediatamente supridas". Tirando os atrasos na abertura das urnas em algumas mesas e trocas de cadernos eleitorais, "o processo decorreu de forma regular", disse.
Foto: DW/B. Darame
Sociedade Civil
Por último, a Célula de Monitorização do Processo Eleitoral salientou, esta segunda-feira, que "os eleitores compareceram em massa para exercer o seu direito de voto". Este grupo de monitorização das eleições, composto por 420 pessoas, espalhadas por todo o país, saudou também "a boa presença das forças de segurança nos centros de votação observados".